Edição 96

Professor Construir

O velho e o novo no processo de aprendizagem

Madalena Freire

Uma descoberta que gera muita angústia, muito medo, raiva, frustração e ansiedade é perceber-se incompetente diante do novo, do não saber. Contudo, isso é uma descoberta essencial no processo de aprendizagem e construção do conhecimento, é o motor que aciona em nós a busca do conhecer, aprender.

É preciso vivê-lo com paciência. Não quero dizer com isso que se abafe a ansiedade, a raiva, o medo, mas que se entenda que a ansiedade e o medo fazem parte ­— têm seu lado sadio — desse processo. Pois toda ação de aprender, conhecer, tem como ingrediente básico o mal-estar, a ansiedade. No entanto, é necessário educá-los.

Vivê-los compulsivamente, afobadamente, não produz conhecimento, nem para os outros, nem para nós. Simplesmente nos sufoca.

A causa dessa ansiedade é o choque entre o velho e o novo dentro de nós, que existe sempre e que nos impulsiona a crescer. Sem o velho não se constrói o novo. Jogar fora o velho, para ficar só com o novo, não é assumir o novo, é tentar resolver falsamente essa ansiedade. É fugir do processo de construção da mudança para a apropriação do novo. Assumir o novo é assumir um outro significado, construindo, estruturando, uma opção na qual, um dia, poderá ser constatado por que o velho não mais instrumentaliza. Assim, romper com o velho e optar pela busca da construção do novo.

Fazem parte desse processo questões como:

O que do velho não quero mais?

O que não mais me instrumentaliza?

O que ainda quero?

O que ainda me instrumentaliza?

Percebo que estou “desfazendo” de hipóteses anteriores e construindo de uma nova hipótese?

O resto está em nós, na nossa capacidade de enfrentar nosso medo, de ousar, construindo nossa coragem de transformar, de criar o novo.

Para educar a paciência, nas muitas situações que a prática nos coloca, é necessário lidar com limites. Limites do outro, os nossos e os da realidade.

Lidar com limites envolve trabalhar frustrações, perdas e raiva. Significa aprender a lidar com o desprazer, o sofrimento que o confronto com a realidade, com o outro e conosco mesmo provoca.

Educamos a paciência na impaciência. A impaciência ou a apatia são tipos de resposta ao desprazer provocado pelo choque com os nossos próprios limites e os da realidade. Revelam aspectos da nossa capacidade ainda pouco exercitados no lidar com esses limites.

Ter paciência significa buscar permanentemente, reconhecer, perceber, admitir esses limites para, sintonizado com eles, produzir respostas, encaminhamentos adequados às situações da nossa prática.

O indício de que estamos construindo encaminhamentos, respostas adequadas, é quando diante da realidade; não permanecemos paralisados, imobilizados ou “apagando fogo”, como “bombeiro” acelerado. Quando não caímos na armadilha da impotência ou da onipotência.

Nas situações de impotência, somos engolidos pelos limites, ficamos imobilizados na nossa ação. Na onipotência, temos uma visão exacerbada, toda poderosa, de nossas capacidades, provocando um agir cego, acelerado, compulsivo, que engole o outro e que resulta, às avessas, na imobilidade, na paralisia da capacidade de se ver nos reais limites.

O desafio de todo educador é educar sua paciência.

O que posso? Quais os meus limites?

Qual a minha realidade?

O que não posso nessa realidade?

O que posso já? O que vou poder daqui a algum tempo?

O que nunca poderei?

Como planejar essa ação presente e a futura?

O que limitar para armazenar energias?

Como medir a energia necessária para cada “empreitada” pedagógica?

O desafio de todo educador é educar sua paciência para:

Poder assumir com clareza que o ato pedagógico, enquanto processo histórico-social, implica conviver com a impotência-onipotência, aspectos integrantes desse mesmo sujeito.

Poder assumir com lucidez a possibilidade de não ver o produto do próprio trabalho. Mas é educando a impaciência, pacientemente, que o olho começa a aprender a ver o futuro nas marcas, nos indícios de mudança do embrião do sonho no presente!

 

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