Edição 08
Matérias Especiais
E o brincar onde está?
Nos dias de hoje, vê-se uma profunda mudança na sociedade, por causa de uma tumultuada inversão de valores. Por conseqüência, a fase da infância, para crianças, vem acumulando sérios abalos destas transformações, seja pela reorganização familiar ou pela nova demanda do ritmo de vida, e nossas crianças, cada vez mais cedo estão sendo cobradas a assumir responsabilidades e a superar suas limitações. Deste modo, a escola como não poderia deixar de ser, também soma ao seu papel e cada vez mais se preocupa com o cognitivo, os conteúdos e suas relações.
Neste atual contexto social, que poderão reportar-se nossos futuros adultos e como propõe Casemiro de Abreu com sua poesia: “Oh que saudade que eu tenho da aurora da minha vida da minha infância querida que os anos não trazem mais”, qual o lugar que hoje é “reservado” para as brincadeiras? Diante disto, gostaria de propor uma reflexão a cerca da importância do brincar para o desenvolvimento infantil.
Nossa discussão estará dividida em dois aspectos, o primeiro deles seria o aspecto psicológico. Para este, a criança diante de uma atividade lúdica, de um modo geral, reflete a forma como vê o mundo, já que a brincadeira possibilita vivenciar experiências e aprender com elas. Leva à estrutura da fantasia e da realidade, da tomada de consciência entre si e os outros, o que é de extrema importância para seu desenvolvimento afetivo. É neste contexto que a criança dá um salto muito importante no seu desenvolvimento, saindo de uma visão individualista, introduzindo o outro nas suas relações e gozando de todos os benefícios que esta relação dialética pode trazer, estabelecendo os primeiros passos para o social.
O segundo aspecto, que gostaria de ressaltar, seria o pedagógico. No brincar, as crianças desenvolvem o cognitivo, como a capacidade de mobilizar esquemas a fim de resolver conflitos que surgem durante essas atividades, promovendo, deste modo, o raciocínio. Um outro ponto muito importante a ser considerado é o amadurecimento das habilidades motoras que é proporcionado pelas brincadeiras.
Depois de apontar tantos aspectos importantes construídos e fortalecidos pelas crianças através das brincadeiras, é de suma importância que escola e a família tomem consciência do seu papel na formação e na marca deixada hoje nas crianças que estão impossibilitadas de brincar, direito este assegurado pela Constituição.
De um lado vem a família com suas incompatibilidades de horários e, por sua dinâmica frenética, impondo às crianças um esquema de tarefas exaustivos, que engole a infância e não disponibiliza flexibilidade para brincadeiras livres, devido ao sistema de educação adotado e entendido pelos pais como o mais coerente. Por outro lado, a escola, em suas atividades, não promove um espaço para as brincadeiras, sendo estas bem aceitas quando dirigidas a estimular um aprendizado maior dos conteúdos.
O que a escola não tem considerado é que seu papel hoje é de promover a expansão do potencial das crianças, não só no nível cognitivo, mas também no nível afetivo. A afetividade, de um modo geral, tem uma estreita relação com o aprendizado e é por meio das brincadeiras que a criança começa a estabelecer estas relações, daí a sua importância no desenvolvimento infantil, necessitando de uma atenção específica.
O pedagogo, em suas atividades, deve estar atento aos conteúdos, como também com as relações afetivas desenvolvidas pelos alunos. Para isto, é necessário que o mesmo se destitua de sua condição autoritária e distante, participando com as crianças de suas brincadeiras sem medo de ver seu papel ameaçado, abrindo espaço para o reconhecimento da importância deste momento para o desenvolvimento infantil.
Com este artigo, gostaria de mobilizá-los sobre a importância das atividades lúdicas para o desenvolvimento infantil e o quanto elas têm sido negligenciadas por todos. Assim, proponho este resgate, tanto na família quanto na escola, para que juntos possam promover uma infância feliz e saudável para as nossas crianças, garantindo o espaço para o lúdico a fim de não mais nos indagarmos sobre o seu lugar no desenvolvimento infantil.
ALESSANDRA VERAS SOBRAL
Psicóloga CRP – 02 /11.617