Edição 15

Livro da vez

Paixão hereditária por Lobato

Estamos falando da paixão da mãe (Laura Sandroni) e a continuidade da filha (Luciana Sandroni) pelas obras de Monteiro Lobato. Ambas não só se apaixonaram pela literatura desse autor, como buscaram em seu estilo literário semelhanças e aproximações. Pesquisadora, Luciana Sandroni, uma apaixonada pelas obras de Lobato, nos presenteia com sua obra Minhas Memórias de Lobato, fruto de suas pesquisas sobre o processo de criação de autores e ilustradores da literatura infantil e juvenil. Nesta matéria, trazemos, em forma de entrevista, a herança de Lobato na versão de Luciana Sandroni.

Construir Notícias – A paixão por Lobato, herança de família?
Luciana Sandroni – É. Minha mãe, Laura Sandroni, é uma grande leitora de Lobato e passou esse gosto para mim. Ela leu para os meus tios, que são bem mais novos que ela, e depois começou a ler para a gente, meus irmãos e eu. Acho que ela já sabia de cor as histórias. Nas férias, no sítio do meu avô, depois de muita praia, à noite, ela lia um capítulo de alguma aventura do Sítio para a gente. Era muito bom. Depois fui reler Lobato com uns 20 anos, já na Faculdade de Letras, na PUC do Rio. Fiz um curso com a Eliana Yunes e com o Luiz Raul Machado e foi uma nova descoberta. Queria escrever igual a ele.

CN – O que, em particular, mais aproxima o autor Lobato da autora Luciana?
LS – Acho que é o humor. O Lobato é muito engraçado e isso me chamou muito a atenção. As tiradas da Emília, da Tia Nastácia, da Narizinho são muito boas. É claro que a imaginação e as críticas que ele faz à sociedade são também um ponto forte no texto, mas o fato dele não cair na lição e muito menos no tom piegas e tomar sempre o caminho do humor é o que eu mais admiro nele.

CN – Em sua dissertação de mestrado, você investigou as memórias de infância no processo de criação de autores e ilustradores da literatura infantil e juvenil. Essa investigação a levou a escrever as suas Memórias de Lobato?
LS – Na verdade, a idéia do Minhas Memórias de Lobato nasceu Sítio era um resgate da infância do Lobato e achei importante essa parte da vida dele. Depois a juventude com o grupo do Cenáculo em São Paulo, que é muito divertida também. Jovens no começo do século querendo mudar o mundo. O Lobato editor também é um fato da vida dele que priorizei e depois a idéia de escrever o Sítio e de ter se tornado um dos editores mais populares do seu tempo. E, no final, a campanha do petróleo.

CN – A irreverência de Emília ajudou ou atrapalhou?
LS – Ajudou. A Emília faz a parte mais engraçada do livro, que é criar fatos que nunca aconteceram na vida de Lobato e atrapalhar o Visconde. E essa idéia surgiu da leitura de Memórias da Emília, em que a boneca começa a inventar coisas que nunca aconteceram na vida dela, como ter ido para Hollywood e ter conhecido a Shirley Temple.

CN – E a irreverência de Lobato?
LS – A irreverência dele também ajudou.

CN – Como foi mostrar Lobato para as crianças através dos personagens criados por ele?
LS – Eu fiquei muito tempo pensando como fazer uma biografia do Lobato para crianças e eu não queria fazer uma biografia só com fatos e datas, queria trabalhar com ficção; e aí, relendo o Memórias da Emília, eu tive a idéia de fazer a Emília e o Visconde escrevendo as memórias do próprio autor. O próprio Lobato comentava muito que a Emília era quem dava as idéias para ele escrever. Ele acreditava nessa independência dos personagens, e eu também embarquei nessa idéia. No final da minha pesquisa, descobri que ele realmente pensava em fazer as suas memórias e quem escreveria seria o Visconde.

CN – A vida de Lobato, a História do Brasil… Que outras histórias essa turma ainda vai contar através de você?
LS – Acho que nenhuma mais. O Sítio no Descobrimento (Ed. Globo) foi outra experiência legal de fazer, mas acho que agora vou trabalhar com os meus personagens.

CN – Como foi adaptar o Sítio do Picapau Amarelo para a televisão?
LS – Foi muito bom. Trabalhei com mais três roteiristas: Mariana Mesquita, Cláudio Lobato e Toni Brandão. Foi uma trabalheira sem fim, mas foi uma experiência muito legal. A gente adaptou quase toda a obra de Lobato. A cada semana, era uma aventura diferente. Tive que aprender na prática a fazer roteiro para TV. Outra experiência boa foi o trabalho em grupo. Mas ver o que você escreve aparecendo na telinha é muito bacana.

Luciana Sandroni: autora de Minhas Memórias de Lobato (Companhia das Letrinhas, 1997; ilustrador Laerte, Prêmio Ofélia Fontes, da FNLIJ, de 1997, e Prêmio Jabuti de 1998); Ludi na Revolta da Vacina (Salamandra, 1999, iluatrador Humberto Guimarães, Prêmio Carioquinha e Prêmio Ofélia Fontes, da FNLIJ, 1999), O Mário que não é de Andrade (Companhia das Letrinhas, 2001, ilustrador Spacca, Prêmio O melhor Para o Jovem, da FNLIJ, de 2001) entre outros.

Ilustrações de Laerte para o livro
Minhas Memórias de Lobato, de Luciana Sandroni.

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