Edição 56

Matérias Especiais

Fraternidade e a vida no planeta

img-1700-01Cada vez mais quente, o planeta agoniza, num duelo desigual, para se livrar das garras da atrocidade humana, que o está transformando numa bomba cujo relógio salienta, num tique-taque inquietante, a contagem regressiva da vida, alertando que pode explodir a qualquer instante, pois o estopim, hiperaquecido, é mantido sob as chamas da insensatez, do interesse financeiro, político, subjetivo… Dessa forma, expõe a vida, esse frágil fio atado ao onipresente, ao flagelo, impelindo-a a vagar por caminhos sem horizontes, à mercê daqueles que põem em xeque o futuro da humanidade.

A iminência está refletida na própria evolução, que busca nas invenções um salto para a perfeição, um atalho para o conforto, por ter na qualidade de vida o alvo, o passo final de uma autorrealização que nunca se satisfaz. Cobiça… Improbidade, deficiência de escrúpulos… Carência de amor ao próximo… O ponto de partida… Violência… Putrefação… Drogas… Iniquidades… As decorrências… A trilha da desordem… O início do fim… O mundo se profanou… Está infestado por agentes da espécie humana que desobedecem a regras, postergam direitos, desrespeitam leis, asfixiam sentimentos, transpõem fronteiras… A própria história.

Entre tentativas e fracassos, conquistas e perspectivas, muitos se perdem pelas veredas do planeta azul, criado para ser o Éden, onde o homem encontraria abastança, paz, bonança… Amor… Eternizaria em harmonia com a natureza, com o semelhante… Com Deus… Mas foi adquirindo outra forma, alterando o tom, a cor… O clima… O Paraíso se transfigurou… Chegou ao intolerável… Transformou-se num inferno: elevação da temperatura, furacões, tufões, ciclones… Catástrofes ambientais… O homem perdeu a noção de liberdade para criar, de limites para consumir, de consciência para crescer… Das próprias responsabilidades na monitoração da vida ao exceder na montagem de veículos poluentes, na utilização excessiva dos recursos naturais, no desenvolvimento industrial, urbano, nuclear e na não utilização de energias renováveis, apadrinhando a proliferação do problema.

A Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2011 da Igreja Católica, Fraternidade e a Vida no Planeta, é um chamado à meditação; um estímulo ao resgate à vida; uma ocasião para a humanidade refletir sobre a distribuição de renda, a ruína dos ecossistemas, o desperdício; uma oportunidade de analisar se os conflitos, as desavenças, as guerras, as agressões ao meio ambiente são necessários para sanar problemas históricos. Será uma chance de rever atos que degradam, atitudes que eliminam, comportamentos que destroem e debater propósitos, restaurar e edificar o mundo que se ambiciona para as próximas gerações.

A escolha do tema sinaliza um momento em que o País se controverte entre a vida e a morte; o moral e o imoral; os princípios religiosos e o interesse de grupos… Momento em que o direito de nascer pode ser obstruído pela sanção de uma lei que delegará aos brasileiros o livre-arbítrio de optar entre transgredir as leis do Criador e agradar ao homem; preferir entre o nascimento de um novo ser e a interrupção de uma vida.

Mas o direito de quem recebeu o sopro não pode ser decidido por outrem, pois todos têm autonomia de usufruir do milagre de nascer delegado pelo Ser Maior: nascer e buscar a oportunidade de viver dignamente ressaltando-se que a arte de viver não é apenas morar, alimentar, estudar, trabalhar, divertir-se, mas ter liberdade para cultuar a vida e fortalecer as bases de uma sociedade cujos integrantes tenham dignidade e autonomia de usufruir dos denodos através da sustentabilidade social, da liberdade política, da escolha religiosa — e não levar uma vida subumana, trucidada pela fome, acossada por epidemias, terremotos, maremotos, secas intermináveis, inundações assoladoras… Superbactérias… Verdadeiros tsunamis de abusos que provocam exclusões e injustiças sociais, em que uma minoria que detém o poder define o destino do mundo. Mundo cada vez mais eletrônico, cujo dispositivo mantém em stand by o ícone da intolerância, da ambição… da discórdia… da brutalidade, sempre ativado para não perder o foco ou se distanciar dos alvos de um progresso que avança às cegas, reduzindo o espaço da vida.

A complexidade do problema é de uma magnitude que provoca acrofobia, pois a elucidação nos conduz ao mundo da ciência, no qual uns creem que a solução está nas atitudes — se o homem assumir posturas ecologicamente corretas, tudo voltará ao normal —, ao passo que outros acreditam que o planeta está em constante processo de mutação, que os fenômenos são consequência do próprio tempo e que a vida é um ciclo natural, estrada de mão única onde todos têm que transitar, e, com isso, muito pouco se tem feito para conter o extermínio.

Há uma necessidade urgente de recapturar a essência humana esvaída através dos séculos e (re)humanizar o homem, pois a globalização disparou o sinal da corrida desenfreada — e ninguém quer perder o contato com o novo, com as tendências universais —, transformando-o, assim, num autêntico predador, um robô movido pelo combustível da ganância, do modismo, que se distanciou do próximo, fazendo da vida um jogo cada vez mais competitivo, e isso está escasseando o tempo para que a criação reconstrua as suas bases de valores.

“Assim como na Educação, promover mudanças de hábitos em que poucos fazem e muitos destroem requer estudos, pesquisas, envolvimento de especialistas, projeções seguras para que não haja colapsos”, salienta Salete Lieven, colunista do jornal A Voz e professora de Língua Portuguesa do Colégio Vera Cruz: “É primordial a conscientização através de entidades, governos, escolas, mas, principalmente, de leis rigorosas e atitudes enérgicas, para a próxima geração não ‘gemer a dor do parto’. E, para isso, é preciso agir com ideias sustentáveis agora”.

Por outro lado, se acompanharmos a marcha da humanidade através da linha que forma o gráfico das ações humanas na natureza, confrontaremo-nos com cenários desoladores: desertos, poluição, fome… E o mais alarmante: poucas ações na busca por melhorias.

Mas o cenário é um palco de mitos que sobressaltam, de verdades que provocam horrores…

As profecias dos cientistas que previam catástrofes naturais em todo o planeta vêm se cumprindo com tamanha precisão que muitos estudiosos já partem para a analogia bíblica e alimentam a crença de que essas ações são prenúncios do fim da era humana na Terra, pois os acontecimentos das últimas décadas são as vozes do clima que ecoam ensurdecedoras, respondendo ao homem que viver requer, no mínimo, o cumprimento de regras e respeito a limites.

Realmente, se imergirmos nos fundamentos bíblico-teológicos, é necessário nos embrenharmos na biografia geológica da Terra, voltarmos todas as páginas do maior livro do universo que narra a história do mundo, a Bíblia, e nos determos em Gênesis, quando Deus decidiu rechear a escuridão do planeta com luz e vida, prosseguir com o sopro que criou o homem, a destruição do Éden, a infestação da Terra pela raça humana e a ira divina que lançou o maior desastre ecológico do mundo, extinguindo toda a vida que respirava sobre a Terra: o dilúvio.

Até esse ponto, é compreensível, pois mesmo os incrédulos se desesperam ante os sinais e se estremecem ao sentirem o peso das mãos de Deus.

O intrigante são as discussões e os tantos questionamentos: a criação, com suas atitudes inexplicáveis, a grande obra do Criador, a quem amou acima de todas as coisas e a ponto de criá-la à Sua imagem e semelhança, delegar a si autonomia para governar a Terra e crer que pode tudo, inclusive desafiá-lo.

E trilha o caminho certo, pois, nas últimas décadas, evoluiu com tamanha presteza que desvendou os segredos do universo, irrompeu os perímetros do espaço, as fronteiras da Terra, a teoria da relatividade… Fez descobertas fantásticas, como a cura de doenças com células-tronco, a clonagem de seres vivos… Cobiça mais… Debulhou o homem para desvendar a sua composição e descobriu o código genético humano… Quer mais: ler pensamentos, monitorar a alma… capacidade restrita apenas ao Criador. E, com tantos recursos disponíveis à ciência, não tardará para se completar com a descoberta maior: chegar à sapiente ilação de que todo mal feito à natureza foi um crime contra si mesmo quando os seus pulmões buscarem oxigênio e aspirarem a essência da destruição.

É nesse fundamento que se elevam as barreiras que dificultam a transição de soluções, pois adicionar os ingredientes da compreensão por meio da introdução de valores para estabelecer o elo entre fraternidade e vida e correlacioná-las com conflitos sociais, religiosos e calamidades ambientais é um desafio sem precedentes, mesmo com as tentativas de instituições e pessoas preocupadas com o futuro do planeta.

Nessa procela de desordens, intentos apostólicos, sociais e ambientais estão em constante transição pelas ações dos predadores do tempo, que almejam o avanço do progresso, sem refletir perdas e consequências futuras, pelo fato de poucos contemplarem o outro a ponto de desejar a sua vitória. Afinal, a vitória do outro é a redução do espaço para crescer?

A ambição pesa as pálpebras, impedindo muitos de elevarem o olhar para o horizonte e vislumbrar que Deus está lá, esperando o momento em que os homens se curvarão diante Dele para que aconteça a comunhão e se exerça o que o profeta Jó predestinou: “Nisto, todos conhecerão que sois meus discípulos se vos amardes uns aos outros”.

Mas como a maioria acredita que a ciência está acima de quem criou a vida, pisoteia a fórmula do remédio que cura a doença da humanidade — a fé, o temor, a obediência, que é a reativação da aliança do homem com Deus — para que as raízes da fraternidade não sejam extraídas abruptamente, fenecendo ressequidas ou inundadas por mais um dilúvio.

Para evitar essas tempestades, é preciso trabalhar sentimentos que separam, interromper atos que agridem, atitudes que extinguem, ouvir a voz do tempo, os gemidos da natureza, as necessidades da terra que se debate para fazer germinar a semente que em seu seio foi plantada, levar o rio que arrasta-se sem forças para chegar ao destino e saciar a sede do mundo.

Sabemos que é impossível conter o desenvolvimento, pois a própria procriação da raça humana exigirá novos espaços para a convivência em sociedade. Contudo, podemos desacelerar os passos do extermínio dando atenção ao planeta, cada vez mais estressado, prestes a atingir o seu limite de produção.

Esse passo não é uma ação impossível: basta reprimir a agressividade dos povoamentos que destroem ecossistemas, contaminam rios, lagos e mares. Isso pode ser feito por meio da educação de hábitos e costumes degradáveis e, por que não? punições por meio de políticas públicas que projetem cidades sustentáveis, onde efeitos do crescimento não exerçam influência sobre as variações climáticas.

Para atingir o alvo, é primordial promover a inter-relação entre clima e biodiversidade, avanço populacional e sustentabilidade e, a partir dessa pressuposição, educar o cidadão para que vislumbre um novo horizonte de progresso, cumprindo as regras de convivência em sociedade por meio do consumo consciente.

“Há uma necessidade urgente de conscientizar a população a viver com responsabilidade, e as instituições religiosas, as escolas, os meios de comunicação devem amadurecer esse pensamento, assumir atitudes para espargir a consciência de que viver é garantir, no mínimo, os subsídios das fontes de alimento”, declara o Padre Aelson Neves, da Paróquia São Benedito. “E as comunidades cristãs necessitam e podem inserir, nos seus programas sociais e educacionais, espaços para questionamentos sobre o futuro do planeta, e isso inclui promover justiça social e justa distribuição de renda, trabalhar o preconceito, o aquecimento global, as variações climáticas e o consumo consciente.”

Entretanto, cada vez que os temas Meio Ambiente, Aquecimento Global e Sustentabilidade são postos em pauta, geram discussões calorosas, conflitos acirrados, contradições, choques de ideias, pois há aqueles que acreditam que o aquecimento é uma dissimulação, uma vez que teses baseadas no princípio de que “a Terra tem um ciclo natural de aquecimento e resfriamento que dura em média 60 anos” — segundo o qual o mar avança de um lado, destruindo cidades, e recua do outro — justificam as mudanças que estamos vivendo.

Esse conceito vem estimulando estudos e ganhando adeptos, a ponto de ter sido debatido no Congresso Mundial sobre Mudanças Climáticas, na Dinamarca, tendo como um dos principais defensores, no Brasil, o físico Luiz Carlos Molion, com vasta experiência adquirida no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que lançou polêmicas desafiadoras. Uma delas é que investimentos e sacrifícios oferecidos na tentativa de reduzir a emissão de gás carbônico (CO²) através da contenção das ações do homem na natureza não devem surtir o efeito esperado, já que ele não tem tanta influência nas mudanças climáticas: “Os fluxos naturais de carbono entre oceano, vegetação, solo e atmosfera somam 200 bilhões de toneladas por ano, ao passo que o homem só participa desse processo com seis toneladas”, declara Molion.

Mas o que impressiona entre burburinhos, cálculos, cargas-d’água e incoerências são os desinformados — mas que têm autonomia política para fazer mudanças dantescas —, perdidos em meio ao tiroteio e crentes de que são capazes de redesenhar o mundo e auxiliar a ciência:

Então, essa questão do clima é delicada. Por quê? Porque o mundo é redondo. Se o mundo fosse quadrado ou retangular e a gente soubesse que o nosso território está a 14 mil quilômetros de distância dos centros mais poluidores, ótimo, vai ficar só lá. Mas, como o mundo gira, e a gente também passa lá embaixo onde está mais poluído, a responsabilidade é de todos.

O grande desafio foi lançado para a ciência: alterar a trajetória da Terra para evitar contágios em zona de contingência no processo de rotação, desvendada pelo cientista, o outro Luiz, o Inácio Lula da Silva, na sua extasiante tentativa de explanar que o aquecimento global é um problema de todos os países.

Ramifica-se nesse terreno uma das raízes do problema: carência de conhecimento ou de interesse de quem determina a execução — o governo; descaso de quem faz cumprir — os órgãos competentes —; e irresponsabilidade de quem necessita — o cidadão… Se não houver consenso e atitudes de cima para baixo, esses ingredientes completarão o “cardápio” de tragédias que o mundo passará a servir no seu dia a dia.

Mas… A quantas andam a fraternidade e a vida em nosso planeta?

img-1700-04Na era em que a vontade dos “senhores do mundo” predomina, um dos maiores desafios no século XXI será reger a orquestra em que a melodia vida não desafine o instrumento sustentabilidade, para que promova a tão sonhada harmonia entre desenvolvimento e meio ambiente e, assim, salve o planeta das garras dos fenômenos que assolam países.

O desafio maior é germinar a semente da solidariedade e do amor num terreno cada vez mais infértil e infestado para que a fraternidade impere num ambiente onde as contendas se tornaram estratégias de sobrevivência. Nesse universo nocivo, fraternidade e vida transitam na contramão, expostas à vontade daqueles que permitem a sua colisão com o rolo compressor do delíquio humano que se farta no jantar, sem se incomodar com o café da manhã do dia seguinte, muito menos com o planeta que deixará para as próximas gerações, cumprindo, assim, o adágio “A farinha é pouca, o meu pirão primeiro” e, com esses “maus modos”, comprimindo, de forma irracional, o espaço da vida.

A situação chegou a um estágio simplesmente desesperador no qual pouca coisa pode ser feita, pois os números mostram índices alarmantes que exigem políticas emergenciais, com as quais governos, empresas, instituições, cidadãos devem assumir suas responsabilidades por meio de posições ativas para refrear as agressões, o consumo desnecessário. Que as potências econômicas retenham os abusos e direcionem um olhar às nações que vivem em total estado de miséria.

As presciências catastróficas inquietam a raça, que apenas debate, mas não atua, e essas previsões levaram a Organização das Nações Unidas (ONU) a se reunir com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) para que se traçassem estratégias para abrigar os “refugiados do clima”, que matará e desapropriará mais do que todas as guerras mundiais.

Especialistas no ramo, como o criador da Teoria de Gaia, o britânico James Lovelock, um dos mais conceituados especialistas em meio ambiente do mundo, vem alertando desde 2006 que o estágio do câncer ambiental do planeta não pode mais ser contido com a “quimioterapia” do replantio de áreas degradadas, como acreditam muitos.

É necessário que se puxe o freio de mão do consumo desenfreado, que se revejam os instrumentos de emissão de poluentes e que os países não se limitem apenas a fazer estudos, análises, suposições… Projeções… É preciso ação, punição severa aos agressores. Se prosseguirmos por esse caminho, sem nenhuma medida de contenção, as catástrofes de hoje serão a introdução do enredo que narrará o fim de milhões e milhões, principalmente quando a água se tornar um líquido raro.

O desrespeito ao meio ambiente chegou ao estado de vandalismo, como se o homem sentisse prazer em jogar com a sorte, brincar com a vida, fazer jogatinas com o futuro do planeta.

A negligência é de uma dimensão cujo controle fugiu do ângulo da visão, pois a deterioração está se convertendo em alternativa de renda que gera milhões por ano: contrabando de animais, caça e pesca predatórias, contaminação de rios, mares, lençóis freáticos… Desmatamentos criminosos… E o mais impressionante: ante os olhos dos órgãos competentes, que continuam vedados pela indiferença, gerando alertas que, há décadas, não são ouvidos, como os do lendário Monteiro Lobato: “A natureza criou o tapete sem fim que recobre a superfície da Terra. Dentro da pelagem desse tapete, vivem todos os animais, respeitosamente. Nenhum o estraga, nenhum o rói, exceto o homem”.

Nessa brincadeira de roedores insaciáveis que não se preocupam em proteger o hábitat, permitindo a degradação, as vítimas são os mais desarmados: animais, aves, plantas… Que vão se extinguindo, secando fontes, e isso é tão melancólico quanto as lástimas do mestre Victor Hugo, que deplorou: “É triste pensar que a natureza fala e que o gênero humano não a ouve”.

Amenizar exige algo mais urgente: decretar estado de emergência na consciência dos governantes para que reciclem ideias e troquem a roupagem da administração, iniciando por uso de energias renováveis, reciclagem de lixo, tratamento de esgoto, montagem de fábricas e automóveis menos poluentes, para que as emissões de dióxido de carbono e metano na atmosfera reduzam e contrabalanceiem as mudanças climáticas que provocam mais aquecimento do que as ações humanas na natureza.

Mas o descaso humano com a vida aponta a direção do fim…

img-1700-06Ter, conquistar… Chega a se tornar obsessão, a ponto de muitos perderem o equilíbrio, o sono, a paz… Acreditarem que agir obedecendo aos instintos para atingir ideais é uma autodefesa instantânea capaz de afastar ameaças, inconscientes de que essas reações são os manifestos da ignorância, que revelam a desestrutura para enfrentar situações que exigem o racional. Racional que pode evitar guerras, surtos… Pandemias… E que estão deixando o mundo em pânico, cada vez que fatos estremecem uma nação.

Parte dessa profecia está lavrada no relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), que revela, de forma apocalíptica, a elevação do aquecimento, num processo surpreendente que está transformando o planeta numa bomba cujas explosões prenunciam a ira da natureza, que a cada grito silencia vozes ao assolar cidades e nações.

Bem que o físico alemão Albert Einstein alertou, há quase cem anos, mas poucos deram ouvidos às palavras do mais célebre cientista do século XX quando declarou: “A natureza, quando agredida, não se defende, apenas se vinga”.

Mas a humanidade é persistente no propósito de destruir, irracional na busca de divisas, irresoluta ao extremo, como uma máquina que confia na força bruta para triturar, ultrapassar… Abrir caminhos pelas entranhas da vida e avançar alimentada pelo combustível tecnologia, que seduz, fascina e a impele a enveredar pela rota traçada por esse predador, pois ele, o desenvolvimento econômico, que está provocando a explosão populacional, exige cada vez mais da natureza: mais cidades; mais alimento; mais desmatamento; mais indústrias; mais automóveis; mais residências; mais esgoto lançado nos rios; mais lixo hospitalar, eletrônico, tóxico… E mais dióxido de carbono e metano disseminados na atmosfera.

Dessa forma, as trilhas abertas pelo universo da vida têm sentido exclusivo, impossibilitando a fraternidade de transitar e garantir a vivência no planeta, com consciência de que é preciso reavaliar políticas sociais, econômicas e ambientais se ambicionarmos um mundo mais ameno, com água e oxigênio.

Por onde começar?

É preciso que as potências econômicas adotem políticas com preceitos para controlar a exploração das riquezas naturais e o consumo e que não olhem para o resto do mundo com ares de predador esfomeado, que encurrala a presa e decide quando servi-la ou usá-la como lixão. Como alerta, Dan Perlman, professor de Estudos Ambientais dos Estados Unidos, disparou o alarme ao criticar o modelo econômico dos países desenvolvidos: “O mundo não suporta mais esse padrão de consumo”.

O acionamento desse alarme necessita de adeptos com poder de promover mudanças e com interesse de fazer com que a fraternidade aproxime nações, pessoas, culturas… Somente assim o mundo encontrará o caminho mais procurado: o caminho da paz. Paz entre os homens, entre as nações, para fortalecer o elo da defesa da vida no planeta.

Em 2011, poderá ser dado o primeiro passo para as mudanças, pois é o Ano Internacional da Biodiversidade, promovido pela ONU, e uma das sugestões a serem adotadas é atender aos conselhos e clamores da Carta da Terra:

A ecopedagogia tem por finalidade reeducar o olhar das pessoas, isto é, desenvolver a atitude de observar e evitar a presença de agressões ao meio ambiente e aos viventes e o desperdício, a poluição sonora e visual, a poluição da água e do ar, etc. para intervir no mundo no sentido de reeducar o habitante do planeta e reverter a cultura do descartável. A tomada de consciência dessa realidade é profundamente formadora. O meio ambiente forma tanto quanto ele é formado ou deformado. Precisamos de uma ecoformação para recuperar a consciência dessas experiências cotidianas. Na ânsia de dominar o mundo, elas correm o risco de desaparecer do nosso campo de consciência, se a relação que nos liga a ele for apenas uma relação de uso.

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Este é o ponto em que estamos: no marco zero de um planeta sem direção, sem clima definido e sem projetos para conter os efeitos fatais do aquecimento global. E, pelo descaso dos governantes, as novas gerações, que já estão sendo educadas para consumir, encontrarão barreiras intransponíveis e poderão não ter espaço para contornar o problema.

Frequentes episódios abalaram o mundo, como o tsunami da Ásia, um dos maiores desastres da história envolvendo inundações após o dilúvio, que deixou um rastro de devastação. O seu poder de aniquilamento foi tamanho que assolou ecossistemas, pessoas, pois a sua fome foi de uma proporção abissal — devorou cidades inteiras —, e, mesmo assim, muito pouco se tem feito ou discutido, talvez pelo fato de as mudanças serem lentas, quase imperceptíveis aos olhos do homem, levando as gerações a não crerem que dependem de atitudes para provocarem mudanças.

O fato é que o planeta vem transformando a paisagem, a geografia: encolhendo num ponto, como o Equador; aumentando em outro, como a distância de polo a polo… Exigindo novos mapas, novas referências… Mais atenção para vislumbrar que as ilhas estão marchando, sendo imersas ou entrecortadas pela violência do mar, cada vez mais profundo e ameaçador.

Na extasiante corrida pela vida, poucos percebem, mas até o tempo está ficando escasso. Três milésimos de segundo a menos por dia. Isso pode não significar nada para uma geração que não olha para trás nem encara o amanhã nem reflete o hoje… Mas esses míseros milésimos podem ser o tempo exato para despertar a humanidade para a vida.

O reflexo choca contra os olhos de um país que tem domínio de uma das florestas consideradas o “pulmão do mundo”, como a Amazônia, e do que ainda resta de mata atlântica, cerrado e caatinga e permite que madeireiros, latifundiários, carvoeiros, mineiros e hidrelétricas reduzam, de forma impiedosa, o seu espaço.

Infelizmente, os políticos do nosso país ainda não atingiram um grau de maturidade ou de responsabilidade para cientificar que a floresta, principalmente a Amazônica, é a veia de escape da vida, por ser responsável pela absorção do veneno que as ações do homem espargem na atmosfera: o dióxido de carbono e o metano. Destruí-la é construir uma fornalha que, ao atingir o seu limite de temperatura, não permitirá manutenção para reverter o erro.

O que fazer?

Principiar pela política, essa contenda desigual, um jogo sem regras. E, na maioria das vezes, é mais fácil chegar a um acordo com adversários do que a um consenso com aliados, pois os adversários disputam um espaço que aceitam dividir, ao passo que os aliados ambicionam a maior fatia do bolo, e isso dificulta acordos.

É fundamental que o novo governo reflita: se o que almeja é uma sociedade de delinquentes, dê sequência ao processo de vista grossa para os problemas sociais, lançando obstáculos que impeçam as nossas crianças de terem acesso a uma educação decente. Mas se o que ambiciona é uma sociedade de cidadãos coerentes, através da inserção de conhecimentos, princípios e valores inerentes à formação humana, mantenha-os no banco da escola por meio de programas que incentivem o crescimento e valorizem a vida.

A perda de autonomia da escola, o despreparo do educador e o descompromisso dos pais não são os únicos fatores da desaceleração da qualidade do nosso ensino. O distanciamento da escola em relação à sociedade poda mudanças, impede a reflexão e o diálogo e transforma o ambiente escolar num local de inclusão.

É preciso reformular esse sistema ultrapassado que, em plena era digital, enfrenta dificuldades para resolver problemas históricos como a indisciplina, a avaliação e a inclusão de novas tecnologias, pois o avanço que proporciona a estrutura para crescer, atrair novas ferramentas e promover o tão sonhado progresso da aprendizagem se desequilibra e erra o ícone “professor” para que este abra uma janela no universo da sala de aula para iluminar vidas.

Esse “vendedor de aulas”, muitas vezes sem noção mínima de computação para dar um simples clique, ligar um computador e navegar na Internet — quando a maioria das escolas estão equipadas com laboratório de informática —, impossibilita a educação de usufruir desse fantástico instrumento no auxílio da aprendizagem.

Sem alternativas, simplesmente permanece estagnado no tempo, com o olhar voltado para o “B” com “A”, “B”… “A”… “BÁ”… Enquanto o seu aluno lá do campo dá saltos gigantescos para o futuro, dominando com maestria as tecnologias disponíveis na escola.

Para esses “transeuntes” pelas dependências da escola, ser educador é um luxo, um sonho tão distante que muitos preferem se acomodar — por serem estáveis — e manter-se alheios aos avanços, por encontrarem dificuldades para se livrar dos ranços.

Enquanto vigorar o jogo do “Você é pior do que eu!” para se chegar a uma vitória nas urnas, sem nenhuma perspectiva de políticas voltadas para o resgate da vida, continuaremos a viver numa nação onde o cidadão, a cada eleição, elegerá caçadores de recompensa, e não representantes comprometidos com o coletivo.

Só que poucos têm discernimento para compreender que a fraternidade é uma conquista e, por ser um negócio que interessa a poucos, resulta no caos em que estamos. Deus, quando quer agir, não pede autorização, licença: simplesmente assola gigantes e eleva anões para provar que Ele é o governador do mundo, o proprietário da vida… E que a Sua vontade é a constituição que regerá para que o mundo obtenha o que mais necessita: justiça.

O reflexo desse poder está na sapiência da natureza, que não reage ao golpe do machado que a sangra, dissipa-a sem compaixão, pois o seu espaço é desejado pelo progresso… Permitindo, assim, ser convertida em cinzas. O seu instinto é tão cordeiro que se curva ante a ignorância do homem e se entrega ao sacrifício… Aceitando ser reduzida, extinta… Para que a humanidade se cientifique de que, sem ela, é impossível a vida.

Mas o homem, no ápice da ignorância, não percebe que as suas reações, os seus sinais, são descargas de fúria e revolta contra a filantropia, salientando, por meio de catástrofes, que é necessário rever conceitos.

Como todo ser que não reflete atos e atitudes, o homem ignora seus gritos, suas reações, e prossegue devastando. E, como o Criador, cujas palavras são ignoradas por muitos, a natureza faz-se de surda… Para não ouvir o ronco dos motores das máquinas que a trituram, arrancam-na pela raiz… E silencia ante os criminosos, pois, mesmo agredida, suprimida em míseras reservas, não pede clemência… Para que a sua dor sensibilize o mundo.

E, assim como o Salvador, que no dia do juízo bradará para muitos “Afastai-vos de mim, malditos”, por não terem obedecido às suas palavras, a natureza também tem as suas leis e declara: “Quando os seus olhos turbarem sob o impacto da última árvore caindo, os homens despertarão para assistir à queda da humanidade”.

E, nesse enredo intrigante que traça a trajetória da vida, ainda há espaço para personagens que podem deliberar entre ser mais um vilão, um mocinho disfarçado ou o protagonista para exercer ativamente o papel: “Escolhe, pois, a vida”.

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