Edição 24

Professor Construir

A Atuação dos Professores no Processo de Educação em Valores

coroa02Para realizar qualquer trabalho educativo que tenha como finalidade contribuir para a construção da cidadania, é necessário, ao professor, como requisito primeiro e essencial, participar efetivamente na construção do projeto pedagógico da escola. Nessa participação, está implicado um conhecimento crítico da realidade em que se desenvolve o trabalho do grupo com o qual se vai intencionalmente estabelecer uma relação de aprendizagem, do conjunto dos profissionais da instituição e de si próprio — dos limites e das possibilidades que se criam para o exercício de uma prática pedagógica competente.

A função docente exige do professor uma série de condutas que o farão reconhecido como alguém que transforma o seu saber e o seu poder em recursos para o bem da coletividade com que trabalha, fazendo bem o que lhe compete. Exige, além disso, determinadas virtudes, qualidades, que poderão auxiliá-lo no dia-a-dia, como a humanidade, a curiosidade, a coragem, a capacidade de decidir e de colocar limites, comprometendo-se na busca dos objetivos a que se propõe.

O conhecimento crítico da realidade em que desenvolve seu trabalho e dos valores que aí se encontram e que o norteiam é ponto de partida para a organização do trabalho do professor na escola. Esse conhecimento envolve questões diretamente relacionadas ao trabalho em sala de aula e questões mais amplas, que extrapolam esse âmbito. O professor assume, ao mesmo tempo, duas tarefas: uma delas é conhecer melhor os seus alunos, tanto no que diz respeito estritamente ao professor, ao ensino e à aprendizagem como a desejos, interesses e dificuldades experimentados por eles em suas vidas; a outra é a ampliação do conhecimento de si mesmo.

A aprendizagem de atitudes pelos adolescentes e jovens requer o reconhecimento, por parte dos adultos, das características psicológicas e sociais dessa fase. É um aprendizado longo, complexo, contínuo, não-linear e, às vezes, difícil para o adolescente, exigindo do professor a criação de estratégias que possibilitem o desenvolvimento das atitudes desejáveis.

Nessa etapa da vida, os alunos ampliam a sua capacidade de analisar situações complexas, considerar diferentes fatores envolvidos e construir critérios de justiça. Porém, tendem a desacreditar nesses critérios quando percebem que neles não se deposita confiança alguma. Tanto as crianças como os adolescentes e jovens apreciam muito os sinais de confiança que os adultos lhes dão quando mostram que acreditam neles. E ficam tristes e infelizes quando incessantemente reparam olhares suspeitosos sobre eles, quando percebem que são, sem mais nem menos, considerados desonestos, sem palavra, sem caráter. Sentem-se — e de fato são — injustiçados num ambiente de suspeição. Precisam perceber que confiam neles e que serão cobrados por merecer tal crédito. Para alguém ter e permanecer tendo confiança em si (elemento importante do respeito próprio), nada melhor do que sentir que os outros acreditam em sua palavra. Negar-lhes — de antemão — esse direito resulta em distanciá-los de um convívio social enriquecedor.

A investigação assume papel importante no processo de ensino–aprendizagem, na medida em que possibilita um conhecimento ampliado das características da família dos alunos, da estrutura de atendimento da região em saúde, cultura, esporte, lazer, etc. Conhecendo criticamente essa realidade, o professor terá condições de pensar em conteúdos significativos que orientem a construção do plano de ação da área de conhecimento com a qual trabalha e pensar em como adequar o conteúdo previamente estabelecido à realidade em que atua.

A busca de conhecimento de si mesmo é outro desafio para o professor. Ele é parte integrante da realidade que investiga. É importante pensar que ele tem como desafio fazer a leitura da realidade com o objetivo de coletar informações para compreendê-la, isto é, buscar seu sentido, sua significação. Isso requer do professor discernimento para que o seu juízo de valor e sua crença, ainda que influenciem, não determinem por princípio os rumos da investigação.

Do ponto de vista ético, é fundamental que, ao planejar as atividades que serão trabalhadas com os alunos, os professores selecionem conteúdos que explicitem e despertem a curiosidade pelas diferentes formas de organização social e cultural existentes no mundo e pelos diferentes valores que sustentam o convívio, na escola e fora dela.

O professor e os adultos que convivem com o aluno na escola precisam estar atentos, especialmente para os aspectos que envolvem as relações pessoais no interior do processo de ensino–aprendizagem. A atenção, a afeição, a amizade, o distanciamento e a omissão contribuem para a formação de atitudes desejáveis ou não. Ao longo de sua vivência na escola, o aluno desenvolve uma série de idéias sobre o papel dos adultos, posicionando-se frente a esse papel de acordo com as respostas que recebe nas diversas situações. O comportamento dos adultos funciona, muitas vezes, como modelo, afirmado ou negado pelos alunos. Se o objetivo do trabalho com o tema transversal Ética é a formação de atitudes de bem viver em comunidade, é importante que haja uma atenção especial com a qualidade das relações que se pretende viver na escola.

A gestão democrática da escola supõe a participação de todos nas decisões que ali se tomam. As decisões tomadas entre quatro paredes, apenas por uma pessoa ou por um pequeno grupo, comprometem todo o convívio escolar, causando desagradáveis situações de revolta, desinteresse e omissão. A participação exige uma tomada de consciência sobre os valores presentes no processo educacional e um posicionamento crítico em relação a eles. Quando juntas para decidir algo, mesmo com a intenção de colaborar para a melhoria da vida em comum, as pessoas deixam transparecer suas crenças, suas preferências pessoais e mostram, às vezes, resistência a considerar posicionamentos diferentes ou opostos. A explicitação dos posicionamentos divergentes, o debate, a troca e a consulta a todos os que fazem parte da instituição, à luz de princípios eleitos por seus membros como norteadores da ação, auxiliam as tomadas de decisão.

Nas instâncias de participação em que estão presentes membros representativos dos diferentes segmentos da escola, com freqüência surgem conflitos que exigem negociação, para que a escola realmente atenda aos anseios da comunidade e, ao mesmo tempo, seja valorizada por ela.

Um projeto pedagógico que inclua o trabalho com os temas transversais exige dos professores um redimensionamento de sua ação, uma vez que esse trabalho envolverá, além do conteúdo específico de sua área, a preocupação em trabalhar com valores. Todas as áreas do conhecimento e todos os temas transversais têm contribuições a oferecer no sentido de incentivar valores fundamentais para a formação do cidadão.

Fonte: Parâmetros Curriculares Nacionais – Temas Transversais – 5ª a 8ª séries – pp. 76 a 79.

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