Edição 06

Lendo e aprendendo

Viva a criança

“Ó Ciranda,

Cirandinha,
Vamos todos cirandar.
Uma volta, meia volta,
Volta e meia vamos dar” …

Quem não se lembra de quando era pequenino, de ter dado as mãos pra muitas crianças, ter formado uma imensa roda e ter brincando, cantando e dançando por horas?

Quem pode esquecer a hora do recreio na escola, do chamado da turma da rua ou do prédio, pra cantarolar a “Terezinha de Jesus”, aquela que de uma queda foi ao chão e que acudiram três cavalheiros, todos eles com chapéu na mão? E a briga pra saber que seria o pai, o irmão e o terceiro, aquele pra quem a disputada e amada Teresinha daria, afinal, a sua mão?

E aquela emoção gostosa, aquele arrepio que dava em todos, quando no centro da roda, a menina cantava: “sozinha eu não fico, nem hei de ficar, porque quero o… (Sérgio? Paulo? Fernando? Alfredo?) para ser meu par.” E aí, apontando o eleito, ele vinha ao meio pra dançar junto com aquela que o havia escolhido… Quanta declaração de amor, quanto ciuminho, quanta inveja, passava na cabeça de todos…

E havia ainda a história triste do “cravo que brigou com a rosa”, da “Senhora Sancha” toda coberta de ouro e prata e ladeada de anjos…E a “viuvinha” que tinha que escolher se queria se casar com “o filho do Conde ou com o Sr. General”, que aprece, eram os melhores partidos casamenteiros em disponibilidade e com aceitação, provavelmente por seus títulos…

E que pena que todos tinham daquela que “foi ao Itororó beber água e não achei, achei bela morena que no Itororó deixei”, que abandonou a amada morena porque deu seca no Itororó… E as risadas gostosas e maliciosas quando o menino escolhia uma da roda e cantava para ela: “Maria, sacuda a saia, Maria abre o teu braço, Maria tem dó de mim, Aí Maria me dá um abraço”, e o abraço era dado a Maria que ficava roxinha de vergonha, com o coração batendo em ritmo acelerado?

E ficar horas brincando de dar um ofício para uma das filhas de Vossa Senhoria, enquanto o cavalheiro dizia: “Manda o tiro, tiro lá”, até escolher a filha certa e a profissão que ela almejava? E aquelas cantigas que terminavam com um incompreensível “Caranguejo não é peixe, caranguejo peixe é, caranguejo só é peixe na enchente da maré”? Até que a roda inteira das crianças cantava com força e fazia festa dizendo:”Palma, palma, palma, pé, pé, pé, roda, roda, roda, caranguejo peixe é.”

Estas cantigas de roda e tantas, tantas outras, marcaram a infância de todos… E vieram de tão antigamente, quando as avós de nossas avós já faziam roda, dava, as mãos e cantavam por horas estas cirandas tão belas, tão plenas de elementos importantes, significativos, belos… Que falam de amor, de saudade, de abandono, de trabalho, de escolha do companheiro, de brigas, de tristezas, enfim, de tudo que faz parte da vida de todos…

E se “a canoa virou, por deixar ela virar, foi por causa de Maria que não soube remar”, não vamos ser como esta Maria que deixa a canoa – de tudo que é importante – virar… Nem é preciso saber remar… É só lembrar destas nossas cirandas, parte fundamental da cultura popular brasileira e ir brincando junto, fazendo roda com as crianças na escola, na rua…

Pra ninguém poder dizer depois que “ o anel que tu me deste, era vidro e se quebrou, o amor que tu me tinhas, era pouco e se acabou”… As cirandas não podem ser quebradas não, de maneira alguma, não são de vidro coisa nenhuma e só querem muito amor, para não acabarem no esquecimento… Porque elas fazem parte da nossa história de vida (por trabalharem com tantos elementos importantes da condição humana…) e da história de nosso país.

cubos