Edição 43

Matérias Especiais

Deu um branco na hora

Ildenice Silva Rodrigues

Ainda é forte a compreensão de avaliação resumida a um instrumento que explora a memorização do aluno. Esse comportamento é herança de uma prática pedagógica tradicional que se preocupa com o acúmulo de informações, mesmo que não tenham significado para o aprendente (Moretto, 2005). Um exemplo são os famosos questionários seguidos da afirmação: “Das 20 questões, escolha 10 para a prova”.

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A construção deste texto é subsidiada pelas ponderações oriundas da disciplina Avaliação da Aprendizagem e da leitura do livro Prova: um Momento Privilegiado de Estudo – Não um Acerto de Contas, de autoria de Vasco Moretto (2005). Como diz Freire, “[…] é estudar o estudo de quem, estudando, o escreveu” (2006, p. 10).

O título escolhido tem sido verbalizado por alunos dos mais diversos níveis acadêmicos para justificar o estresse ocorrido na hora da prova.

Não negamos que a memorização tenha seu papel no processo de aprendizagem; ela deve, porém, ser precedida pela atribuição de significado, que é resultante da identificação e utilização do conteúdo e/ou objeto de estudo (Meirieu, 1998). Aprendizagem “[…] é uma mudança relativamente permanente no comportamento que resulta da experiência”

(Antunes, 2002, p. 15). A memorização é parte desse processo, pois “Mais vale uma cabeça bem feita que bem cheia” (Morin, 2001, p. 21). A aprendizagem possibilita a apropriação dos conhecimentos, não apenas o empilhamento de informações; assim, será possível “[…] estabelecer relações significativas com outros conhecimentos já elaborados pelo sujeito, ampliando e transformando sua estrutura conceitual, permitindo que este estabeleça novas relaçõesà medida que tiver novas experiências” (Moretto, 2005, p. 42), resultando na reorganização e interação dos conhecimentos adquiridos a priori.

Com essa concepção do processo de apropriação do conhecimento pelo aluno, o educador deve sentir-se motivado a não se limitar à transmissão de informações como se o aprendente fosse um depositário e o momento da prova, a hora da prestação de contas. Deve, sim, mediar situações problematizadoras, objetivando o desenvolvimento de competências em vez de apenas estimular a memorização.

A formação e/ou o desenvolvimento de competências são justificados pelas rápidas mudanças sociais e tecnológicas e fazem parte da conjuntura educacional atual.“É a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos, tais como saberes, informações, habilidades,inteligências, para solucionar, com pertinência e eficácia, uma série de situações” (Perrenoud, apud Antunes, 2002, p. 91). Mobilizar, segundo o dicionário, é motivar, mover em prol de uma causa (Aurélio, 2001, p. 466). Vai além de locomover-se, de mudar de lugar. É mudança de atitude, de comportamento. “Significa movimentar-se com força interior” (Moretto, 2005, p. 19). É ressignificar, apreender os conteúdos, compreender sua relevância e utilização. É aprender a aprender. É o saber fazer resultante da práxis.É utilizar “[…] os saberes da Matemática, da Geografia, da História e de outras disciplinas […] no supermercado a que se vai, nas conversas que se tem e na rua que se atravessa” (Antunes, 2002, p. 92).

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O desenvolvimento de competências é constituinte do ideário pedagógico docente, refletindo em sua prática o real sucesso, a partir do estabelecimento de objetivos claros ao preparar suas aulas, tomando os conteúdos significativos (Moretto, 2005), visando sua aplicabilidade nas diversas situações do cotidiano, evitando a seguinte justificativa do aluno: “Deu um branco na hora”.

Ildenice Silva Rodrigues é coordenadora pedagógica do Centro Social Casa da Amizade e aluna do 8º período do curso de Pedagogia da Faculdade Frassinetti do Recife (Fafire).

Referências Bibliográficas

ANTUNES, Celso. Novas Maneiras de Ensinar, Novas Formas de Aprender. Porto Alegre: Artmed, 2002.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI Escolar: o Minidicionário da Língua Portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
FREIRE, Paulo. Ação Cultural para a Liberdade. 11. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
MEIRIEU, Phillipe. Aprender… Sim, mas Como? 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.
MORETTO, Vasco Pedro. Prova: um Momento Privilegiado de Estudo – Não um Acerto de Contas. 6. ed. Rio de Janeiro: DP & A, 2005.
MORIN, Edgar. A Cabeça Bem Feita: Repensar a Reforma, Reformar o Pensamento. 5. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

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