Edição 121

Como mãe, como educadora, como cidadã

Diário de gratidão

Zeneide Silva

Hoje, o dia amanheceu especialmente iluminado, e, quando abri os olhos, como de costume fiz minha oração de gratidão a Deus por mais um dia. O sol brilhava forte, entrando pelas brechas da janela. Senti a alegria de estar viva e a certeza de um dia maravilhoso e abençoado. Respirei fundo, sentei-me na beirada da cama e, depois, abri as janelas, repetindo meu “Muito obrigada”. Estar viva e saudável neste tempo de tantas perdas, quando a finitude da vida se mostra de forma tão contundente e escancarada nos noticiários diariamente, é por si só um bom motivo para agradecer.

E, apesar de já ter a consciência do quão importante é cultivar a gratidão, hoje quis viver isso de uma maneira mais profunda e ampla. Decidi prestar atenção em cada atividade da minha rotina, sentir e expressar meu agradecimento por cada coisa e pessoa que colaborou para que eu pudesse usufruir de tudo o que tenho e conseguir fazer tudo o que preciso e desejo, das tarefas mais simples aos projetos mais complexos.

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Enquanto fazia minha primeira refeição do dia, refiz, na minha imaginação, o itinerário daquele alimento até chegar à mesa da minha casa e agradeci a todos os profissionais que contribuíram com seu trabalho. Quando terminei o café da manhã, minha lista de agradecimentos já era enorme, e percebi que o exercício de gratidão estava diretamente ligado à visão de mundo do indivíduo e ao sentido de comunidade também. Imediatamente me lembrei de uma frase que li na Internet que dizia: “Você atrai aquilo que agradece!”. Fui pensando nessa aparente inversão de ordem durante todo o meu percurso até o trabalho, agradecendo pelas pessoas que estavam contribuindo para que o trânsito fluísse na tranquilidade com sua tecnologia e seus cuidados, e por aquelas que, com pressa e irritação, atrapalhavam o trânsito. Percebi que a melhor maneira de evitar aborrecimento era deixá-los seguirem seu caminho. A mensagem sugere que, para conquistar o que queremos ou precisamos, devemos, primeiro, agradecer, mesmo nas dificuldades.

A gratidão nos coloca em um lugar de cooperação, e, assim, somos capazes de parar de servir ao paradigma da competição e da comparação que nos foi imposto socialmente há tanto tempo.

Como sempre faço, cumprimentei com um “Bom-dia!” e um “Muito obrigada” cada funcionário que encontrei no caminho, da portaria até a sala da Construir Notícias, e todos me responderam com um sorriso dizendo “Bom-dia, professora Zeneide”. Senti que ficaram muito bem, parece que aquela palavra tinha acendido uma luz dentro deles. Continuei refletindo sobre os efeitos daquela inversão de ordem proposta na mensagem da Internet, e, de repente, girou outra chave na minha mente. Quando a gente agradece previamente, o nosso foco se desloca para o que possuímos, e não para o que nos falta. Isso pode parecer um detalhe insignificante, mas muda tudo, porque nos afasta do hábito da reclamação e da tendência que temos a reagir diante dos obstáculos, sempre procurando fora de nós a culpa pelas adversidades. Então, fiz a pausa para o almoço, seguindo no exercício da gratidão por todos os que contribuíram para aquele almoço maravilhoso: os que estavam presentes na cozinha e, principalmente, aqueles anônimos que contribuíram com o almoço de todos. Parei por alguns instantes para olhar e expressar meu agradecimento a cada pessoa ou coisa que estava me trazendo bem-estar. De volta à sala, percebi atentamente meu ambiente e todos os detalhes dela; e abri mais um sorriso de gratidão; dessa vez, por reconhecer o privilégio de trabalhar com o que gosto e acredito e ter excelentes condições para atuar e me desenvolver profissionalmente aqui.

Mas por que será que é tão poderoso agradecer? Fiquei refletindo um pouco sobre isso, entre reuniões, textos e relatórios que produzia no trabalho. Eu já me preparava para encerrar o expediente e fazer meu caminho de volta para casa, quando, em um momento de contemplação do céu, com a brilhante e majestosa Lua cheia, compreendi que a gratidão era, na verdade, um conjunto de sentimentos. Quando agradecemos, conectamo-nos ao outro com empatia, compaixão, gentileza e solidariedade; ativamos nossa humildade sincera, reconhecendo seu valor; orgulhamo-nos dos seus feitos, fortalecendo a importância dele; e envolvemos de carinho e afeto nossas relações.

A gratidão nos coloca em um lugar de cooperação, e, assim, somos capazes de parar de servir ao paradigma da competição e da comparação que nos foi imposto socialmente há tanto tempo. Se cultivamos a gratidão no dia a dia, reconhecemos que sozinhos podemos até ir mais rápido, mas juntos vamos muito mais longe; e é nas relações, no convívio coletivo que a humanidade pode caminhar para a evolução. Afinal, se a velocidade não garante a qualidade do resultado, aonde é que a pressa vai nos levar? Para que viver correndo? Agradecer também é um jeito de apertar no freio e dizer não ao processo de “maquinização” das pessoas.

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À medida que ia experimentando o fluxo contínuo de agradecimento, me sentia recuperando um ritmo de vida mais natural, mais humano, entende? Talvez essa conversa possa soar, por alguns instantes, irreal ou alienada para você. Então, deixe que eu esclareça que minha intenção não é negar a dureza da realidade ou os abismos que constituem nossa sociedade, mas mostrar que, se adotamos a gratidão como modo de vida, podemos transformar nossas condições e aproveitar melhor cada momento. Diante de alguns desafios, isso pode parecer uma tarefa árdua ou uma missão impossível, mas aprendi que é nas atitudes simples do cotidiano que a gente vai conseguindo “praticar gratidão”; e aí, quando vemos, já incorporamos o modo “agradecido” ao nosso jeito de ser e começamos a usufruir do bem que isso faz.

Segui pensando nos tantos benefícios que a gratidão me trouxe neste dia, durante todo o caminho de volta para minha casa. Plantei agradecimento e colhi de imediato: alegria, generosidade, força, dedicação, amor e muito mais gratidão. Cheguei em casa, ainda no exercício de agradecer por cada momento, e, quando me deitei para dormir, vi como cresceu minha consciência de que a gratidão é mais do que um sentimento, é uma decisão, uma atitude. E, por ser assim, quanto mais praticamos, mais ela se expande, e seus efeitos se multiplicam infinitamente.

Reafirmei meu compromisso em ser sempre grata e, por isso, antes que esse dia acabe, deixo aqui o meu sincero agradecimento:

• Aos que me inspiram e àqueles que me desafiam, pois ambos me fazem aprender e evoluir.

• Aos que me cuidam e àqueles a quem posso dedicar meus cuidados, pois essas trocas alimentam minha alma e me tornam mais forte.

• Aos que colaboram para que esta revista continue sendo instrumento de nutrição e transformação social, mesmo quando os obstáculos parecem intransponíveis.

A você, leitor, que segue, independentemente das dificuldades que possam lhe afetar, me oferecendo seu tempo e sua escuta atenta. Por mais este ano de partilha e diálogo, muito obrigada, de coração. Sugiro que você escolha e viva a experiência de fazer, por um dia, o seu diário de gratidão e, depois, sintao desejo de que seja uma prática em sua vida, levando seus alunos a também praticarem a gratidão.

• Gratidão pela última edição do ano de 2021; pelos colaboradores; por Solange Duarte, responsável por todos os encaminhamentos, os quais realiza com muito entusiasmo e competência.

• A Pedro Tavares, diretor da Construir Notícias, grande amigo e amante da educação, por enriquecer minha vida de tantas maneiras.

Por fim, agradeço a Deus, meu Senhor e dono de minha vida, por me ajudar e por colocar tanta beleza no meu caminhar.

Grande abraço e um ano novo cheio de gratidão!

 

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