Edição 61

Em discussão

O brincar e sua função na intervenção psicopedagógica em instituições escolares: o que dizem os psicopedagogos?

Diogo Sá Neves
Shirley Cristina Lacerda Malta

A Psicopedagogia compromete-se, primordialmente, com o sistema educativo no que diz respeito às dificuldades de aprendizagem, buscando levar o educando a integrar-se, respeitando sua individualidade. A presente pesquisa propõe verificar a opinião dos psicopedagogos institucionais em relação à relevância da utilização das brincadeiras nos processos de intervenção psicopedagógica no contexto escolar, abordando a brincadeira como um instrumento facilitador na intervenção aplicada aos alunos que apresentam dificuldades na aprendizagem.

Palavras-chave: Psicopedagogos, intervenções psicopedagógicas, brincadeiras.

Introdução

As razões de nosso interesse pela pesquisa sobre o que dizem os psicopedagogos sobre a função do brincar na intervenção psicopedagógica em instituições escolares foram decorrentes da necessidade de conhecer, de forma mais aprofundada, o fenômeno para, a partir de então, intervir nessa realidade.

A pesquisa científica em questão surgiu através da necessidade de se analisarem as contribuições que as atividades lúdico-pedagógicas podem oferecer para os trabalhos de intervenção psicopedagógica. A importância da referida pesquisa reside em viabilizar uma análise voltada ao ambiente de aprendizagem, focalizando a temática lúdica como um meio de intervenção nas circunstâncias que possam ocorrer nos procedimentos de ensino-aprendizagem.

A importância desses processos, o campo de trabalho e o papel que os psicopedagogos desempenham nas escolas são pontos que compõem esta pesquisa, além da discussão dos conhecimentos multidisciplinares que os psicopedagogos devem ter para uma maior compreensão do processo de aprendizagem humana, favorecendo a metodologia adequada para o desenvolvimento de suas intervenções.

Objetivos

A pesquisa em tela tem por objetivo geral verificar a opinião dos psicopedagogos acerca da importância do brincar nas intervenções psicopedagógicas no contexto escolar; e por objetivos específicos investigar os fatores que as brincadeiras propiciam ao desenvolvimento cognitivo da criança no âmbito escolar, caracterizar as contribuições que o brincar proporciona às intervenções psicopedagógicas na instituição escolar e identificar os fatores relevantes que o brincar encaminha nas relações existentes entre o aluno e o conhecimento.

Referencial teórico

Oliveira (1993) afirma que Vigotsky trabalha com o brinquedo e que, para ele, o brincar é também um domínio da atividade infantil que estabelece claras relações com o desenvolvimento. A autora dá continuidade apresentando que:

Comparada com a situação escolar, a situação da brincadeira parece pouco estruturada e sem uma função explícita na promoção de processos de desenvolvimento proximal na criança, tendo enorme influência em seu desenvolvimento (OLIVEIRA, 1993, p. 65—66).

Especificamente, Vigotsky aponta a importância do brincar como auxiliar no desenvolvimento, focando a brincadeira de faz de conta. Para comprovar essa concepção, Oliveira (1993), em seu livro, descreve o seguinte trecho:

Quando Vigotsky discute o papel do brinquedo, refere-se estritamente à brincadeira de faz de conta, como o brincar de casinha, brincar de escolinha, brincar com um cabo de vassoura como se fosse um cavalo. Faz referência a outros tipos de brinquedo, mas a brincadeira de faz de conta é privilegiada em sua discussão sobre o papel do brinquedo no desenvolvimento (OLIVEIRA, 1993, p. 66).

Ribeiro et al. (2004) esclarece que, para Vigotsky, o brincar promove uma Zona de Desenvolvimento Proximal, pois é nesse momento lúdico que a criança comporta-se num nível que ultrapassa aquele a que já está habituada, acarretando vantagens para os aspectos sociais, cognitivos e afetivos.

Winnicott (apud MALUF, 2005, p. 20) faz colocações fundamentais acerca do brincar. Dentre elas, a autora cita: “As crianças têm prazer em todas as experiências de brincadeiras física e emocional”. A autora dá continuidade apontando alguns aspectos relevantes à função do brincar defendido por Winnicott, como a organização para iniciação das relações emocionais, encaminhando o desenvolvimento de contatos sociais; o domínio das angústias; a evolução da personalidade infantil; entre outros pontos necessários para a maturação da criança.

Moyles (2002), em seu livro, relata que o brincar, como processo, proporciona uma ética da aprendizagem em que as necessidades fundamentais desta podem ser suprimidas. Elas englobam as oportunidades de praticar, escolher, imaginar, adquirir novos conhecimentos, criar, observar, pensar, questionar, elaborar pensamentos e entendimentos coerentes e lógicos, como também a comunicação e a memória.

Metodologia

Na pesquisa, quatro psicopedagogos atuantes em instituições municipais na cidade do Recife responderam um questionário contendo indagações relacionadas à temática. Utilizamos o procedimento da pesquisa qualitativa. A metodologia empregada compreende o método de abordagem dialética, e a técnica utilizada para coleta de dados contemplará a abordagem direta extensiva (questionário).

Resultados

A partir dos resultados da investigação, pôde-se perceber que, para os psicopedagogos pesquisados, a brincadeira se torna uma forma de interação e socialização prazerosa que proporciona a troca de conhecimentos de modo espontâneo e necessário no processo de ensino.

Os especialistas abordados pontuam que as brincadeiras proporcionam um rendimento favorável ao desenvolvimento desse processo, pois as crianças interagem e aprendem de forma natural e divertida, sem as pressões de um ambiente estranho, podendo externalizar o que as incomoda, quebrando as barreiras de forma espontânea.

Dessa maneira, a concepção dos psicopedagogos sobre a função do brincar reflete-se em sua prática, e, consequentemente, esta prática reflete resultados positivos em seu trabalho. Assim, faz-se importante integrar a brincadeira ao processo de intervenção, o que supõe intencionalidade, objetivos e consciência da relevância dessa ação em relação ao processo de busca, a uma aprendizagem significativa.

Considerações finais

A análise da relevância das brincadeiras nos remete a melhor refletir sobre a condição do especialista em Psicopedagogia, que busca sanar os empecilhos que se situam nos rumos do aprender dos alunos.

Nesta pesquisa, apontamos a perspectiva facilitadora por esta entender as brincadeiras, de forma geral, como sendo uma maneira mais propícia de possibilitar ao aluno que possui dificuldades na aprendizagem um caminho prazeroso e natural para solucionar sua dificuldade em relação ao objeto de estudo que ainda não foi assimilado. Utilizando-se da brincadeira nas intervenções, o psicopedagogo poderá se beneficiar dos aspectos da diversão e do prazer que algumas atividades proporcionam e, dessa maneira, configurar o que seria somente uma brincadeira em algo a mais, conseguindo estimular a aprendizagem dos conteúdos que até então não tinham sido absorvidos.

Acreditamos no grande valor que o brincar propicia às intervenções psicopedagógicas e ressaltamos ser necessário que todos os psicopedagogos tenham essa concepção, para que possam contribuir no processo de aprendizagem, tornando-se mediadores nos conhecimentos dos estudantes. Diante do apresentado, esperamos que esta reflexão traga elementos para um salto qualitativo da intervenção psicopedagógica no âmbito escolar.

 

Referências bibliográficas

BOSSA. Nadia A. A Psicopedagogia no Brasil: Contribuições a partir da Prática. 2 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
MALUF, Ângela Cristina Munhoz. Brincar: Prazer e Aprendizado. Petrópolis RJ: Vozes, 2005.
MOYLES, Janet R. Só Brincar? O Papel do Brincar na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2002.
OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vigotsky: Aprendizado e Desenvolvimento – um Processo Sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1993.
REGO, Teresa Cristina. Lev Vigotsky: O Teórico do Ensino como Processo Social. Revista Nova Escola Grandes Pensadores. São Paulo, nº 19, Ed. Abril, julho de 2008.
RIBEIRO, Aparecida de Fátima et al. Jogos, Brinquedos e Brincadeiras no Processo Ensino-aprendizagem. In: Akrópolis – Revista de Ciências Humanas da
Universidade Paranaense, v. 12, n. 4, out./dez., 2004.

Diogo Sá Neves é pós-graduado em psicopedagogia pela FAFIRE.

Shirley Cristina Lacerda Malta é professora da UPE – Campus Nazaré da Mata e da pós-graduação da FAFIRE.

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