Edição 22

A fala do mestre

Villas Bôas

Nome de família dos irmãos brasileiros que se distinguiram, em meados do séc. XX, como indigenistas e sertanistas.

Orlando Villas Bôas

Nascido numa fazenda de café em Botucatu, interior de São Paulo, em 12 de janeiro de 1914, era filho de fazendeiros. Trabalhou em escritório de advocacia e serviu ao Exército — onde só obedecia “às ordens que julgava certas”. Depois de um período na área de contabilidade da Esso, pediu demissão e foi com os irmãos para o Mato Grosso, atrás da Marcha para o Oeste, em 1943. Numa época de Brasil rural, quando consciência ecológica era algo impensável, os Villas Bôas optaram por manter o verde em vez de asfaltar.

Orlando enfrentou o desafio de fazer o que acreditava ser certo. Mudando a mentalidade de uma expedição desenhada para massacrar, os Villas Bôas reescreveram a história da colonização do Brasil central. No lugar do rifle, adotaram o abraço, o respeito e a palavra.

No contato com os índios, as lições aprendidas com o Marechal Rondon: “Morrer se for preciso; matar nunca”. Passaram por cima de interesses religiosos e comerciais e ainda formaram uma geração de líderes indígenas, como o cacique Aritana dos iaualapiti — verdadeiro estadista.

Além dele, também Cláudio, Leonardo e Álvaro defenderam os índios. Jovens da classe média paulista, abandonaram seus bons empregos em empresas da capital para se aventurar no Centro-Oeste. Disfarçados de sertanejos, os primeiros empregos que conseguiram na Expedição Roncador-Xingu foram: Orlando, auxiliar de pedreiro; Cláudio e Leonardo, na enxada. Com Cláudio e Leonardo, fez o reconhecimento de numerosos acidentes geográficos do Brasil central. Em suas andanças, os irmãos abriram mais de 1.500 quilômetros de picadas na mata virgem, onde surgiram vilas e cidades.

Cláudio Villas Bôas
Nasceu em Botucatu–SP, em 1916. Chefe da vanguarda da Expedição Roncador-Xingu, que atravessou pela primeira vez o território xavante, voltou ao posto Diauarum em 1951, depois que a expedição se encerrou, e radicou-se ali. Entre 1957 e 1958 chefiou outra expedição, que, partindo da Serra do Cachimbo, no sudoeste do Pará, chegou aos rios Cururu e Creputiá. Com o irmão Orlando, pacificou as tribos juruna, caiabi, txucarramãe, suiá, txicão e crenacarore. Orlando e Cláudio publicaram, além de um diário sobre a longa expedição inicial, trabalhos como Xingu: os índios, seus mitos (1971) e Índios do Xingu (1972).

Leonardo Villas Bôas
Nasceu em Botucatu–SP, em 1918. Membro, como os outros, da Expedição Roncador-Xingu, viveu depois, por vários anos, no posto Jacaré, no alto Xingu. Em 1961, foi encarregado de fundar um posto no alto Kuluene, mas adoeceu e teve de ser retirado do sertão. Pacificou os índios xicrin, ramo caiapó, do sudoeste do Pará, e tomou parte na Operação Bananal (1960), organizada no governo de Juscelino Kubitschek. Foi também chefe da base xavantina. Enfraquecido por doenças tropicais, morreu de miodicardite reumática em São Paulo, a 6 de dezembro de 1961.

Álvaro Villas Bôas
Nasceu em São Paulo–SP, em 1926. Trabalhou, como os irmãos, na área do Xingu (1961–1962), mas fixou-se em São Paulo, onde se dedicou a dar apoio logístico às missões realizadas no interior do País. Chega a assumir a presidência da Funai por um curto período de tempo, em 1985. Morreu na cidade paulista de Bauru, em 22 de agosto de 1995.

Orlando Villas Bôas
Foi o maior dos humanistas que conhecemos. Defende a necessidade de instalação de um parque indígena, o que é atendido em 1961 com a criação do Parque Nacional do Xingu pelo presidente Jânio Quadros. Orlando dirige o parque de 1961 a 1967 e toma parte nas negociações para a convivência pacífica das dezoito nações indígenas lá instaladas. Participa ainda dos primeiros contatos com os txicãos (1964) e os crenacarores (1973). Aposenta-se em 1975, mas continua a trabalhar e a defender o direito dos índios de viverem em uma sociedade separada da dos brancos. Publica diversos livros, entre eles Marcha para o Oeste, com a história da Expedição Roncador-Xingu, ganhador do Prêmio Jabuti 1995 de melhor reportagem. Em 1997 lança o livro Almanaque do Sertão, em que narra seus 45 anos de andanças pelas matas brasileiras. A Fundação Nacional do Índio (Funai) o demite por fax no início de 2000 por acumular um salário com uma aposentadoria, o que não era permitido. Mesmo com convites para voltar, prefere continuar prestando assessoria à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde trabalhou por 34 anos.

A Escola de Medicina de São Paulo enviou carta à Real Academia Sueca, em Estocolmo, apoiando a candidatura de Cláudio e Orlando Villas Bôas ao Prêmio Nobel da Paz de 1971, lançada pela Sociedade dos Povos Primitivos, de Londres, por iniciativa do sertanista britânico Adrian Cowell. A informação foi dada no Rio de Janeiro pelo professor Noel Nutels, que manifestou seu propósito de deflagrar uma campanha pública para conseguir a adesão de novas instituições à candidatura dos dois sertanistas brasileiros.

No mesmo ano (1971), Madre Teresa de Calcutá também era candidata. “Quando eu soube, desisti de concorrer. Ela merecia muito mais do que eu.”

Já no fim da vida, Orlando começou a escrever uma autobiografia, que jamais chegou a ser lançada.

Morreu aos 88 anos (12/12/2002), no Hospital Albert Einstein, na capital paulista, de falência múltipla dos órgãos.

Fontes de Pesquisa
http://www.amigdalassecas.hpg.ig.com.br/biografias.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/1961
Almanaque Abril: Quem é quem na História do Brasil. São Paulo: 2000, p. 486.

cubos