Edição 60

Em discussão

Consumo e novas tecnologias. Para quem?

Jung Mo Sung

Numa sociedade capitalista, estar excluído do mercado é estar excluído das condições dignas de vida. Porque as coisas necessárias para uma vida digna, você consegue via mercado. A grande pergunta é: por que o sistema econômico no qual vivemos hoje exclui tanta gente das relações econômicas e sociais que passam pelo mercado? 

No contexto da sociedade atual, sem dúvida, a economia é o tema central, é a grande questão. Não somente porque nós vivemos numa sociedade capitalista, em que tudo está centrado na questão da economia e do aumento de capital, mas também porque, na vida real, as coisas passam pelo campo econômico; as coisas que nós precisamos para viver, nós compramos. E, para comprar, é preciso estar inserido no mercado.

O que é o mercado?

De uma forma bem simples, o mercado é um espaço de compra e venda. Para você entrar no mercado, você precisa ter alguma coisa para trocar. Ou você tem dinheiro e compra; ou você tem um trabalho para vender, para receber salário; ou você tem uma mercadoria para vender, para pegar o dinheiro e comprar as coisas de que precisa. Então, de uma forma simples, o mercado é um espaço de troca. Nesse sentido, o mercado é bom. É uma coisa necessária, uma invenção humana de muito tempo atrás que possibilitou melhora nas condições de vida das pessoas.

O problema é que, no sistema capitalista, as regras do mercado passaram a ser as únicas regras. Antigamente, se alguém não tinha acesso ao mercado, se não tinha como comer, a sociedade, a comunidade ou a vizinhança ajudava. Você tinha as relações solidárias, relações comunitárias suprindo problemas de mercado. Numa sociedade capitalista, o mercado passa a ser o principal regulador da vida social. Então as pessoas, ou porque não têm emprego ou porque não têm renda suficiente, não conseguem entrar no mercado para comprar as coisas necessárias para viver, e viver de uma forma digna.

O ser humano e o consumo

O ser humano é um ser de desejos e necessidades. Portanto, ele não vive só pela necessidade, também deseja coisas. E, fundamentalmente, deseja ser reconhecido pelas outras pessoas. O grande desafio é tentar entender quais são os mecanismos de reconhecimento na sociedade.

Nas sociedades antigas, por exemplo, ser honrado era um valor importante para ser reconhecido como uma boa pessoa. Na sociedade da cultura de consumo de hoje, você é reconhecido pelo seu padrão de consumo. Eu desejo ser reconhecido, então, para isso, eu preciso comprar as coisas que não são necessárias para a sobrevivência imediata, mas são necessárias para ser reconhecido. Aí, aparecem tênis caros, celulares e carros sofisticados, que as pessoas passam a desejar. Com isso, o que o capitalismo faz é fomentar esse desejo de consumo, reforçando a ideia de classificação de pessoas por padrão de consumo. Assim, os pobres, além de não terem acesso a uma vida boa, também têm outro problema: são frustrados no desejo de reconhecimento.

Novos caminhos

O primeiro desafio dos cidadãos é possibilitar espaços de relacionamento nos quais o consumo não seja critério de reconhecimento. Uma das grandes contribuições que as comunidades cristãs dão ao mundo de hoje é permitir que pessoas simples, sem grande acesso ao consumo, possam ser reconhecidas como pessoas, como seres humanos, e que mesmo as pessoas que têm acesso ao consumo tenham a experiência de um reconhecimento humano verdadeiro, não através do padrão de consumo.

O segundo aspecto é lutar para criar espaços de sobrevivência econômica melhores para pessoas excluídas. Criar possibilidades como a economia popular e solidária, as práticas de educação profissionalizante, seja em formas tradicionais, seja em formas alternativas das práticas comunitárias.

O terceiro é fazer uma crítica à sociedade e a esse caráter perverso de uma economia baseada somente na acumulação do capital, que, além de excluir as pessoas da condição de uma vida digna, gera uma antropologia equivocada, a de achar que o ser humano é aquilo que consome.

Jung Mo Sung é professor da pós-graduação de 
Ciências da Religião da Universidade Metodista de 
São Paulo. Endereço eletrônico: 
jung_sung@metodista.br.

Mundo Jovem – Um Jornal de Ideias. Ano 48, nº 404. Março de 2010.

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