Edição 25

Espaço pedagógico

O Pedagogo na Escola – Luzia Bontempo

Há anos, as instituições de ensino contam, em seu quadro de pessoal, com o pedagogo como profissional, especialista de educação. No entanto, essa presença não tem conseguido interferir significativamente na qualidade dos serviços que a escola vem prestando à sociedade. Apesar da grande expansão dos cursos de pedagogia em todo o País, assistimos ao verdadeiro declínio do ensino brasileiro, ano após ano.
A ação do pedagogo junto aos professores tem se revelado insuficiente, inadequada, pouco expressiva, pois, ao sair da faculdade, ele parece estar apto a pensar criticamente a educação sem, no entanto, saber fazê-la.
Afinal, o que é ser pedagogo? O que se espera de sua atuação? O que ele faz, realmente, quando planeja, quando implementa a qualidade do ensino, quando acompanha e avalia a prática, quando estuda com o professor ou quando busca a integração da escola com a comunidade? O que quer alcançar? Quais são as funções que ele exerce na escola e que não deveria exercer? Essas e outras tantas questões são formuladas cotidianamente por quem acompanha a vida escolar dos filhos.
Desde sua origem, o pedagogo é aquele que ensina, que sabe empregar a pedagogia. Espera-se que saiba como ensinar e como mobilizar as diferentes áreas do conhecimento, para fazer educação com qualidade. Deve ser capaz de responsabilizar-se, com o professor, pelo pleno desenvolvimento das potencialidades do educando, conforme determina a legislação vigente. Seu objeto de ação é o desempenho docente, do ponto de vista das competências básicas do professor, na operacionalização do projeto político-pedagógico da escola.
Cabe ao pedagogo exercer a liderança do sistema educacional, seja na gestão do ensino, na supervisão ou na coordenação pedagógica. Para isso, ele precisa sair da faculdade capaz de efetivar o trabalho coletivo na escola, sabendo promover a integração das competências de todos, contribuindo para o crescimento e a profissionalização dos educadores, despertando, em cada profissional, o desejo de atuar de forma diferente, conferindo-lhe ânimo para romper com a rotina cansativa que apaga a alegria de aprender da maioria dos alunos, construindo uma equipe de trabalho eficiente e uma escola de vanguarda.
Bem assessorado pela liderança de um bom pedagogo, o professor inova com criatividade e segurança, sem se sentir sozinho na construção da própria competência pessoal e profissional. Pode contar sempre com a parceria de alguém capaz e disponível.
O pedagogo atuante favorece a formação de grupos de estudo, fortalece a interação humana na escola, melhora o clima organizacional de maneira significativa, estimulando o respeito mútuo e a boa convivência.
Para bem atuar no enfrentamento de suas funções no cotidiano da escola, é necessário saber com muita clareza o que é essencial, o que é importante e o que é acidental. Mas não basta só saber. É preciso querer e priorizar fazer só o que é necessário a cada momento. O pedagogo realmente competente só tem tempo para o que é essencial em seu campo de atuação. Ele deve procurar executar a essencialidade com muito esmero, dando atenção aos detalhes, garantindo o sucesso em tudo na primeira investida, evitando o desperdício de esforços e de tempo, agindo como estimulador cultural, criando condições necessárias à conquista de melhores resultados operacionais, vencendo, uma a uma, as amarras do tradicional em seu trabalho, sem medo de errar, evitando ser um tarefeiro, pau para toda obra ou fiscal do desempenho do professor.
É aconselhável definir com o grupo de professores a essencialidade da própria ação, identificando onde sua presença se faz necessária. Por exemplo, onde a atuação docente apresenta resultado insatisfatório ou fraco: junto aos professores novatos, com dificuldades para conduzir o trabalho de classe. É essencial trabalhar com dignidade e ânimo para vencer as eventuais resistências, com competência e humildade; atuar com boa vontade, promovendo mudanças de forma fácil e cooperativamente, como co-partícipe do sucesso profissional de todos. Onde há uma vontade, há um caminho. Mas, onde existe boa vontade, existem vários caminhos.
Dessa forma, o pedagogo deixa de ser um apagador de incêndios e passa a trabalhar no sentido de conseguir alcançar, pelo menos, três metas:
O bom desempenho docente em suas competências básicas, incentivando o professor a buscar o próprio crescimento junto aos colegas. Ninguém cresce sozinho. Todos temos algo a contribuir para o crescimento alheio, um pouquinho que seja.
A valorização do professor como profissional, reconhecendo-lhe todo e qualquer bom desempenho evidenciado; e como pessoa, ouvindo-o com respeito e empatia, criando espaço para que participe efetivamente do processo educativo.
A implementação do currículo proposto no projeto político-pedagógico da escola, acompanhando o processo de ensinar, avaliando a ação pedagógica e procurando viabilizar a boa e saudável interação humana no interior da escola: professor–professor, professor–aluno, professor–pedagogo; e também fora dela: professor–escola, escola–comunidade.
O pedagogo deve, ainda, esforçar-se para adquirir uma boa cultura geral, a fim de ser capaz de transformar princípios em ação. O seu desempenho eficiente sustenta a unidade e a coerência organizacional da escola. Porém, exige-lhe o desenvolvimento e o domínio de competências técnicas e humanas (relacionadas ao desempenho dos professores) e competências administrativas (relacionadas ao processo de educação de crianças e jovens na escola).

Mudanças e desafios
Não é fácil caracterizar o pedagogo existente em nossos estabelecimentos educativos como agente de mudança. A complexidade crescente dos sistemas de ensino tem alargado as dimensões da atuação de todos os educadores e daqueles que exercem algum tipo de liderança junto aos professores.
As mudanças sem precedentes que vêm ocorrendo nos últimos anos em toda a sociedade não tiveram suficiente eco nas instituições educacionais e no desempenho dos professores. Tudo o que se tem tentado nos cursos de capacitação profissional, nos últimos anos, explicita o grande esforço para fazer com que o professor assuma uma nova postura na sala de aula, aprenda a processar o saber universal disponível e tenha acesso à renovação desse saber.
Hoje, o bom profissional não é o que sabe, é o que está sabendo, isto é, o que está continuamente aprendendo, renovando e reformulando seu conhecimento.
As transformações, hoje, são tão rápidas que a grande tarefa da educação é assumir o desafio de acelerar o ato de aprender e atender à necessidade da renovação do aprendido logo em seguida, a fim de evitar a fossilização precoce das idéias e da práxis.
Para bem exercer a profissão, sintonizado com o momento histórico, cada educador precisa estar disposto a realizar permanentes investimentos em sua qualificação: comprar livros, assinar revistas especializadas; disponibilizar tempo para estudo; construir uma disciplina pessoal que favoreça sua atualização continuada e permanente.
No entanto, a atualização permanente está longe de ser a panacéia que vai resolver todos os problemas do ensino em nossas escolas. Somente a capacitação em serviço não é condição suficiente para produzir as mudanças necessárias que a legislação vigente e a sociedade requerem.
As agências responsáveis pela formação do pedagogo deveriam oferecer cursos ou seminários periódicos aos ex-alunos, ouvindo-os em suas dificuldades e ajudando-os a nortearem seu desempenho com mais eficiência. Às vezes, enfrentam obstáculos descomunais, para os quais não se sentem preparados e não têm a quem recorrer. Poucos voltam à faculdade em busca de novos caminhos, muitos desistem ou acomodam-se a um ativismo estressante, sem obter sucesso algum, desqualificando a própria função.
A efetivação de qualquer mudança começa com a competência em administrá-la em si próprio e em seu cotidiano. Educar-se é a primeira parte da tarefa. Naturalmente, vai exigir esforço pessoal e grande dose de boa vontade para conhecer o próprio potencial e aprender a utilizar as inteligências dominantes livremente. Quando conhecemos nossas potencialidades, podemos fazer escolhas mais conscientes e equilibradas.
Realizar experiências de mudança na escola é acreditar no poder de criação de cada professor, é manter-se aberto às novas idéias, é prover ambiente estimulador ao crescimento de todos. É muito mais difícil do que identificar erros, detectar problemas educacionais ou apontar culpados.
Os principais ingredientes da mudança são ousadia e simplicidade. Ousar é fazer diferente e melhor o que já se sabe fazer bem, com simplicidade. Não implica tirar coisas, e, sim, transformar a prática, a escola, as pessoas.

Cooperação: a base do sucesso
Hoje em dia, a atuação do pedagogo na escola é de grande importância e precisa acontecer enfatizando, simultaneamente, dois pólos distintos:
Construir a equipe de trabalho – com enfoque na inteligência emocional, no querer fazer, na liderança para servir.
Qualificar a equipe – com enfoque maior no cognitivo, no saber fazer, no estudo e na atualização permanente da equipe de professores.
Cada pedagogo, em seu contexto, deve buscar seus próprios caminhos para efetivar sua proposta de trabalho, a fim de promover o aprimoramento da ação docente e as mudanças significativas na escola. Segundo Paulo Freire, “as experiências não se transplantam, realizam-se”. Não há que ficar esperando alguém fazer algo, para então colocar a mão na massa. O importante é compreender que o erro faz parte de todo processo de crescimento e que só não erra quem não faz, quem vive se repetindo numa rotina interminável.
É fundamental aprender a acompanhar a prática do professor, ajudando-o em suas dificuldades, assessorando-o na efetivação da qualidade do ensino para todos, reconhecendo e valorizando todo o seu esforço, preocupando-se, sobretudo, com a integração da escola na comunidade.
Ao iniciar suas atividades numa escola, a primeira preocupação do pedagogo deve ser com a construção da equipe de trabalho: uma equipe competente, forte o bastante para implementar experiências de mudança no fazer da escola; uma equipe coesa, capaz de trabalhar por objetivos comuns, ou seja, conseguir que todos os educadores estejam comprometidos com os mesmos propósitos, empenhados em realizar a proposta educativa explicitada no projeto político-pedagógico, compartilhando riscos e desafios, confiando nos colegas de equipe, no exercício do respeito mútuo.
Para a construção da equipe de trabalho, o pedagogo deve estabelecer uma linha de ação, utilizando dinâmicas de grupo como ferramenta, no intuito de focar a pessoa do educador e procurar facultar-lhe vivências individuais, em duplas, até chegar ao coletivo, numa busca de singularizar, de marcar as diferenças no que cada profissional tem de mais positivo, tornando cada um sujeito da própria ação.
Participação é a palavra-chave nesse processo. O ser humano é um ser gregário, social. A opinião do outro é importante e lhe confere respaldo para se sentir bem e inovar com mais segurança, apoiado na aprovação do colega. Trabalhar, muitas vezes, significa assumir riscos e colocar à prova os próprios limites, as próprias capacidades, buscando cumprir os objetivos elaborados e assumidos por todos, demonstrando coragem e determinação. Daí a importância da equipe. As habilidades se complementam, e o grau de cooperação vai aumentando à medida que a equipe se consolida.
As dinâmicas de grupo devem acontecer no início de cada encontro. Devem ter curta duração e caráter objetivo. O envolvimento do pedagogo como coordenador da atividade naquele momento deve segurar o grupo, fazendo-o passar pelo catártico, lembrando fatos, percebendo questões de limite do individual ao grupal, criando um espaço aberto, sem tensões ou coerções, possibilitando o alcance de níveis de desenvolvimento mais satisfatórios e completos, melhorando as relações pessoais e contribuindo para reforçar a integração dos professores a cada encontro. Ao final de cada trabalho, é bom ficar sempre o gosto de “quero mais”.
Uma ação em equipe é importante porque conta com a sinergia do grupo, quando o resultado da soma das opiniões individuais é maior do que cada idéia isoladamente, por melhor que esta seja. A essência da sinergia está em valorizar as diferenças existentes na equipe. As opiniões divergentes são respeitadas, e a comunicação é clara e objetiva. Todos prestam atenção à sua forma de trabalhar, procuram resolver os problemas que afetam o funcionamento da escola com mais comprometimento, substituindo o imperativo “tem de fazer” pelo “precisamos fazer”.
No entanto, grupo e equipe diferenciam-se significativamente. Grupos existem em quase todas as escolas e, muitas vezes, até ostentam a denominação de equipe, indevidamente. A organização de trabalho estanque e multidisciplinar, que ainda impera na maioria das instituições, favorece a existência de grupos que operam com muito individualismo, às vezes, até com certa competitividade predatória.

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A construção da equipe significa plantar a igualdade entre os professores — pessoas comprometidas e capazes de perseguir objetivos comuns, assumidos por todos, com a intenção de criar para aquela escola o currículo ideal e específico, que produza o ensino de qualidade para todos.

O dia-a-dia no trabalho torna as relações muito profissionais, de forma que nem nos permitimos uma aproximação com as pessoas. Algumas vezes, somos acometidos por cegueira, presos ao narcisismo ou ao egoísmo, impossibilitados de exercitar o “dar” e o “receber”, indispensáveis à consumação de tarefas coletivas.
No processo de construção da equipe forte, coesa, capaz de perseguir objetivos comuns, acreditar nas pessoas é fundamental. É, talvez, a atitude que mais fortalece o pedagogo junto aos professores: acreditar nas possibilidades do grupo para o enfrentamento dos problemas que vão surgindo, cultivar a crença de que somos capazes, aceitando a decisão coletiva na priorização das ações, mesmo que seja uma variação da própria idéia. Sem confiança mútua, não haverá parceria, cumplicidade nem trabalho de equipe.
O pedagogo, no papel de coordenador do grupo, deve incentivar e favorecer a formação de subgrupos entre os professores, para estudo, pesquisa e aperfeiçoamento profissional. Aos poucos, toda a equipe aprende a se entusiasmar, realimentando-se com o próprio sucesso, e começa, por homologia dos processos, a também entusiasmar alunos e suas famílias em relação aos objetivos da instituição.

A cada escola, um recomeço
O pedagogo será bem-sucedido à medida que for aceito, respeitado e compreendido pela escola que o recebe e o apóia. O significado inicial do seu trabalho está no valor que lhe é atribuído pelo próprio sistema e pela comunidade. A partir dessas boas-vindas, é seguir em frente com coragem e determinação. Há que se fazer por merecer e confirmar as expectativas em relação ao trabalho que realiza.
As inúmeras exigências impostas à escola atualmente e a carência de professores qualificados vêm ampliando o campo de ação do pedagogo e exigindo-lhe um esforço cada vez maior no sentido de aprender a colocar o amor e o respeito mútuo em seu convívio diário e de promover a mudança e a inovação de que a escola necessita, com garra e determinação. Os conhecimentos e as habilidades requeridas para esse trabalho prescrevem-lhe permanente aprendizagem.
O pedagogo precisa aceitar sua parcela de responsabilidade e compromisso com a equipe de professores desde o início. Sua ação junto a estes deve ser semelhante a uma potente locomotiva, puxando todos para o movimento, para a ação continuada e na direção certa.

Luzia Bomtempo é pós-graduada em Supervisão Escolar, em Metodologia do Ensino Superior e em Alfabetização e professora de cursos de capacitação docente (Belo Horizonte – MG).

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