Edição 98
Profissionalismo
Professor, valorize mais o presente que o futuro do seu aluno
Sergio Marcelo Salvino Bezerra
Há algum tempo, venho pensando sobre o que falar para meus alunos quando os observo desatentos, inquietos e desmotivados a estudar. Às vezes, a indisciplina toma conta do ambiente escolar e vemos professores e gestores sem saber o que fazer.
Bom, isso é um fato comum e bastante discutido em escolas, seminários e congressos de Educação, bem como em rodas de conversas entre docentes.
Esta é uma questão de grande relevância. Em quase sua totalidade, docentes e gestores tentam alertar estudantes sobre o futuro. Pensar numa profissão, na família que vai constituir, no curso universitário e em tantas outras coisas vindouras, não é, definitivamente, do interesse da maioria dos nossos estudantes.
Estamos vivendo um presente deficiente. Enquanto nos desgastamos em pensamentos e palavras importantes para o futuro, o estudante precisa viver o presente. Exatamente isso. O presente precisa de sentido, a escola precisa de uma direção. Os conteúdos e propostas pedagógicas necessitam, mais do que nunca, contemplar o presente. Mas… E o futuro? Este virá sem pedir permissão a quem quer que seja. O futuro é inevitável, ele ocorrerá independentemente de nossa vontade. Foquemos no presente. Talvez essa seja a grande (ou única) oportunidade de pais e professores influenciarem os jovens.
É comum escutarmos a frase: “As crianças são o futuro do nosso país”. Que erro. Como serão no futuro se delas não cuidarmos no presente?
Professor (e pais), seus alunos (e filhos) necessitam viver o hoje. É preciso dar sentido à vida atual, ao que acontece agora. Não falo de uma postura imediatista, aquela que é tomada hoje e amanhã se esvai. É necessário um conjunto de elementos com valores variados, que penetre no ambiente escolar e seja significativo para todos: gestores, professores, funcionários da escola, pais e, sobretudo, estudantes.
É no presente que podemos ser felizes. A nossa estabilidade está no presente. Se nos ocuparmos com o futuro, sofremos por antecipação e não solucionamos nada. O futuro nos ajuda apenas a traçar algumas metas.
Uma das grandes frases sobre o futuro, atribuída ao dramaturgo grego Ésquilo (525-456 a.C.), parece estar inconscientemente na mente de nossos estudantes: “Conhecerás o futuro quando ele chegar, antes disso, esquece-o”.
Estamos vivendo um presente deficiente.Enquanto nos desgastamos em pensamentos e palavras importantes para o futuro, o estudante precisa viver o presente.
É nesse universo que todos os envolvidos no contexto escolar se encontram. No entanto, parece não existir uma consciência (ou não se quer tê-la), sobre essa concepção de futuro proposta por Ésquilo.
Os pontos até aqui abordados não nos parece novidade, entretanto, são eles que continuam prejudicando o andamento de nossas escolas, sendo necessário um direcionamento sério que apresente resultados consistentes.
A partir de agora focaremos em estratégias, que poderão ser adotadas em situações cotidianas, que vêm deixando professores e gestores sem vocabulário para confrontá-las diante de comportamentos inadequados de grande parcela de estudantes da educação básica. Antes, porém, precisamos buscar uma ou mais respostas para a seguinte questão: por que encontramos, na escola de hoje, tantas crianças e adolescentes com comportamento inadequado?
O que pretendemos aqui é conduzir o estimado professor a um exercício de consciência, investigando em sua caixa de ferramentas quais são os instrumentos que tem utilizado para motivar o seu aluno. O comportamento inadequado, às vezes, tem sua raiz na falta de sentido do que é proposto pela escola ao aluno. O estudante precisa ter um sentimento de pertencimento ao universo escolar. Ele precisa se sentir parte desse contexto, porém não é o que acontece.
Outro ponto, que não tratamos como de responsabilidade do professor, mas que requer uma atenção especial, é o conhecimento que cada docente tem da história de vida de seus estudantes. É certo que a jornada laboral do professor não lhe permite tal condição, no entanto, devemos concordar que a falta de conhecimento de fatos relevantes da vida de nossos alunos nos deixa mais distantes deles, fazendo do nosso trabalho uma tentativa infrutífera em busca de resultados concretos e eficazes, que cada vez mais vem se tornando de difícil alcance.
Costa (1991) nos alerta sobre a capacidade de fazer-se presente. Para ele, essa não é uma característica intransferível de certos indivíduos, algo profundo e incomunicável. Ao contrário, é uma aptidão que pode ser aprendida, desde que haja disposição interior, abertura, sensibilidade e compromisso para quem se propõe a tanto. Tarefa de alto nível de exigência, mas de grande importância no processo educacional.
É necessário estar próximo do estudante, estar com alegria, sem oprimi-lo nem inibi-lo (MENEZES, 2001). Não podemos (e nem devemos) de maneira simplória quantificar nossos estudantes, atribuindo-lhes notas e/ou conceitos, decidindo se os mesmos devem ou não ser aprovados.
O comportamento inadequado, às vezes, tem sua raiz na falta de sentido do que é proposto pela escola ao aluno. O estudante precisa ter um sentimento de pertencimento ao universo escolar. Ele precisa se sentir parte desse contexto, porém não é o que acontece.
Cury (2013), afirma que um professor fascinante procura conhecer o funcionamento da mente dos alunos para educá-los melhor. Cada aluno não pode ser visto como mais um número em sala de aula, mas como um ser humano complexo, subjetivo e com necessidades peculiares.
Parece-me que a esta altura do texto, o amigo leitor pode estar pensando que essas atribuições colocadas acima são de um psicólogo ou psicopedagogo, ou ainda de um psicanalista ou psiquiatra. É verdade. De fato esses profissionais tratam da mente humana, cada um com suas especificidades, porém, o que propomos aqui não é tratamento da mente do aluno, mas a compreensão do funcionamento dela. Isso é possível ao professor.
Um dos autores mais conhecidos da humanidade, estudado e discutido até os dias de hoje, é Sigmund Freud. Em seu livro O Ego e o Id (1923), ele propõe a divisão da mente humana em três partes: o ego, que se identifica à nossa consciência; o superego, que seria a nossa consciência moral, os princípios sociais e as proibições às quais somos submetidos nos primeiros anos de vida e que de maneira inconsciente, acompanha-nos por toda vida e; o id, relacionado aos impulsos múltiplos da libido, diretamente ligado ao prazer.
Aparentemente complexo, mas com bastante aplicabilidade, este pode ser um caminho para começar a entender um pouco do funcionamento da mente humana. É necessário interesse e tempo para compreender melhor esta divisão freudiana, mas vale à pena experimentar. Os resultados são certos e produtivos.
Entender um pouco da história de vida de nossos alunos e o funcionamento de suas mentes está muito ligado ao nosso interesse como professor, além de ser uma postura coerente como profissional. Precisamos admitir que anualmente passam dezenas ou até centenas de alunos por nós e de muitos não sabemos sequer o nome. É de fato uma zona de conforto.
Não adianta perder tempo verbalizando ao vento que “tudo é culpa do professor” e não levar a sério o que aqui discutimos. Escuto de muitos colegas que a obrigação do professor é “dominar sua matéria e ensinar os conteúdos e o resto não é de competência docente”. Que visão limitada… Como podemos fazer educação com profissionais que pensam assim?
Precisamos lutar por uma escola melhor, sem violência, com mais áreas verdes, com quadra poliesportiva, com ambientes climatizados e agradáveis, com profissionais bem pagos e dedicados exclusivamente à educação. Vamos ultrapassar os muros da escola.
Este pequeno texto não objetiva solucionar todas as inquietações dos profissionais da educação básica, muito menos penalizar o trabalho docente, Pretende-se aqui alertar para a situação alarmante de nossas escolas, se é que podemos assim chamá-las, diante das condições críticas que se encontram a maioria delas.
Precisamos lutar por uma escola melhor, sem violência, com mais áreas verdes, com quadra poliesportiva, com ambientes climatizados e agradáveis, com profissionais bem pagos e dedicados exclusivamente à educação. Vamos ultrapassar os muros da escola. Mostrar aos pais o que é ser pai, mostrar aos estudantes o que é ser estudante. A escola precisa funcionar.
A nossa acomodação e passividade diante de uma escola que não funciona mais, torna a educação cada vez mais distante da sala de recuperação e estagnada na UTI educacional.
É hora de transformação do modelo das nossas escolas. Precisamos de mudança de postura, de compreensão efetiva do relevante papel social que temos como mestres.
Não vamos mudar o mundo, mas podemos construir uma escola melhor com educadores e estudantes focados no presente. Chega de pensar na escola do futuro, escola do amanhã. As escolas precisam trabalhar o presente e essa iniciativa deve partir de nós professores.
Professor, repense sua prática. Não que esta esteja equivocada, mas que se tenha a consciência da necessidade de revisá-la e atualizá-la. Faça a diferença para seu aluno.
Seguem agora algumas estratégias que podem nos auxiliar no dia a dia em sala de aula:
Busque informaçoes relevantes da história de vida dos seus alunos;
Considere seu aluno um ser humano, complexo e subjetivo;
Quando possível, converse com os pais de seus estudantes;
Elogie seu aluno em público e o repreenda em particular;
Valorize a presença de seu estudante em sala;
Identifique a ausência de seu estudante e se interesse pelo motivo de sua falta;
Enfim, valorize mais o presente que o futuro de seu aluno. Hoje, você está com ele.
Pense nisso.
Sergio Marcelo Salvino Bezerra é Gestor Escolar na rede estadual de ensino de Pernambuco. Professor na rede municipal do Recife; Graduado em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco; Especialista em Gestão Ambiental (Faculdade Frassinetti do Recife – Fafire) e Psicopedagogia (Universidade Católica de Pernambuco – Unicap/Cepai).
E-mail: sergiobezerra.prof@gmail.com
Referências
BRENNER, Charles. Noções Básicas de Psicanálise. Introdução à Psicologia Psicanalítica. 4ª Edição. Rio de Janeiro: Imago, 1987.
COSTA, Antonio Carlos Gomes. Por uma pedagogia da presença. Brasília: Governo Federal, 1991.
CURY, Augusto. Pais brilhantes, professores fascinantes. Rio de Janeiro: sextante, 2013.
FREUD, S. (1923). O Ego e o Id. In: FREUD, S. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. 19. Rio de Janeiro: Imago, 1990.
MENEZES, Ebenezer Takuno de. Verbete pedagogia da presença. Dicionário Interativo da Educação Brasileira – Educabrasil. São Paulo: Midiamix, 2001. Disponível em:
Para além do futuro. Salão de Paris. Diario de Pernambuco Impresso. Recife, 01 out. 2016. Disponível em
Psicanálise: A mente segundo a teoria de Sigmund Freud. Disponível em