Edição 92

Espaço pedagógico

Preparando para o início de um novo ano letivo

Denise Tinoco

O período de férias é necessário para todos, pois o corpo pede descanso e novas possibilidades de interação. No caso da criança, o período de férias deve servir para quebrar a rotina, servir como estímulo para novas brincadeiras e descobertas, sedimentação dos conteúdos estudados no período anterior, estreitamento de laços familiares e período dedicado a experiências novas e enriquecedoras. Proporcionar momentos de descanso, lazer e novas aprendizagens durante as férias dos filhos torna-se mais uma função da família.

Ocorre que muitos pais se esquecem dessas necessidades. Por não terem período de férias em conjunto com os filhos, deixam os dias de descanso sem monitoramento. Daí, temos os filhos passando muitas horas diante da TV, jogando videogames ou nas redes sociais. Isolados, crianças e adolescentes contemporâneos correm o risco de saírem das férias mais estressados do que quando estavam no período letivo. Relax total também pode trazer problemas no retorno escolar. Por isso, durante as férias, a família deve reservar uma hora do dia para leituras, atividades de concentração, jogos de tabuleiros e atividades em grupo. Já nos dias mais próximos da chegada do início ou reinício do ano letivo, torna-se essencial organizar a rotina para que o corpo se acostume com os novos horários e necessidades. Assim, estabelecer um novo horário para dormir, horário para as refeições e a organização do espaço de estudo são atividades fundamentais para um início ou reinício letivo menos conflituoso para todos.

Existem escolas que organizam atividades de reforço online e também grupos de estudos semanais, como rodas de leitura, exibição de filmes com debates, ciclo de palestras, que poderão ajudar na reestruturação da rotina que antecede o retorno ao ano letivo.

Ritmos diferentes estão presentes até entre irmãos. Ninguém é igual a ninguém. Por isso, pais e professores precisam aceitar e organizar rotinas diversificadas para que sejam respeitadas as diferenças e todos possam efetivamente aprender! Mas, na escola, no ensino formal, no fazer docente cotidiano, isso fica mais evidenciado, pois nem sempre aquilo que ensinamos é apreendido por todos da mesma forma. Trabalhar focado nas teorias da aprendizagem pode nos ajudar a entender melhor essas necessidades e a buscar soluções viáveis para as questões. Por exemplo, a Teoria de Vygotsky nos fala sobre a Zona de Desenvolvimento Proximal e o papel do mediador, do “par mais forte”, neste contexto. Dessa forma, para que o aluno possa transpor tais obstáculos, por vezes invisíveis, mas reais, o professor deverá ficar atento às potencialidades e necessidades discentes, buscando atividades variadas e pares que possam, ao longo do ano letivo, favorecer a transposição dos desafios. Assim, oferecer momentos para atividades diversificadas é importante e deve ser considerada uma estratégia eficaz. Trabalhos em grupos ou em duplas ajudam a quebrar a rotina e fortalecem a necessidade de interação entre os pares. Variar a arrumação das carteiras escolares é uma atitude simples que também traz benefícios. Atividades em laboratórios também são fundamentais para criar um clima de ensino e pesquisa que privilegia os diferentes ritmos. Visitas técnicas, palestras com profissionais de diferentes áreas, exibição de filmes, gincanas, exposições de trabalhos, criação de Feiras de Ciências, Festivais de Poesia e Música podem amenizar a rotina, favorecer diferentes ritmos dos alunos e possibilitar diferentes formas de aprendizagem.

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Embora a família seja uma instituição social milenar, percebê-la como integrante do processo de aprendizagem escolar de crianças e jovens é um fenômeno novo que demanda aceitação, diálogo e muito estudo. Por um lado, as escolas fantasiam com tipos de família e participação dessas famílias que não existem ou, na maioria, não existem dentro do contexto social contemporâneo. Isso faz com que deixem de fora a maioria das pessoas que podem contribuir com o processo de aprendizagem dos alunos durante o período escolar. Por outro lado, as famílias, por vezes, sobrecarregadas com a rotina dura de sobrevivência, acomodam-se e se omitem na tarefa de educar ao lado da escola. As famílias podem ajudar no processo de ensino-aprendizagem escolar percebendo-se como coparticipantes dessa jornada. Dessa forma, acompanhar atividades escolares dos filhos, participar efetivamente das reuniões da escola, verificar agendas e solicitações escolares, criar rotina de estudo para os filhos, fortalecer o respeito pelos mestres e espaço escolar dentro de casa, conversar com professores sistematicamente na escola, conversar com os filhos sobre os resultados escolares e estabelecer metas bimestrais podem melhorar e fortalecer seu papel junto da escola, na construção de uma aprendizagem honesta e coletiva. Buscar engajamento nos projetos sociais da escola, organizar grupos de estudo com colegas de turma, trabalhar a disciplina com quadro de horários são possibilidades de interação com a escola que certamente renderão bons frutos.

Muitos teóricos da educação são categóricos em afirmar que a socialização é um processo mediante o qual uma pessoa adquire o conhecimento e a prontidão social, necessários para assumir o papel de sujeito, na organização à qual pertence. Sendo assim, é preciso que a escola, como instituição, e o professor, como agente social deste espaço, percebam-se como facilitadores do processo de socialização dos alunos. Dessa forma, promover atividades de socialização torna-se essencial para diferentes aprendizagens discentes. Vejamos alguns exemplos: organizar gincanas entre turmas; realizar visitas a museus, planetários, empresas, ONGs; organizar ciclo de palestra na escola; criar intervalos culturais com os alunos; elaborar festivais de poesia, eventos de tecnologia, mostras de cinema; e criar campanhas solidárias estão entre as atividades que podem favorecer a socialização, pois buscam estabelecer links com conteúdos estudados, ampliando a visão social destes conteúdos no cotidiano dos alunos e oportunizando a ampliação da visão de mundo entre eles.

Educação de forma plena e eficaz é o que desejamos para nossos discentes e o que buscamos em nossa profissão. Perceber que os alunos entenderam nossa proposta, verificar que estão engajados em projetos sociais, que se preocupam com o ambiente em que vivem e desejam mudanças sociais para todos é tão especial como receber um prêmio por nossa atuação durante o processo de ensino-aprendizagem daquele grupo. Para tal, é importante que a escola elabore seu Projeto Político Pedagógico de forma conjunta e honesta. Que trace uma proposta pedagógica que seja capaz de inserir o novo no seu contexto carregado de conteúdos e dilemas. Ao professor, caberá a elaboração de planos de ensino viáveis, conectados com a sociedade, dinâmicos, capazes de suscitar a participação de todos e de cada um. Voltar aos bancos escolares, buscar especializações, conhecer lugares, ler mais, buscar ajuda do seu “par mais forte” também será necessário. Num mundo cada vez mais individualizado e competitivo, caminhar na contramão e fazer nosso alunado se perceber parte desse mundão, são tarefas das mais complexas, que exigirão apoio institucional e familiar nos moldes já mencionados. Se desejarmos fazer parte do novo, teremos que planejar esse momento, trabalhar por ele, mudar nossa maneira de ver e estar no mundo e modificar nossas ações no cotidiano da escola. Afinal, como disse nossa eterna Elis Regina, “O novo sempre vem!”. Eu completo: tomara que possamos fazer parte dele!

 Denise Tinoco é pedagoga e professora universitária.

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