Edição 81

Em discussão

Aprender e ensinar em família

Isabel Parolin

familia_ilustra_MelleF_fmtVamos tomar o seguinte relato como fonte de nossas reflexões: “Eu aprendi, na minha vida toda, que a gente tem de ter opinião… Saber o que fala e, se falar, manter aquela opinião. A mãe dizia que quem fica mudando de opinião é maria-vai-com-as-outras. Bem, a professora reclama que eu não mudo minha opinião… Isso é chato, pois ela não entende e não me entende! Ela quer que eu fique fazendo coisas que não quero e que não gosto… Bem chato” (Juliana, 12 anos).

“A Juliana tem 12 anos e se acha a dona da verdade. Tem tido algumas dificuldades na escola e na vida em geral, mas não aprende. É meio turrona. Perde as amigas por bobagem. Acha que só ela sabe escolher as melhores brincadeiras e, na escola, erra e não quer refazer. Diz que a professora a persegue… Bem difícil! Aborrece, sabe como é? Ai! Que preguiça!” (Laura, mãe de Juliana).

Vivendo e aprendendo

Uma pessoa aprende ao dar significado a um conteúdo ou a uma experiência que tenha sido refletida. Nessa perspectiva, viver e aprender torna-se uma equação.

A reflexão, articulada com o que foi vivenciado, conecta-se a outros conteúdos, que já faziam parte do repertório da pessoa, e torna-se um novo conhecimento. Esse conhecimento passa a fazer parte dos instrumentos pessoais para que a pessoa possa bem viver e conviver.

A forma como cada um faz esse movimento — o de aprender — varia de pessoa para pessoa, pois depende de múltiplos fatores que compõem o estilo de cada um. Ter alguém que faça a mediação entre o sujeito que precisa e quer aprender com o conteúdo a ser aprendido é bastante importante.

Uma criança sozinha, sem as perguntas e argumentações que ajudam a pensar, pode tirar conclusões que são parciais ou até inadequadas. Nem tudo o que tem quatro patas é cachorro, porém o cachorro tem quatro patas. Como diferenciar? A observação, o pensar sobre o assunto e as mediações de um adulto ajudam a criança a entender e a diferenciar os animais e suas patas.

À medida que a criança vai crescendo, espera-se que fiquem mais complexas suas elaborações mentais, suas compreensões e intervenções em seu contexto socioafetivo.

Desaprender?

Para que uma aprendizagem aconteça, o aprendiz desenvolve muitos movimentos de apropriação e integração do novo conteúdo com outros que já faziam parte do seu repertório pessoal. Algumas vezes, precisaremos desaprender coisas anteriormente aprendidas para que novas aprendizagens ocorram. Como assim, desaprender? Desaprender o que ficou obsoleto ou inadequado. Ex.: antigamente, as pessoas apertavam os hematomas para que não crescessem galos. Hoje, sabe-se que os galos precisam crescer e que o gelo é bem-vindo nesses casos. Portanto, desaprender-se porque o conhecimento era parcial.

E aí entra o caso de Juliana. Ela aprendeu algo com sua família que lhe fez bem e, possivelmente, foi instrumento importante de convívio social, num determinado momento. Agora, em um novo contexto, ela precisa desaprender essa verdade. Imagino que a mãe tenha lhe ensinado isso numa situação bem específica, para que ela não desobedecesse alguma regra que outras crianças estavam desobedecendo.

A Juliana precisa distinguir o que é opinião pessoal e o que é ser maria-vai-com-as-outras. Para se desenvolver opinião, precisamos pensar sobre o que mereceu nossa atenção e análise e ponderar o que o outro pensa e analisa. Ouvir o outro e considerá-lo como um ser pensante, ou seja, digno de nossa atenção. A mediação de um adulto mais competente ajuda muito.

Uma criança sozinha, sem as perguntas e argumentações que ajudam a pensar, pode tirar conclusões que são parciais ou até inadequadas.

Juliana precisa aprender que mudar de opinião não desmerece a pessoa se essa mudança é consequência de um movimento intelectivo, se ela compreendeu que a mudança provocará nela desenvolvimento pessoal. A aprendizagem provoca o nascimento de outros olhares, de outras formas de entender o assunto.

O que Laura, mãe da Juliana, precisa aprender? Que a aprendizagem é um processo que se estende ao longo da vida e que é essencial que ela continue a ensinar sua filha. É preciso analisarem, juntas, de onde vem essa convicção para que seja possível a construção de uma nova aprendizagem.

Isabel Parolin é psicopedagoga e consultora institucional, Mestre em Psicologia da Educação, autora de livros destinados à escola e à família.
Endereço eletrônico: www.isabelparolin.com.br

 

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