Edição 101

Como mãe, como educadora, como cidadã

Nosso tempo na terra é limitado

Recentemente, perdi meu irmão Nado, com 54 anos, que não conseguiu vencer o vício da bebida. Os últimos momentos dele conosco foram muito especiais.

Ainda estamos vivendo o luto. O luto é um processo individual, mas ter amigos e familiares amorosos por perto, com certeza, ajuda. Viver o luto é trilhar um caminho emocional, mental e fisicamente exaustivo. Foram 37 dias no CTI; quando achávamos que estava melhorando, surgiam outras complicações, e, a cada dia, a situação ficava mais delicada, e tínhamos a certeza de sua partida.

Junto com minhas irmãs, Eliane, Rejane e Nádia, e seu filho Renan, íamos diariamente cantar e orar por ele e por nós também. Foram dias de grande aprendizagem e maturidade.

De início, mesmo sendo um caso grave, os médicos previram que o tratamento manteria sua doença sob controle. Mas, apenas alguns dias depois, ficou claro que ele não sobreviveria. Com o passar do tempo, os médicos ficaram cada vez mais perplexos com a sua falta de resposta ao tratamento. Depois de algumas semanas, as opções tinham se esgotado; foi quando resolvemos optar pela Medicina Paliativa (o paciente passa por cuidados terapêuticos que, principalmente, não o deixam sofrer).

Quando chegávamos ao CTI, conversávamos muito com ele, sorríamos ao lembrar nossa infância. Ele permanecia sempre sedado, mas nós estávamos sempre rezando a Oração da Boa Morte, sabendo que, para algumas pessoas, é complicado dizer que a morte é boa. Gosto muito de estudar o mistério da morte e fico tranquila diante dele. Não me achem louca, mas gosto de falar de morte e sinto paz quando estou enterrando uma pessoa de minha família. A morte deve ser uma coisa fascinante; e o CTI, um processo do purgatório, um encontro consigo mesmo.

O medo de morrer paralisa a maioria das pessoas, impedindo-as de assumir os riscos necessários para cumprir o plano de Deus para sua vida.

Comecei a reconhecer que há uma profunda oportunidade no final da vida para que ocorra a transformação pessoal, trazendo com ela uma nova perspectiva inteligente do significado e do propósito da existência.

Talvez nenhum lugar represente melhor a eternidade que um cemitério. Não é surpresa que eu seja fascinada por velhas lápides e pela vida que elas representam, sabendo que a vida de cada pessoa consiste, na verdade, naquilo que acontece entre duas datas (nascimento e morte).

Houve nesse período um fato interessante: aos poucos os médicos estavam tirando a sedação do meu irmão para ver seu processo, porém em um dos sábados à tarde, como ele estava muito agitado, eles resolveram entubá-lo novamente e aumentaram a sedação.

No domingo pela manhã, quando chegamos, ele continuava sedado e sem reação. Ficamos no horário da visita e fomos para casa aguardar para visitá-lo à tarde. Para surpresa nossa, Nado estava bem esperto, foi uma alegria geral, cantamos, pedi que ele apertasse as mãos de Jane, Nádia, Luciana e Cau, meu marido, ele sempre atento, contei a história da nossa infância, oramos e, no final, pedi que ele dissesse AMÉM.

A morte é mais universal que a vida; todo mundo morre, mas nem todo mundo vive.

Ele balbuciou AMÉM! (Assim seja!)

Depois daquele momento, ele virou o rosto, fechou os olhos e não voltou mais, passou mais cinco dias e partiu.

Na terça-feira antes de sua partida, falei muito sobre a morte dizendo que ao morrermos iremos nos reencontrar com as pessoas que amamos e que ele iria se encontrar com mamãe, papai e o nosso irmão Ronaldo, mas ele não tinha reação.

Acredito que, ao dizer AMÉM, Nado encontrou-se com Deus afirmando “Assim seja” feita a Tua vontade.

Nado voltou para a casa do Pai, e nós ficamos aqui, na certeza de que um dia nos encontraremos.

Até breve, meu irmão.

Zeneide Silva

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