Edição 61

É dia...

Amar o povo

Pe. Zezinho

O povo é bonito. Feio é quem não gosta dele. Feio por dentro. Existe o povo, e existem aqueles que não se sentem povo. Por alguma razão, eles estão aqui, e o povo, lá. Se um dia foram do povo, alguma coisa os tirou do povo. O dinheiro que possuem, o cargo, a profissão, o talento e a fama os colocaram ou num Olimpo, aonde a maioria do povo jamais chegará, ou num lugar onde o povo não entra, aonde o povo não sobe.

Há os que o povo não considera povo. Ou porque são ricos e podem mais do que a maioria dos mortais ou porque não são anônimos como o João, o Tião, a Maria e a Filomena. Há também os que não se consideram povo. Alguns gostam de gente e adoram ir ao povo. Representam o povo. Governam o povo. Lideram o povo. Pastoreiam e servem o povo. Mas entendem que não são mais do povo. Foram tirados do meio do povo para, de algum modo, voltar ao povo: alguns para ajudar, outros para manipular e massificar.

O artista canta, dança ou representa para o povo. O bom político vai saber o que o povo quer. O mau político vai atrás de votos e, geralmente, só volta depois de quatro anos. Pregadores procuram adeptos. Padres celebram com ou para o povo: depende do seu conceito de igreja. O banqueiro seleciona a quem, do povo, ele emprestará o dinheiro, que, no fundo, é do povo. O atleta joga ou se exibe para o povo.

Palavra linda, que anda em todas as bocas. Todos falam de povo e ao povo. No seu íntimo, porém, não se sentem povo. Privilegiados pelo dinheiro, pelo poder ou pela fama, já não fazem parte da maioria. E, sem o perceber, falam do povo como “ele” ou “eles”. Acontece com todos nós que falamos ao povo. Raramente usamos a palavra nós. Raramente nos incluímos. Povo são os pobres e os que não saíram do anonimato. Quem teve acesso a alguma forma de privilégio trai, no gesto e na linguagem, a sua condição de povo.

Não é vergonha não ter a cara do povo. Vergonha é rir da cara do povo. O povo, às vezes, engana–se e vota errado, mas, um dia, sente quem gosta dele e quem não gosta. Por isso, elege e deselege, consagra e excomunga seus modelos na arte, na fé e na vida.

Nas últimas eleições, com milhares de populares, ajudei a eleger o prefeito. Tirei-o da condição de povo. Por um bom tempo, ele não vai ter privacidade nem anonimato. E ontem, quando terminei aquela missa para 6 mil pessoas, senti a mesma coisa. Quem não é do povo, se não puder ir ao povo, pode, ao menos, fazer algo pelo povo, de onde estiver. Se não fizer, morre azedo e sem ternura. Amar o povo é a única maneira de se realizar. Quem ainda não sabe, pare e pense: o povo não é Deus. Mas, sem ele, não se chega a Ele.

cubos