Edição 21

Lendo e aprendendo

Charles Perrault, Irmãos Grimm e Andersen

Charles Perrault

Era uma vez um monte de histórias que existiam há muitos anos e que eram contadas de pai para filho. Um dia, por volta do século XVII, um francês chamado Charles Perrault ouviu essas histórias e resolveu escrevê-las. Graças a ele, até hoje todo mundo conhece Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, A Bela Adormecida e tantos outros personagens clássicos.

Charles Perrault nasceu em Paris, em 12 de janeiro de 1628. Célebre por dois fatos principais: a participação que teve na Querela dos Antigos e Modernos, como supremo campeão destes últimos, e a autoria, em 1697, dos contos de fadas que imortalizaram o seu nome (Contes de ma mère l’Oye, conhecidos em português como Contos da Carochinha). Obtendo desde logo o maior êxito, esses contos foram traduzidos para quase todos os idiomas e passaram a dominar o universo maravilhoso das crianças: A Bela Adormecida no Bosque, Chapeuzinho Vermelho, O Barba-azul, A Gata Borralheira, As Botas de Sete Léguas e tantos outros que estão definitivamente integrados no folclore infantil. Era o filho caçula de uma família importante; seu pai e seus quatro irmãos pertenciam à corte do rei da França, Luís XIV.

Foi durante a Querela que Perrault redigiu os seus contos para crianças, publicados com títulos diferentes: Histórias ou Contos do tempo passado e Contes de ma mère l’Oye. Perrault d’Arma-Court tinha, na ocasião, dez anos de idade. O mérito do escritor foi ter fixado numa forma simples e elegante os contos tradicionais e anônimos da memória popular. O real e o maravilhoso harmonizam-se de maneira perfeita, refletindo, em seus contos, as concepções romanescas do século XVII.

Perrault foi denominado Homero Burguês, pela propriedade com que retratou a sociedade de sua época a partir da metamorfose de certos símbolos dos contos populares. Seu trabalho consistiu em transformar os monstros e animais — aos quais os camponeses atribuíam poderes mágicos — em fadas.

Em sua vasta obra, A Gata Borralheira é o símbolo do personagem humilhado e maltratado. O Gato-de-botas é o pícaro a tirar proveito da corrupção social. O Pequeno Polegar é o anão astuto que vence gigantes bobos. Ou seja, seus personagens se armam com os atributos da inteligência e da perspicácia para vencer a força bruta: o poderoso opressor.

Perrault foi responsável pela introdução dos desprivilegiados nos salões, em contos cujas personagens são as mais estereotipadas: a madrasta, o lobo e os irmãos mais velhos são sempre maus. Os fortes e poderosos são de nítida descendência canibalesca, de devoração dos mais fracos.

Charles Perrault utiliza o confronto dualista entre bons e maus, belos e feios, fracos e fortes, como exercício de crítica à corte. Não raro, os personagens que representam as classes discriminadas se tornam superiores à nobreza pela inteligência.

Merece especial relevância no universo da literatura infantil por adaptar contos do indo-europeu, estabelecendo um modelo de conto de fada que foi seguido por diversos autores.

Dos sucessores que teve, poucos atingiram a sua perfeição e qualidade.

Foi um ótimo estudante. Serviu ao rei como advogado, arquiteto e inspetor de obras públicas. Foi eleito membro da Academia Francesa, pela sua produção literária, em 1671. Dedicou seus últimos anos aos seus escritos e à educação dos filhos. Publicou os primeiros trabalhos em 1691. Morreu em 1703, em Paris.

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Irmãos Grimm

No início do século XIX, dois irmãos apaixonados por contos de fadas tiveram a mesma idéia de Perrault e saíram por aí pesquisando fábulas e adaptando-as à literatura infantil. Foram os irmãos Grimm que revelaram ao mundo personagens como Branca de Neve, Rapunzel e João e Maria.

Jacob e Wilhelm Grimm, os irmãos Grimm, nasceram na localidade alemã de Hanau. Jacob, o segundo de uma família de nove filhos, nasceu em 1785, e Wilhelm, um ano depois. Com a morte do pai, em 1798, ambos foram morar na casa de uma tia, na cidade de Kassel (Alemanha), onde terminaram os estudos secundários e iniciaram o curso de Direito.

Por volta de 1806, tiveram acesso a uma coletânea de poesias populares, que leram com grande interesse. Entusiasmados pela ingenuidade daqueles poemas, que foram transmitidos oralmente de geração a geração, começaram a reunir e a escrever os contos tradicionais narrados nos serões familiares, em uma época em que isso era muito comum, porque não existia outra diversão. Em 1812, publicaram uma primeira coletânea com 86 contos, seguida, dois anos depois, por uma outra, que reunia mais setenta contos. Para reunir as histórias, os dois irmãos percorreram a Alemanha conversando com muitas pessoas.

Em 1825, Wilhelm se casou com Henriette.

Dorothea, casada com um alfaiate em Kassel, encontrou os Grimm — então bibliotecários da cidade — numa feira onde fora levar uma cesta de verduras. E Wilhelm e Jacob, percebendo o quanto ela sabia das histórias populares — ouvidas na cervejaria do pai, quando criança — passaram a convidá-la semanalmente, nos dias de feira, à sua casa, recolhendo, assim, os quase 220 contos de seu livro, cujas edições, em 140 línguas, somam mais de trinta milhões de exemplares.

Nessa época, os artistas e intelectuais europeus buscavam recuperar as tradições dos diferentes povos, afastando-se dos cânones clássicos gregos e latinos. Além disso, a descoberta de que a maioria das línguas da Europa derivava de uma antiga língua comum, chamada indo-europeu, fez com que o interesse pelos idiomas não-latinos, como o alemão e o polonês, aumentasse. No caso dos irmãos Grimm, foi o interesse pela tradição oral que os levou a estudar com profundidade a língua alemã e as suas origens.

Os irmãos Jacob e Wilhelm Grimm, filólogos e folcloristas, são considerados, o primeiro, como o criador da moderna filologia germânica, e o segundo, como o fundador do folclore moderno. Jacob é responsável, também, por uma das primeiras traduções para a língua alemã da Edda Poética. O legado deixado por eles é importantíssimo para a preservação e o estudo da mitologia germânica. Ambos faleceram em Berlim; Wilhelm em 1859 e Jacob em 1863.

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Andersen

Tal como fizeram os irmãos Grimm, Andersen foi um escritor que se preocupou, essencialmente, com a sensibilidade exaltada pelo Romantismo. Com seu extraordinário talento para criar encantadores contos infantis, conquistou reconhecimento mundial e estimulou a imaginação de um sem-número de crianças e adultos.

Hans Christian Andersen, que Paul Hagard considera como “o príncipe dos escritores da infância”, nasceu na cidade dinamarquesa de Odense, em 2 de abril de 1805. Era o único filho de um modesto sapateiro, que costumava lhe narrar antigos contos populares, e de uma lavadeira. Menino sensível, preferia entreter-se sozinho e inventar histórias a brincar com outras crianças. Como vinha de uma família pobre, Andersen não teve instrução, mas isso não o impediu de vir a freqüentar os salões de aristocratas e reis. Como o pequeno Hans gostava muito de histórias, o pai construiu um teatro de marionetes para que ele pudesse representar. Quando tinha onze anos, seu pai morreu e o deixou nas mãos de três mulheres que não poderiam lhe servir de exemplo: uma avó “seca e rude”, uma mãe alcoólatra e uma irmã prostituta. As dificuldades financeiras forçaram-no a tentar um ofício, mas sua índole introspectiva e delicada tornava-o alvo de zombaria entre os colegas.

Aos catorze anos, mesmo com tão pouca experiência teatral, Andersen empreendeu a grande aventura da sua vida: partiu sozinho para Copenhague, disposto a triunfar como ator e cantor nos palcos da capital. Porém, como a sua aventura não deu muito certo, teve de voltar para a escola para terminar os estudos. Tinha dezessete anos e compartilhava as aulas com crianças muito mais novas do que ele. As contínuas piadas de que foi vítima naquela época serviram-lhe de inspiração para escrever o conto O Patinho Feio.

Desiludido com sua experiência teatral, decidiu tentar a sorte com a literatura. Em 1827, publicou os seus primeiros poemas, atraindo a atenção de Jonas Collins, diretor do Teatro Real de Copenhague, que lhe financiou os estudos na Universidade de Copenhague.

Andersen viveu a época do Romantismo, durante a qual músicos e escritores abandonaram os cânones e os temas clássicos universais e começaram a buscar inspiração na Idade Média, nas tradições populares e na cultura própria de cada nação. Andersen era admirador dos grandes românticos alemães, como Goethe e Schiller, e, das suas longas viagens pela Alemanha, França, Itália, Grécia, Turquia e Inglaterra (onde se tornou amigo do grande escritor Charles Dickens), obteve material para os seus maravilhosos contos. Também fazia anotações em diários, que lhe serviram para escrever interessantes livros de viagens que tiveram muito sucesso na época.

Andersen teve uma vida solitária. Nunca se casou, mas sabe-se que foi apaixonado por uma cantora de ópera sueca chamada Jenny Lind. Maravilhado com o seu talento e a sua voz, dedicou-lhe o belo conto O Rouxinol do Imperador. Mesmo tendo partido em 4 de agosto de 1875, Andersen deixou mais de uma centena de reinos encantados, onde, ainda hoje, brincam felizes crianças de todo o mundo.

É considerado o precursor da literatura infantil mundial. Em função da data de seu nascimento, comemora-se, em 2 de abril, o Dia Internacional do Livro Infanto-juvenil.

Fonte: COLL, César e TEBEROSKY, Ana. Aprendendo personagens: conteúdos essenciais para o ensino fundamental. São Paulo: Ática, 2000. p.119 a 123.

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