Edição 75

Espaço pedagógico

Onde se formam os cidadãos?

Mari Malheiros

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A cidadania deve ser considerada o espírito de uma nação. Somente um povo participante na luta e na efetivação de direitos é um povo comprometido com a soberania nacional e a prevalência dos direitos humanos. Sem a cidadania, é impossível falar em democracia e república, tampouco em Estado de Direito.

O conceito de cidadania passou por um longo processo de evolução. Juridicamente, cidadania consiste na titularidade de direitos políticos através do sufrágio. O termo surgiu do latim civitas, que significa cidade. A cidadania era o pertencimento de um indivíduo a uma comunidade politicamente articulada, o que lhe trazia direitos e deveres.

Uma cidadania completa

Hoje em dia, a ideia foi ampliada também para direitos não só políticos, mas sociais — como educação, saúde e lazer —, com princípios mais coletivos e que visam a uma igualdade material. Nesse ponto, os movimentos sociais e a participação ativa da população foram fundamentais para essas conquistas em grande parte do mundo.

A partir dessas informações, é possível entender cidadania como o direito de opinar, criticar, acompanhar, lutar por direitos e escolher, através do voto, o que é mais importante para toda uma comunidade politicamente articulada. Cidadania é participação na vida pública. É o direito de ter direitos.

Com o registro de nascimento, uma criança é inserida no processo de cidadania. Mas, dentro do conceito jurídico, só será cidadã aos 16 anos, quando puder votar, e só terá cidadania completa a partir dos 18, com o direito de ser votada para um cargo público. É claro que antes ela poderá participar e atuar na vida pública. Hoje, alguns estados e municípios possuem projetos de deputados e vereadores mirins, em que crianças e adolescentes discutem políticas públicas para sua faixa etária. São iniciativas que buscam o protagonismo de jovens cidadãos e maior eficácia na aplicação de políticas públicas por parte dos gestores.

Mas existem outros meios já tradicionais de inserção na cidadania. A família e as igrejas são excelentes espaços para o diálogo e a participação de crianças, adolescentes e jovens, mas são limitados por suas próprias tradições e dogmas. A sociedade contemporânea é plural, com outros tipos de família e religião. Para uma formação cidadã completa, é preciso aprender a respeitar e conviver com o diferente.

À escola é que cabe essa função. É ali que a cidadania se torna completa. Na escola, crianças, adolescentes e jovens irão, de fato, aprender a participar da vida pública na sua dimensão mais ampla: opinando, questionando, sugerindo, respeitando as diferenças.

Por uma vivência concreta

Na atualidade, é difícil trabalhar cidadania no ambiente escolar. Isso se deve, principalmente, à desvalorização da vida pública. O consumismo desenfreado e o individualismo exacerbado não dão espaço para o ser cidadão, mas para o ter poder de consumo. Cidadania se tornou um conceito meramente jurídico, o que é excelente para os donos do poder. Um povo sem interesse pela vida pública manterá esse sistema que seleciona pelo poder aquisitivo. O neoliberalismo é um consumidor de cidadãos.

Por isso, é importante não reduzir as aulas a meros cursinhos preparatórios para o vestibular, que exaltam a cultura individualista pregada pelo capital. Ao contrário, deve-se incentivar debates sobre os diversos temas de política, a participação nas conferências oficiais e livres, a criação de grêmios estudantis e conselhos de alunos, a criação de páginas nas redes sociais e blogs, em que os estudantes podem opinar sobre o colégio e todos os assuntos de interesse social.

O mínimo a se fazer é escutar o que os alunos dizem. No momento em que essas manifestações são eliminadas por professores e diretores de forma brusca, o adolescente/jovem perde a motivação para participar da vida escolar. A cidadania não pode ser somente um assunto presente nos currículos escolares. Cidadania é vivência concreta. A luta pela efetivação de direitos precisa ser feita por todos — independentemente da idade — e passar pela escola.

Sugestão de filme

A Corrente do Bem (2000)

Desafiado por seu professor, um estudante cria um jogo em que, a cada vez que alguém receber um favor, este deve ser retribuído a três pessoas diferentes. A ideia funciona, e a vida dos envolvidos passa a ganhar um novo sentido.

Atividades

Cantar pelos direitos

Objetivo: Conscientizar para a participação cidadã através da música.

Desenvolvimento: Muitos artistas brasileiros já usaram músicas para expressar indignação com uma condição social ou a fim de engajar o povo. Até Quando? (Gabriel, O Pensador), É (Gonzaguinha), Pacato Cidadão (Skank) e Comida (Titãs) são alguns exemplos.

Após a leitura do artigo, convide os jovens para, em grupos, selecionarem músicas que tenham um caráter de reivindicação de direitos.

Ao final, os grupos apresentam as músicas (recitadas como um poema ou cantadas) e explicam a relação que fazem com a cidadania.

Mari Malheiros é advogada, pós-graduanda em Direito Constitucional, ativista dos Direitos Humanos e integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Guarapuava, PR.

Endereço eletrônico: nanamalheiros@hotmail.com.

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