Edição 46

Ambiente-se

Ensinando e aprendendo a fazer perguntas

Eduardo Garcia C. do Amaral, Fernando Isao Kawahara e José Luiz Pastore Mello

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É de grande alcance o trabalho com o Mito da Caverna, de Platão. Trata-se de um dos textos mais conhecidos de toda a História da Filosofia, que recebeu inumeráveis adaptações e versões. Seja como for, o Mito da Caverna forma uma imagem do que é a Filosofia, mas não só: tem a ver também com toda forma de conhecimento quando desafia aquilo em que acreditamos e subverte nossas crenças. É por causa disso a admiração da qual falávamos. Em que acreditar? Por que acreditar nisso e não naquilo? Afinal, o que é a realidade? É esta na qual acreditamos? Por quais critérios definimos o que é real e verdadeiro? E alcançar o real, mais do que nele acreditar, é conhecê-lo? E se o real não for nada daquilo em que acreditamos? Tais são as perguntas que o Mito da Caverna suscita.

A primeira reflexão que propomos em alguma atividade com os alunos é que pensem a respeito dessas perguntas que enunciamos há pouco. De um modo geral, poderemos esperar como respostas dos alunos afirmações como “É real aquilo que é ‘concreto’, aquilo que eu posso ver, tocar, sentir…”. Nesse sentido, o critério que estabelece o que é real seriam as sensações. Poderíamos, então, dirigir aos alunos novas perguntas, como as que se seguem: Mas será que não consideramos também real aquilo que ouvimos falar, a depender de quem fale? Não acreditamos, por exemplo, nas imagens que vemos na televisão e no que nos diz o apresentador do jornal por confiarmos em sua palavra? Por acreditarmos, enfim, que o jornal que se apresenta na TV deve nos dizer a verdade dos fatos? Não acreditamos, por exemplo, na palavra do professor, por acreditarmos que ele deve saber a verdade? Pois há ainda outro critério para estabelecermos o que é real, ou o que acreditamos ser o real, que seria a confiança naquele que fala, por acreditarmos em sua autoridade. Mas também não perderíamos essa confiança, caso o jornal mentisse descaradamente ou que assim julgássemos? Ou, no caso do professor que dissesse coisas que contrariam o que sempre se aprendeu na escola, e julgássemos a sua fala como falsa, também não perderíamos confiança em sua autoridade?

Outro critério, portanto, seria o nosso próprio julgamento, daquilo que nos parece ser real, isto é, verossímil, a partir dos critérios de que falamos antes e mais este: conforme aquilo que estamos mais habituados, mais familiarizados, acostumados, aquilo que nos parece mais “comum”? Dissemos: comum, de acordo com nossa comunidade. E não julgamos que o que é comum é também natural?

Percebe-se, na última pergunta lançada, como é o nosso próprio julgamento que é posto em dúvida — o que há de causar uma “admiração vertiginosa”, sem dúvida! —, e, assim, retornamos mais uma vez às perguntas iniciais.

Um segundo passo para o trabalho em Filosofia seria o de partir para a leitura do próprio texto do Mito da Caverna para tentarmos identificar como Platão nos apresenta a questão, como a realidade, considerada primeiramente tudo aquilo que pode ser visto na caverna, muda completamente quando aquele que estava acostumado com as sombras da caverna, que as tomava como reais (como a única realidade), é forçado a sair da caverna e ver o que há fora dela — ver os objetos dos quais conhecia apenas as sombras projetadas na parede da caverna.

Como já dissemos, o Mito da Caverna ganhou várias adaptações. Queremos chamar a atenção para duas delas. A primeira é uma história em quadrinhos, Sombras da vida, de autoria de Mauricio de Sousa, em que o personagem Piteco envolve-se num enredo baseado no texto de Platão. A partir dela, os alunos poderão fazer as comparações com o texto. Há, no entanto, uma ressalva: a versão acaba por identificar as sombras da caverna com a televisão. Se isso é de menor alcance em relação à teoria de Platão, para quem as sombras representam o próprio mundo visível, dos fenômenos, das aparências, tal como nos aparecem, pode, todavia, ser bastante interessante associar tais sombras aos produtos da indústria cultural, cujo maior ícone é a televisão.

A outra sugestão — aliás, já bastante difundida entre os professores — é a exibição do filme The Matrix (1999), cujo enredo tem forte inspiração no Mito da Caverna. O professor poderá formular questões como as que já nos referimos — o que é a realidade e quais são os critérios pelos quais julgamos algo real —, de modo a orientar os alunos para a leitura do filme. Estaríamos nós na Matrix?

Eduardo Garcia C. do Amaral é professor de Filosofia.
Fernando Isao Kawahara é professor de História.
José Luiz Pastore Mello é professor de Matemática.

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O Mito da Caverna
Rafael Santana Soares

Platão foi um grande filósofo, e o Mito da Caverna é muito interessante porque reúne as condições psicológicas do ser humano. Podemos observar que a história fala que havia homens aprisionados em uma caverna, e esses homens nunca tinham visto o mundo em sua forma natural, eles apenas viam sombras (a cor cinza da vida).

Conta Platão que um desses homens conseguiu escapar das correntes com que era aprisionado. Esse homem que escapou foi o único que conseguiu ver a realidade, por isso também queria leva-la para os outros que estavam aprisionados dentro da caverna, mas, como eles acreditavam que a verdadeira realidade era aquela das sombras, não confiaram no que aquele homem que dizia conhecer a verdadeira realidade estava dizendo, por isso pegaram-no e o mataram.

Platão elaborou essa fábula para que as pessoas pudessem perceber que há muitas coisas que nós acreditamos em função do nosso modo de pensar. Na historinha em quadrinhos do Piteco, elaborada por Mauricio de Sousa, baseada no Mito da Caverna, o autor faz uma espécie de comparação entre aqueles tempos remotos e hoje, mostrando alguns homens assistindo à televisão. No meu ponto de vista, Platão queria nos mostrar que aqueles homens primitivos se encantavam assistindo às sombras e achavam que a vida deles fosse apenas isso e nada mais, e Mauricio de Sousa retrata que os tempos de hoje estão se tornando semelhantes ao Mito da Caverna, porque do mesmo modo que aqueles homens primitivos ficavam obcecados por aquelas sombras, os homens de hoje em dia estão obcecados pela televisão e por outros meios de comunicação.

A mídia está trazendo danos à saúde da população atual. Por causa da televisão, o índice de obesidade aumentou muito, já que as crianças, os jovens e até mesmo os adultos passam mais tempo diante dela do que cumprindo com suas obrigações. As crianças estão se tornando mais agressivas por causa dos filmes, desenhos e seriados. As novelas levam o sexo para as pessoas de qualquer idade e, por isso, o índice de natalidade aumentou tanto, com as pessoas fazendo filhos cada vez mais cedo. Muitas crianças nunca tiveram um contato maior com a natureza nem com alguns animais porque a televisão mostra essa natureza e esses animais de forma comum, isso traz uma realidade inexistente a essas crianças, tirando assim a curiosidade delas.

O Mito da Caverna
Alexandre Ferreira Prodi

O Mito da Caverna nos leva a pensar em alguns pontos da nossa vida (da minha especificamente). O próprio mito nos revela como nos distraímos com algumas coisas tão banais e fúteis da vida ou, como no mito, com as sombras em 2D. Assim, não analisamos o contexto e a beleza das coisas mais profundamente — ou o dono da sombra. Os personagens prisioneiros ficavam admirando as sombras das pessoas, dos animais, objetos que passavam, mas não viam como eram esses objetos realmente, não podiam ver como as pessoas e os animais eram, sua cor, sua forma, sua aparência, só viam a sombra, e não os donos das sombras. Mas, quando um deles resolveu conhecer o mundo fora da caverna e tentou acordar os outros para a realidade, foi morto, porque achavam que somente aquilo, as sombras, era a realidade, somente aquilo mostrava “o fascinante show da vida”.

No nosso hoje, não é diferente. Como na cômica história de Mauricio de Sousa — As sombras da vida com Piteco —, o homem, o ser humano, tem se voltado para a mídia, para as “fofocas”, “novelas”, “filmes”, entre outras coisas, achando que aquilo que ele está vendo, assistindo, é a mais pura verdade, quando muitas vezes não é. Nada contra as noveleiras ou fofoqueiras de plantão, mas o homem coloca um cabresto em si mesmo, dizendo que somente o que a mídia faz ou mostra é o certo, quando muitas vezes tudo é programado — como, por exemplo, o “famoso” Big Brother, no qual todas as pessoas são contratadas e possuem um roteiro, orientando como fulano ou beltrano devem atuar — ou a informação está errada — as famosas fofocas de Leão Lobo — ou filmes que contam uma realidade totalmente diferente fazem com que a pessoa acredite, por exemplo, em magia, duendes, fantasmas, entre outras coisas.

A pessoa fica tão vidrada na TV ou no rádio ou em outro meio de comunicação qualquer, que não para para observar a realidade à sua volta, não abre os olhos para contemplar a vida. Uma pessoa assim só se movimenta, só vive se for através da mídia e não sai para analisar se aquilo que estão apresentando para ela é verdade, se aconteceu realmente, como foi, se existe mesmo aquilo que foi falado… Não se interessa em descobrir a vida através de outros meios — como em um esporte, um bom livro, uma viagem, um trabalho — ou até mesmo indo ao parque próximo da sua casa, se é que ele sabe que existe um parque perto de sua casa.

Nossa vida não é um mar de rosas, tudo fácil-fácil. Mas, se quisermos que seja, devemos batalhar por isso. Devemos aproveitar cada segundo como se fosse o último, e não ficar somente na figura em 2D, mas nos aprofundar nas formas e nos formatos das coisas em 3D, ou seja, não ficar só nas coisas planas, mas nos aprofundar mais nas coisas da vida, saber os “porquês” e aproveitar os momentos da vida como se fossem os últimos, abrir os olhos para a realidade e ver a vida como ela realmente é.

E, para terminar, uma frase célebre: “Conhece-te a ti mesmo…” ou és um simples vidrado na mídia?

O texto de Alexandre Ferreira Prodi e o de Rafael Santana Soares circulam na internet. Se você sabe quem é o autor, escreva-nos, pois queremos dar os devidos créditos.

O mito da Caverna

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História em quadrinhos adaptada da Turma da Mônica, As Sombras da Vida com Piteco, de Mauricio de Souza. A versão original dessa história encontra-se em www.turmadamonica.com.br

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