Edição 12

Livro da vez

Como um romance

Como um romance é o sugestivo título do livro do escritor francês Daniel Pennac, publicado pela editora Rocco, em tradução de Leny Werneck. Trata-se da exposição de sua teoria sobre o estímulo à leitura entre os jovens, baseada em muitos anos de prática como professor de Literatura em liceus de Paris.

A questão da leitura vem preocupando cada vez mais todos que trabalham com o ensino no Brasil, cujas pesquisas e conclusões visam despertar toda a sociedade para sua responsabilidade ante o problema, cada vez mais sério.

Algumas instituições realizam há anos verdadeiras cruzadas no sentido de alertar as famílias para que se ocupem em contar histórias às suas crianças e ofereçam-lhes livros, na medida do possível, além de levá-las às bibliotecas e livrarias especializadas. Congressos e seminários para professores e interessados realizam-se desde 1968 por todo o País, discutindo a questão da leitura e literatura infantil e juvenil e propondo novas formas de atuação da escola, no sentido de tornar a leitura e o livro algo atraente e prazeroso.

Como um romance surge para ajudar todos os que lidam com esse assunto. A proposta de Daniel Pennac é original e fundamentada em sua prática diária. Ele nos mostra, em seu texto, como levar os alunos a lerem, ao despertar sua curiosidade através da leitura em voz alta, feita em classe, na aula de literatura, de obras de grandes autores selecionados exatamente por sua capacidade de atrair os ainda não-leitores. Assim ele começa com O perfume, do alemão Suskind, cujas primeiras páginas “exalam um cheiro bom de tempero, que dilata as narinas e os baços, fazendo rir”, segue com García Márquez, Ítalo Calvino, Stevenson, Dostoievski, Jorge Amado e tantos outros, entre vivos e mortos.

“Somos habitados por livros e amigos.”

Pennac parte do princípio de que paramos de ler em voz alta logo assim que somos obrigados, na escola, a fazê-la silenciosamente. Com isso, o que era grande prazer — ouvir — torna-se um esforço por vezes grande demais. Isso leva ao afastamento do livro, situação que a escola ajuda a piorar através de constantes exercícios para aferir o grau de compreensão da leitura. O prazer de ler, este está esquecido…

Muitos dados objetivos são lembrados por Daniel Pennac. Ele, por exemplo, sempre pede a seus alunos que escrevam sobre a frase de Flaubert “Leia para viver” e descobre espantado que todos concordam com a importância da leitura. Os motivos são vários: para aprender, para compreender a vida e outros igualmente vagos. Nada do gênero: porque me diverte ou porque é bom.

Pennac assegura que nunca seus alunos esperaram para conhecer o fim do livro em aula. Sempre terminaram antes do professor. Depois vêm as conversas sobre o autor, o gênero, o estilo, mas o prazer da leitura já foi descoberto e, a partir dele, tudo virá por acréscimo. Ele lembra também que a leitura não é um ato de comunicação imediata, mas objeto de partilhamento. Nossas melhores leituras resultam da sugestão ou de presente de amigos. “Somos habitados por livros e amigos”, diz ele.

No entanto, Daniel Pennac adverte para o fato de que nem todos continuarão a ler literatura pela vida afora e sistematiza os direitos do leitor, propondo dez itens, cujo primeiro é o direito de não ler. E demonstra que a causa principal do afastamento da juventude é o medo de não compreender o que lê. Por isso, a intermediação do adulto se faz ainda necessária nas classes mais adiantadas.

E assim, como um romance, Daniel Pennac teoriza sobre sua prática num livro que terá lugar certo na estante e no coração dos professores mais atentos de todo o País.

Como um romance (Comme un roman), de Daniel Pennac, tradução de Leny Werneck. Editora Rocco, 168 páginas.

DIREITOS IMPRESCRITÍVEIS DO LEITOR

1. O direito de não ler.
2. O direito de pular páginas.
3. O direito de não terminar um livro.
4. O direito de reler.
5. O direito de ler qualquer coisa.
6. O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível).
7. O direito de ler em qualquer lugar.
8. O direito de ler uma frase aqui e outra ali.
9. O direito de ler em voz alta.
10. O direito de calar.

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