Edição 114
Professor Construir
Ensino híbrido: possibilidade de personalizar a construção intelectiva.
Rosangela Nieto de Albuquerque
As mudanças vivenciadas hoje nos remetem a um desafio acerca do processo de ensino-aprendizagem. Mudança de paradigma, novos caminhos, novas possibilidades. É inegável a necessidade de mudança. O ensino híbrido, isto é, a educação híbrida, atualmente tem sido um tópico muito discutido nos ambientes educacionais, principalmente como ferramenta no processo de ensino-aprendizagem. Certamente, as relações educacionais, institucionais, organizacionais buscam adaptações ao novo paradigma.
Na educação, o ensino híbrido é uma abordagem pedagógica que combina atividades presenciais e atividades realizadas por meio das tecnologias digitais de informação e comunicação (TDICs).
O ensino híbrido constitui um campo de conhecimento em ascendência, entretanto ainda em fase de aplicabilidade, pois envolve processos de conectividade, mobilidade e acessibilidade. Nesse contexto, também não se restringe somente a equipar as salas de aula com programas de computador, softwares e utilização das metodologias ativas.
O objetivo do ensino híbrido é efetivar a centralidade do processo de ensino-aprendizagem para o aluno, e não mais para o professor, como vem ocorrendo em escolas que utilizam o modelo tradicional de ensino. “O ensino híbrido utiliza a tecnologia abrindo novos horizontes na educação, transformando e buscando melhorar o processo de ensino-aprendizagem” (CAMILLO, 2017, p. 65).
O ensino híbrido pode ser implementado em diferentes condições e em qualquer escola independentemente dos recursos financeiros, humanos ou materiais. No entanto, o ensino híbrido requer uma boa formação docente, pois o professor, enquanto articulador do processo, precisa ser capaz de promover as adequações necessárias na dinâmica da sala de aula, no planejamento das atividades propostas e na adequação curricular.
Para Moran (2015), o ensino sempre foi híbrido uma vez que possibilita e permite a combinação de diferentes espaços, tempos, recursos e pessoas com as mais diversas finalidades.
O ensino híbrido não se reduz apenas ao uso das TDICs como ferramentas pedagógicas, mas também como uma alternativa de personalização do ensino. São pilares do ensino híbrido: “personalizar, individualizar e diferenciar” (PIRES, 2015, p. 82).
O ensino híbrido se apresenta como uma oportunidade de mudança de paradigma, da dinâmica e do funcionamento da sala de aula. Simboliza a oportunidade de um ensino que permeia o mundo físico e o mundo virtual. “Não são dois mundos ou espaços, mas um espaço estendido, uma sala de aula ampliada que se mescla, hibridiza, constantemente” (MORAN, 2015, p. 39). Certamente, são possibilidades de aprendizagem; trata-se de uma ressignificação do processo de ensino-aprendizagem que contempla as teorias educacionais que já estão instauradas na educação, como o socioconstrutivismo de Piaget, o sociointeracionismo de Vygotsky, a aprendizagem significativa de David Ausubel e os centros de interesse de Ovide Declory.
Para Silva (2017, p. 151), no modelo de ensino híbrido, “de uma posição de passividade nas salas de aula, o aluno passa a ocupar posição de sujeito na sua construção intelectiva”.
Dentre os modelos híbridos, segundo Bacich, Neto e Trevisani (2015: p. 53), podem ser destacados: o modelo de rotação, o modelo flex, o modelo à la carte e o modelo virtual enriquecido. Certamente, esses modelos não obedecem a uma ordem de relevância quando à sua aplicação em sala de aula. Segundo os autores, os modelos híbridos são
[…] como concepções possíveis para o uso integrado das tecnologias digitais na cultura escolar contemporânea, enfatizando que não é necessário abandonar o que se conhece até o momento para promover a inserção de novas tecnologias em sala de aula; pode-se aproveitar o melhor dos dois mundos.
No modelo de rotação, o estudante elabora as atividades de acordo com um tempo predeterminado pelo professor, embasado nas propostas de rotação individual (os estudantes dispõem de uma lista de propostas de aprendizagem que devem cumprir ao longo de sua rotina de estudo), de rotação por estações (os estudantes, organizados em grupos, vão revezando de grupo em grupo até terem passado por todos), laboratório rotacional (os estudantes executam as atividades revezando entre a sala de aula e os laboratórios, cumprindo os objetivos propostos pelo professor), sala de aula invertida (os conteúdos são previamente estudados em casa e, posteriormente, discutidos e aplicados em atividades realizadas na sala de aula).
No modelo flex, os estudantes cumprem uma lista de propostas de aprendizagem, porém se pautam com intensidade no ensino on-line.
No modelo à la carte,
O estudante é responsável pela organização de seus estudos, de acordo com os objetivos a serem atingidos, organizados em parceria com o educador; a aprendizagem, que pode ocorrer no momento e local mais adequados, é personalizada (BACICH; NETO; TREVISANI, 2015: p. 58).
E o modelo denominado virtual enriquecido permeia uma ruptura parcial com o ensino presencial, pois os estudantes ficam livres para organizar os tempos de aprendizagem entre o on-line e o presencial. É uma proposta que traz outras perspectivas para o ensino, portanto “[…] como possibilidade de adequação e modernização e, consequentemente, um ensino mais socialmente engajado e capaz de dar algumas das respostas exigidas pelo atual contexto social” (SILVA, 2017: p. 157).
Nesse contexto, observa-se então a possibilidade de se romper com o modelo de ensino que deixa a desejar no quesito aprendizagem e que há muito tempo vem sendo aplicado nas escolas. Podemos dizer que o processo educativo clama por uma mudança, e personalizar a aprendizagem é a personalização do ensino:
Um projeto de personalização que realmente atenda aos estudantes requer que eles, juntos com o professor, possam delinear seu processo de aprendizagem, selecionando recursos que mais se aproximam de sua melhor maneira de aprender” (BACICH; NETO; TREVISANI, 2015: p. 51).
O objetivo principal da personalização do ensino se pauta na concepção de que “Aprendizagem não precisa acontecer necessariamente de forma linear, mas em paralelo, de acordo com as necessidades e aspirações de quem aprende” (BACICH; NETO; TREVISANI, 2015: p. 61).
É importante enfatizar que não é um modelo novo, certamente, já foi amplamente discutido nas diversas áreas, principalmente sobre o desenvolvimento e a aprendizagem humanos, mas ainda é considerado um desafio para muitos professores. “Personalizar o ensino significa que as atividades a serem desenvolvidas devem considerar o que o aluno está aprendendo, suas necessidades, dificuldades e evolução — ou seja, significa centrar o ensino no aprendiz” (BACICH; NETO; TREVISANI, 2015: p. 69). É necessário entender que o principal espaço de personalização do ensino é a sala de aula.
Personalizar o ensino no modelo híbrido é:
• Oportunizar que o estudante organize seu tempo, respeitando o processo de aprendizagem de cada um.
• Proporcionar ao professor o gerenciar o aproveitamento do tempo — certamente, o tempo de aula é dimensionado e sobra mais tempo para os trabalhos em sala.
• Auxiliar no desenvolvimento da autonomia dos estudantes, potencializando a construção de seu próprio conhecimento.
• Permitir o desenvolvimento de atividades criativas, favorecendo o desenvolvimento de seu próprio conhecimento e de práticas colaborativas entre os estudantes.
Desse modo, personalizar o ensino e o uso das TDICs envolve a dinamização desse espaço e a maximização da capacidade de aprendizagem do estudante, a fim de tornar mais motivador.
A personalização do ensino implica no desenvolvimento da autonomia do estudante, ele desenvolve as relações interpessoais na busca pelo conhecimento, que se dá de forma grupal e individualizada; assim, ele assume um papel de protagonista na busca dos conhecimentos.
Desse modo, o professor desempenha um papel de mediador da aprendizagem e oportuniza, através das TDICs, interatividade e aprendizagem efetivas. O modelo de ensino híbrido faz com que haja uma mudança significativa no papel desempenhado pelo professor. No que tange ao estudante, ele passa a gerenciar o seu aprendizado.
Na busca por uma personalização do ensino, cabe ao professor “mediar a aprendizagem autônoma do aluno e os objetivos traçados para o nível de cada série ou ciclo de ensino” (SILVA, 2017: p. 157).
Considerações finais
O atual contexto passou a exigir das instituições educativas um ensino voltado para novas maneiras de aprender; certamente, as tecnologias podem proporcionar uma aprendizagem significativa.
O principal espaço para personalizar o ensino é a sala de aula. Personalizar o ensino significa que as atividades a serem desenvolvidas devem considerar o que o aluno está aprendendo, suas dificuldades, suas necessidades e evolução — ou seja, significa centrar o ensino no estudante.
O modelo de ensino híbrido faz com que haja uma mudança significativa no papel desempenhado pelo professor; certamente, os conceitos são imprescindíveis para a compreensão das práticas sociais.
No ensino híbrido, os conteúdos ministrados em cada componente curricular são abordados diferentemente das aulas presenciais, oportunizando que o aluno possa acessar e estudar em qualquer momento, em seu tempo, lugar ou em diferentes ambientes. No ensino presencial, na sala de aula, os componentes curriculares estão organizados no espaço e tempo de acordo com o conhecimento, isto se dá por meio de projetos, estudos de caso, discussões em grupo, entre outros.
A preocupação dos educadores sempre esteve voltada para atividades que possibilitem uma participação ativa do aluno. As várias metodologias, sala de aula invertida, estudo de caso, resolução de problemas, entre outras, promovem possibilidades de um processo de ensino-aprendizagem voltado para a construção intelectiva autônoma. Além disso, ao conduzir o intercâmbio entre os aprendizes no momento da discussão entre pares, também contribui para o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, além de aprimorar habilidades cognitivas.
Colaboração e personalização são aspectos da educação híbrida que estão em consonância com os aspectos da aprendizagem. Personalizar significa que as atividades a serem desenvolvidas devem considerar o que o aluno está aprendendo, suas necessidades, dificuldades e evolução, ou seja, focar no ensino, no aprendiz.
Rosangela Nieto de Albuquerque é Ph.D. em Educação (Universidad Tres de Febrero), pós-doutoranda em Psicologia, Doutora em Psicologia Social, Mestre em Ciências da Linguagem, psicanalista clínica, professora universitária de cursos de graduação e pós-graduação, psicopedagoga clínica e institucional, pedagoga, licenciada em Letras (Português/Espanhol), autora de projetos em Educação e da implantação de uma clínica-escola de Psicopedagogia Clínica como projeto social e autora e organizadora de treze livros nas áreas da Educação e da Psicologia.
E-mail: rosangela.nieto@gmail.com
BACICH, L.; NETO, A. T.; TREVISANI, F. M. Ensino híbrido: personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015.
CAMILLO, C. M. Blended learning: uma proposta para o ensino
híbrido. Revista: EaD & Tecnologias Digitais na Educação, v. 5,
n. 7, Dourados, MS, 2017.
MORAN, J. Educação híbrida: um conceito-chave para a educação, hoje. In: BACICH, L.; NETO, A. T.; TREVISANI, F. M. Ensino
híbrido: personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre:
Penso, 2015. p. 27-45
PIRES, C. F. F. O estudante e o ensino híbrido. In: BACICH, L.;
NETO, A. T.; TREVISANI, F. M. Ensino híbrido: personalização e
tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015. p. 74 -79.
SILVA, E. R. O ensino híbrido no contexto das escolas públicas
brasileiras: contribuições e desafios. Revista Porto das Letras,
v. 3, n. 1, 2017.