Edição 09

Espaço pedagógico

O conhecimento, os projetos de trabalho e as disciplinas escolares

A Pedagogia de Projetos traduz uma determinada concepção de conhecimento escolar, trazendo à tona uma reflexão sobre a aprendizagem dos alunos e os conteúdos das diferentes disciplinas.

Há uma tendência, bastante generalizada no pensamento pedagógico, em colocar, como questões opostas, a participação dos alunos e a apropriação de conteúdos da disciplina.
Nessa polêmica, podemos identificar um grupo de profissionais da educação que enxerga o conhecimento escolar como a transmissão de um conhecimento já pronto e acabado a alunos que não o detêm. Esse grupo traz uma estreita concepção cientificista do conhecimento escolar, assim representada:

Concepção cientificista conservadora

conconc

Professores com essa concepção, por estarem preocupados com a transmissão de conteúdos disciplinares, acham que não podem abrir uma discussão com os alunos, pois isso significaria perda de tempo e o não “vencimento” dos conteúdos, ao final do ano.

Por outro lado, ao tentar romper com essa concepção, muitos profissionais acabaram negando e desvalorizando os conteúdos disciplinares, entendendo a escola apenas como espaço de conhecimento da realidade dos alunos e de seus interesses imediatos. Essa tendência revela uma concepção espontaneísta do conhecimento escolar, que pode ser assim representada:

Concepção espontaneísta

concesp

Apesar de aparentemente tão diferentes, essas duas tendências têm em comum uma visão dicotômica do que seja conhecimento escolar, acabando por fragmentar um processo que não pode ser fragmentado. Não se pode separar, por exemplo, o processo de aprendizagem dos conteúdos disciplinares do processo de participação dos alunos, nem desvincular as disciplinas da realidade atual.

Os conteúdos disciplinares não surgem do acaso. Deveriam ser fruto da interação dos grupos sociais com sua realidade cultural. Por outro lado, as novas gerações não podem prescindir do conhecimento acumulado socialmente e organizado nas disciplinas, sob pena de estarmos sempre “redescobrindo a roda”. Também não é possível descartar a presença dos alunos com seus interesses, suas concepções, sua cultura, principal motivo da existência da escola.

Na verdade, o que muitos professores têm visto como dois processos constitui um único processo, global e complexo, com várias dimensões que se inter-relacionam:

Concepção integradora

concint

A Pedagogia de Projetos se coloca como uma das expressões dessa concepção globalizada que permite aos alunos analisar os problemas, as situações e os acontecimentos dentro de um contexto e em sua globalidade, utilizando, para isso, os conhecimentos presentes nas disciplinas e sua experiência sócio-cultural.

Pensar uma prática pedagógica a partir dos projetos traz mudanças significativas para o processo de ensino/aprendizagem, como podemos observar:

MÓDULOS DE APRENDIZAGEM

O que se coloca, portanto, não é a organização de projetos em detrimento dos conteúdos das disciplinas, e, sim, a construção de uma prática pedagógica centrada na formação global dos alunos. O desenvolvimento de projetos, com o objetivo de resolver questões relevantes para o grupo, vai gerar necessidade de aprendizagem; e, nesse processo, os alunos irão se defrontar com os conteúdos das diversas disciplinas, entendidos como “instrumentos culturais” valiosos para a compreensão da realidade e intervenção em sua dinâmica. Com os projetos de trabalho, os alunos não entram em contato com os conteúdos disciplinares a partir de conceitos abstratos e de modo teórico, como, muitas vezes, tem acontecido nas práticas escolares. Nessa mudança de perspectiva, os conteúdos deixam de ser um fim em si mesmos e passam a ser meios para ampliar a formação dos alunos e sua interação com a realidade, de forma crítica e dinâmica. Há, também, o rompimento com a concepção de “neutralidade” dos conteúdos disciplinares, que passam a ganhar significados diversos, a partir das experiências sociais dos alunos, envolvidos nos projetos.

Essa mudança de perspectiva traz conseqüências na forma de selecionar e seqüenciar os conteúdos das disciplinas. Esta costumava ser construída em etapas, de modo cumulativo, em que um conteúdo deve ser “vencido” para outro ser “apresentado” ao aluno. Os projetos de trabalho trazem nova concepção de seqüenciação, fundada na dinâmica, no processo de “ir e vir”, em que os conteúdos vão sendo tratados de forma mais abrangente e flexível, dependendo do conhecimento prévio e da experiência cultural dos alunos. Assim, um mesmo projeto pode ser desencadeado em turmas de ciclos diferentes, recebendo tratamento diferenciado, a partir do perfil dos grupos.

Não é com o simples fato de projetos gerarem necessidade de aprendizagem que se está garantindo tal aprendizagem. É preciso que os alunos se apropriem desses novos conteúdos, e para isso a intervenção do professor é fundamental, no sentido de criar ações para que essa apropriação se faça de forma significativa. Isso poderá ser feito a partir da organização de módulos de aprendizagem, em que o professor irá criar atividades visando a um tratamento mais detalhado e reflexivo do conteúdo.

Nem todos os conteúdos disciplinares, surgidos nos projetos, são objetos de um estudo mais sistematizado, em módulos de aprendizagem. Mas o que se transformará em módulos de aprendizagem não pode ser definido antecipadamente, sem se considerar o processo vivido pelo grupo, sua experiência e seus conhecimentos prévios.

Os projetos de trabalho, assim, geram necessidades de aprendizagem de novos conteúdos que poderão ser aprofundados/sistematizados em módulos de aprendizagem que, por sua vez, irão repercutir sobre as atuações e intervenções dos alunos em outras situações da vida escolar.

Podemos, assim, representar a aprendizagem na escola a partir dos projetos de trabalho.

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