Edição 126
A fala do mestre
A força que há em cada professor e professora
Leo Fraiman
Tenho visto os professores deste País cada vez mais machucados, com uma sensação de invisibilidade, de pouca importância. Pense: antigamente, quando uma mãe ia à escola para uma reunião, ela se arrumava toda, ia com uma atitude de deferência, de respeito. O professor era uma autoridade. Hoje em dia não é incomum que esse professor viva situações de carteirada, tenha que adequar o seu livro didático, sua estratégia pedagógica, suas notas, por causa de pais e mães que, também acuados por um desejo desenfreado de fazer seus filhos e filhas felizes, apequenam os educadores.
Uma sociedade que desonra seus professores aniquila seu próprio futuro. E, infelizmente, temos visto uma onda cada vez maior de superficialidade, de atalho, de desvalorização de tudo aquilo que há no mundo educacional.
Os livros se tornam mais sucintos, as redes sociais nos levam à superficialidade, e, assim, pouco a pouco, sem percebermos, essa ideia do mundo leve, da vida “gostosinha”, do pouco esforço, vai nos tornando mais empobrecidos cultural, social e espiritualmente.
Pense no uniforme do professor, na sala dos professores, no valor do salário, nas condições de vida. De modo geral, vem uma alegria no coração? Provavelmente, se você tem alguma noção da realidade, sentirá o oposto disso. Mas, calma, o intuito deste artigo não é gerar depressão, e sim que façamos as pazes com a realidade e, a partir dela, busquemos um otimismo realista.
É perigoso negarmos a realidade, porém também não precisamos nos paralisar diante dela. O que todos e cada um de nós podemos fazer em relação a essa triste situação que nos desola e nos desampara?
É importante pensarmos nisso, afinal de contas não mais do que 2% ou 3% de nossos jovens desejam ingressar nessa profissão e já temos hoje um apagão de talentos na área. Quem serão os próximos professores e professoras de nossas instituições de ensino? Iremos nos contentar com algoritmos e avatares? Com conteúdos feitos por meio de “dancinhas” ou chatbots?
Se queremos algo que só o humano tem (a criatividade, a intuição, a sensibilidade e a humanidade), é bom, então, humanizarmos a forma como vemos os professores, seu papel e as nossas instituições.
Isso significa, para você que é gestor, começar a refletir se aquilo que você paga para os seus profissionais é visto como um custo ou como um investimento, pois, se o local onde eles relaxam, estudam e trabalham — sim, a sala dos professores — não é o lugar mais bonito da escola, isso está revelando algo sobre o valor que é dado àqueles que fazem a diferença na sala de aula.
Reflita: o uniforme que eles vestem os empodera ou os empoeira? Deixa-os empoderados ou destituídos de beleza, de vigor, de vitalidade, de cor? Afinal, quando olhamos para alguém que está bem vestido, tendemos a notar essa pessoa com valor.
Reflita também quanto tem dedicado de energia, de recursos, de espaço para capacitar os professores diante de uma sociedade, de famílias e de um mundo cada vez mais complexos, cada vez mais desafiadores de lidar.
Qual foi a última vez que você ponderou contratar um psicólogo para oferecer apoio emocional para seus professores, para a equipe de apoio? Qual foi a última roda de conversa, de acolhimento, que você fez em sua instituição de ensino? A última roda de leitura? Quando você comprou um livro, distribuiu para cada um e propôs que, ao final de um mês, conversassem sobre alguma temática delicada?
Pense também se fez, nos últimos meses, algum momento para que, entre pares, trocassem experiências, aprendizados, dores, inspirações e afetos. Seus professores são um problema com custo ou são o principal recurso de sua instituição escolar?
Não reflita só no que você pensa, mas pense, sim, em como você age em relação aos professores, os principais motores de transformação de sua escola.
Convido você a refletir como pai, como mãe, como familiar. Qual foi a última vez que você escreveu elogiando, agradecendo, parabenizando, validando o esforço que os professores fazem a cada dia pelos seus filhos? Atacar, criticar, reclamar, resmungar é fácil, difícil é ser gente, e gente trata a gente com gentileza.
No mundo de hoje, é bastante fácil que um pai e uma mãe se coloquem na postura de cliente e, como tal, acreditem que têm sempre razão. Mas não é bem assim, em lugar nenhum do mundo. Se você, como cliente, tenta entrar em uma aeronave com uma prancha de surfe, você não conseguirá, e não adianta esbravejar com o atendente, com a comissária de bordo. Simplesmente não pode.
Se você for a uma hamburgueria e esmurrar a mesa porque quer frango a passarinho, não adianta gritar “Eu sou cliente, eu mando!”.
É preciso lidar melhor com as nossas frustrações e saber que ninguém dá conta de tudo […]”
Você já parou para pensar se é realmente cabido aquilo que seus filhos pedem de seus professores? Você já parou para pensar se não tem terceirizado excessivamente o seu papel educativo, transferindo da sala de casa para a sala de aula aquilo que cabe ao familiar, e não ao professor?
O professor, por mais incrível que seja, por mais extraordinário que busque ser, não é um mágico, não é um Deus, não é onipotente, é um ser humano.
É preciso lidar melhor com as nossas frustrações e saber que ninguém dá conta de tudo, nem a família e nem a escola, e ambas precisam uma da outra.
Só quando assumimos humildemente a capacidade de nos frustrarmos e a partir da aceitação do fato de que ninguém sabe tudo, ninguém pode tudo e ninguém consegue tudo é que somos capazes de praticar o otimismo realista, que é baseado na constante indagação: “O que de melhor eu posso fazer com isso?”.
Para concluir, convido-o a refletir: o que de melhor você pode fazer em relação aos professores, aos seus filhos, à sua instituição escolar? O que de melhor você pode fazer para que esse cenário que vemos hoje, de desqualificação de tudo o que diz respeito à educação, seja apenas uma fase de uma nação que ainda está acordando, de um país que tem apenas 522 anos?
Quando olhamos, humilhados, os índices de performance da educação brasileira, precisamos nos colocar em perspectiva histórica, afinal de contas, quando o Brasil foi descoberto, em 1500, a Europa estava em reforma.
Não podemos nos comparar diretamente com a Finlândia ou com a Coreia do Sul senão para nos inspirarmos. Porque, sim, o bom educador se inspira e não “pira”. Ele percebe as dificuldades, as adversidades e as circunstâncias e procura sempre alguma perspectiva proativa, autorresponsável, consciente. Isso é a base da espiritualidade, da humanidade. A capacidade de fazermos escolhas nobres, sábias e que contemplem não só aquilo que nós queremos, mas, em especial, o que realmente vai trazer luz, paz e amor ao mundo. Esse deve ser o nosso eixo guia.
Então, antes de falar, pensar ou fazer alguma coisa em relação aos professores, aos seus filhos ou à escola em que você trabalha, reflita sempre: isso que vou fazer, falar ou mostrar vai trazer luz, paz e amor? Em caso positivo, siga em frente. Em caso negativo, humanize-se, ainda há tempo.
Leo Fraiman é psicoterapeuta, palestrante internacional, escritor e autor de mais de vinte livros, dentre os quais se destaca Metodologia OPEE (Projeto de Vida e Atitude Empreendedora), presente em mais de 1.500 escolas no Brasil. Foi conferencista na ONU no Simpósio Internacional – Formando Lideranças para o Desenvolvimento Futuro, em Genebra/Suíça. Com mais de 30 anos de carreira, foi membro do Comitê Mundial de Educação para a Autonomia, em Paris; ganhador do Prêmio Shift – Agentes Transformadores, com o case da Metodologia OPEE; e, atualmente, é autor aprovado pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) com a obra Pensar, sentir e agir. Instagram: @leofraimanoficial