Edição 125

Matéria Âncora

Meu filho tem medo

Extraído do livro Meu filho tem medo: um guia prático para ajudar crianças e jovens
a superar seus medos, de Robert Schachter e Carole Maccauley

Toda criança tem medo de alguma coisa, pelo menos uma vez na vida. Mas isso é normal!

Embora seja uma emoção desagradável que ocorre como resposta a uma fonte conscientemente reconhecida de perigo real ou imaginário, o medo é, ao mesmo tempo, uma emoção saudável, produto do amadurecimento e do processo de aprendizagem de uma criança.

Sentir medo e conseguir superá-lo faz parte do modo como a criança aprende a interagir com o mundo ao seu redor, que, às vezes, parece ser um lugar tenebroso.

Medo de animais

Nunca deixe um bebê ou mesmo uma criança maiorzinha com uma mamadeira ou garrafa de leite perto de um animal qualquer, por mais confiável e manso que ele possa parecer.”

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Definição

Esse medo é perfeitamente normal; resulta de alguma experiência com animais que, ao expor a extrema vulnerabilidade da criança, produz uma reação intensa.

Sintomas

1. Enrijecimento do corpo da criança.
2. Choro.
3. Tremor.
4. Agarramento a um adulto.

O que fazer

1. Saiba que esse medo específico costuma desaparecer. Entretanto, certifique-se de que ele não foi causado pela mordida do animal, o que pode requerer atenção médica ou profissional.

2. Se você gosta de animaizinhos domésticos, mas não possui nenhum, descubra situações em que a criança possa brincar com animais e aprender a tratá-los adequadamente.

3. Nunca deixe um bebê ou mesmo uma criança maiorzinha com uma mamadeira ou garrafa de leite perto de um animal qualquer, por mais confiável e manso que ele possa parecer. Alimente o seu bebê longe das vistas do animal e ensine-o a não dividir com o cachorro ou o gato aquilo que é servido à mesa ou em qualquer outro lugar.

4. Se seu filho continuar a ter medo de animais, examine suas próprias atitudes. O medo de uma criança pode ocorrer em resposta ao medo dos pais, que ela intui e imita.

O medo do escuro e de dormir

Definição

O medo do escuro surge quando a criança acorda à noite ou é obrigada a ficar no escuro na hora de dormir.

Sintomas

1. Várias demonstrações de intenso desconforto, tais como choro, gritos ou protestos: “Não quero dormir!”.

2. Reações de ansiedade, inclusive batimento cardíaco ou respiração acelerados.

3. Abandono da cama e busca dos pais.

O que fazer

1. Depois de apagar a luz principal do quarto de seu filho, mostre a ele objetos familiares: “Está vendo seu ursinho de pelúcia, seu caminhãozinho, seu travesseiro?”.

2. Coloque um abajur em local onde não haja o perigo de que ele acabe aumentando as sombras.

3. Deixe a porta do quarto da criança entreaberta e assegure-lhe que estará por perto.

4. Se seu filho acordar chorando no meio da noite por alguma razão que você não conseguir descobrir, vá até seu quarto e conforte-o: “Sei que a gente fica com medo porque está escuro”. Em seguida, reoriente-o dizendo: “Mas olhe, é só sua bonequinha e suas roupas penduradas na cadeira”.

5. Entretanto, não habitue a criança a essas visitas noturnas, uma vez que a intervenção dos pais durante a madrugada pode acabar se transformando em hábito. Insista explicando que o abajur deve ajudá-la a se sentir crescida o suficiente para dormir sem você.

6. No dia seguinte, recompense a criança por noites passadas tranquilamente e sem problemas. Quando houver dificuldades, deve-se fazer de conta que não aconteceu nada.

Medo de se perder

O medo de se perder em bosques, em lojas ou no meio de muita gente é a forma típica que o medo espacial toma entre os cinco anos e meio de idade. Ele confunde visualmente, na maioria dos casos, a criança cansada e insegura.”

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O medo de se perder em bosques, em lojas ou no meio de muita gente é a forma típica que o medo espacial toma entre os cinco anos e meio de idade. Ele confunde visualmente, na maioria dos casos, a criança cansada e insegura.

Sintomas

1. Expressão abrupta de pânico, entremeada de insegurança ao se imaginar perdida ou sozinha.

2. Ansiedade e choro, principalmente em situações de “grande confusão” (como quando há multidões, desfiles e feiras).

O que fazer

1. Prepare-o antes com estratégias adequadas para lidar com esse tipo de situação ou espere o fato ocorrer. “Vamos fazer compras ali” (aponte as lojas ou as esquinas), “Vamos ficar todos juntos, mas, se por acaso nos separarmos, espere-me na entrada da (nome da loja) ou em (algum ponto de referência dentro da loja).” Frise: “Jamais iríamos embora daqui sem você”.

2. Mostre-lhe também o andar onde vocês estão identificando as especificidades dele, uma vez que todos os andares das lojas de departamento são muito parecidos.

3. Instrua-o a perguntar a um funcionário da loja, e não a um estranho, como encontrar a entrada ou algum ponto de referência especial dentro da loja.

4. Explique-lhe, de forma sensata e sem dramatizar, que sempre existe a possibilidade de se perder.

Medo de perder os pais

O medo de perder um dos pais (em geral a mãe) é tão forte — ainda que irracional — na mente das crianças de quatro e cinco anos de idade que deve ser considerado normal.”

Definição

O medo de perder um dos pais (em geral a mãe) é tão forte — ainda que irracional — na mente das crianças de quatro e cinco anos de idade que deve ser considerado normal.

Sintomas

1. Pânico ao perceber que o pai (ou a mãe) não está mais por perto.

2. Recusa inconformada a dar ouvidos à lógica do problema.

3. Predomínio do medo sobre todas as outras emoções.

4. Interrupção abrupta dos sintomas assim que o pai (ou a mãe) retorna.

O que fazer

1. Avise a criança quando você estiver saindo e especifique a hora em que deve retornar. Seja absolutamente pontual.

2. Se seu filho estiver começando a sofrer ataques de ansiedade, faça imediatamente o seguinte:

• Diga-lhe que vai sair, mas que voltará dentro de cinco minutos. Seja pontual.

• Quando ele suportar esse período de tempo, estenda-o para quinze minutos fora de casa e, em seguida, para meia hora.

• Seja o mais firme possível.

• Pouco a pouco aumente o período de tempo até chegar ao que você precisa.

3. Quando voltar, abrace-o e elogie-o por ter suportado a sua ausência.

4. Se o problema não desaparecer, apesar de sua confiança e firmeza, procure ajuda profissional.

Medo da morte

Definição

A curiosidade sobre a morte, assim como sobre o nascimento, é normal para a criança em desenvolvimento. O que é anormal é a preocupação extremada com o assunto numa criança saudável que, de repente, começa a imaginar que ela ou alguém a quem ama pode morrer logo.

Sintomas

1. A criança se recusa a olhar animais ou outras criaturas mortas.

2. Pode surgir a reação contrária: preocupação ou conversa sobre a morte.

O que fazer

1. Lembre-se de que a conscientização e o medo da morte fazem parte da vida. Instrua a criança sobre a morte, mas diga-lhe que não é preciso se preocupar com isso. Em geral, as preocupações infantis passarão.

2. Se alguém muito próximo à criança morrer, responda às perguntas feitas por ela honestamente e de acordo com suas próprias crenças religiosas ou outras. Lembre-se de que a velhice não constitui, em geral, razão suficiente para se morrer. Para ela, todos com mais de vinte anos, inclusive você, são “velhos”.

3. Preste atenção aos sentimentos dela quando você fala sobre uma pessoa amada.

4. Se você também está envolvido emocionalmente com a morte de um parente, tente se lembrar de que ela pode estar se sentindo sozinha, confusa ou magoada pelas mudanças drásticas na atmosfera ou no esquema familiar e que isso pode aumentar sua preocupação com a morte. Na presença da morte, todos temos medo, mas a criança precisa entender que não foi ela quem a causou e que não deve se preocupar com o que pode lhe acontecer no dia seguinte.

5. Se você conseguir falar sobre a dor com a criança e as perguntas que ela lhe fizer parecerem motivadas por curiosidade, e não por terror, convém levá-la ao local durante alguns minutos. Explique a visita em termos simples como “Vamos apenas dizer adeus” ou qualquer outra coisa que lhe pareça natural e guie-se pelas reações dela.

Medo do dentista ou do médico

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Essa reação surge através de uma experiência negativa — ou por se imaginar em uma — nas mãos de um profissional da área médica. Cenário semelhante pode manifestar-se com o pediatra. Embora após os três anos de idade a maioria das crianças não tema o médico, um episódio traumático, como, por exemplo, uma injeção ou uma vacina, pode infundir relutância em voltar à clínica ou ao consultório.

Sintomas

1. A criança se recusa a ir ao dentista ou ao médico.

2. Na própria casa ou no consultório, quando, na iminência de uma consulta, o seu comportamento varia de um protesto fraco a uma extrema ansiedade, demonstrada por falta de ar, tontura ou aceleração do batimento cardíaco.

3. Raiva ou rejeição do pai (ou da mãe) que insiste em levá-la à consulta médica ou dentária.

O que fazer

1. Tente escolher um profissional que trabalhe de forma eficaz com crianças. Seja honesto e paciente para dizer a seu filho se o que ele vai fazer vai doer, como vai ser e quando será. A esse respeito, peça orientação a seu pediatra.

2. Comece a levá-lo ao dentista quando seu filho
ainda tiver dentes de leite para acostumá-lo a check-ups regulares. Dentes de leite saudáveis são importantes porque preparam o espaço — através da formação adequada de músculos e ossos — que os dentes permanentes ocuparão. Eles também são necessários para que os hábitos de mastigação e fala se desenvolvam de forma correta.

3. Ensine o cuidado preventivo de rotina, enfatizando, principalmente, a boa alimentação e a escovação adequada antes de dormir à noite como formas de evitar visitas constantes ao dentista.

4. Como outros medos relacionados ao ferimento físico, o medo do médico ou do dentista talvez diminua por volta dos sete anos, quando a criança conseguir se comunicar com o dentista e — importantíssimo! — se responsabilizar por sua própria saúde dentária.

Se seu filho apresentar
comportamento histérico ou
incontrolável, consulte seu pediatra.”

5. Para impedir que traumas se transformem em fobias, não deprecie as emoções ou a dor infantil nem transmita a ela seus próprios medos em relação ao tratamento dentário. Saiba que uma má experiência com um dentista pode se generalizar e se transformar em medo de outros médicos.

6. Se seu filho apresentar comportamento histérico ou incontrolável, consulte seu pediatra. Peça-lhe que recomende outro dentista se houve algum choque de personalidade entre seu filho e o profissional que o estava atendendo.

7. Informe-se sobre quais dentistas em seu bairro usam métodos novos para evitar a dor e a cárie, tais como o revestimento da superfície dos novos molares com um material anticárie e a obturação sem brocas (limpeza e obturação da área cariada sem o uso de brocas).

Medo de multidões

Definição

O medo de multidões, que começa tipicamente aos treze anos de idade, pode estar relacionado com a agorafobia (medo de ficar preso e de sofrer um ataque de pânico num lugar público) ou pode ainda aparecer como presságio da descoberta de um problema de personalidade esquizoide. Porém, com mais frequência, ele surge em função das preocupações sociais do adolescente normal, que pode então, de maneira confusa, negar ou esconder sua existência.

Sintomas

1. Relutância em sair com amigos.

 

2. Negação de qualquer motivação para evitar sair de casa.

3. Medo de estar no meio de muita gente.

4. Inicia-se por volta da puberdade.

O que fazer

1. Durante os anos da adolescência, o elemento principal é a empatia, muito mais que a solução concreta de alguma situação que daria bons resultados com crianças mais novas.

2. Embora alguns adolescentes apresentem sintomas que vão da histeria à psicose, muitos não se mostram cheios de segredos nem desconfiados dos adultos e gostam de trocar confidências, principalmente com o pai (no caso do menino) ou com a mãe (no caso da menina). Se você tem a sorte de ter um adolescente desses em casa, tente estabelecer um diálogo com ele.

3. Tente não encarar as coisas pelo lado pessoal se o adolescente rejeitar seu interesse, seu conselho ou suas soluções. Embora todo adolescente saiba que ainda precisa do apoio do adulto, seria o último a admiti-lo.

4. Se o adolescente ficar sempre sozinho e infeliz em casa, esteja atento a quaisquer sinais de uma depressão em andamento: se o sono, o apetite ou o desempenho escolar sofrerem abalos, ou se ele não se mostrar mais interessado em atividades de que tanto gostava anteriormente, ou se ainda certo comportamento agressivo aumentar. Esses sintomas costumam identificar uma depressão clínica, e, nesse caso, o jovem precisará de ajuda.

Medo da escola

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A recusa em frequentar a escola é um dos medos infantis mais predominantes. Pode-se observá-lo em várias fases do desenvolvimento infantil, inclusive na adolescência. Na verdade, ele existirá enquanto a escola existir.

O problema de ausência às aulas é grande e pode levar crianças e adolescentes a procurarem muitos tipos de ajuda, podendo mesmo alguns serem levados aos cuidados do juizado e das autoridades locais. O rumo tomado por essas crianças e adolescentes pode, às vezes, ser longo e traumático, e alguns chegam a não frequentar a escola durante meses.

1. A criança se recusa a ir à escola.

2. Demonstra grave agitação na hora de ir para a escola.

3. Reclama de problemas físicos, o que para ela é bastante sério, mas que, na verdade, não são causados por nenhuma espécie de doença.

O que fazer

1. Fale com a criança e tente conseguir dela informações sobre o que possa estar ocorrendo na escola. Saiba que, embora esse problema costume chegar a um clímax por volta dos onze anos, ele pode ocorrer sempre que o aluno estiver saindo de casa, diária ou semanalmente, para iniciar um novo grau ou ingressar numa nova escola.

2. Faça com que a criança saiba que, embora você compreenda seus medos, não há outra opção senão ir à escola.

3. Comunique à escola o que está acontecendo. Os educadores costumam contar com sistemas eficientes para lidar com tais situações.

4. Partindo do pressuposto de que você pode contar com a colaboração da professora, leve a criança à escola, mesmo que seja apenas por uma hora, e fique lá com ela.

5. Elogie e recompense a criança sempre que ela corresponder positivamente às suas expectativas.

Elogie e recompense a criança sempre que ela corresponder positivamente às suas expectativas.”

Ansiedade em relação a provas

Definição

Esse problema mostra uma síndrome caracterizada por sintomas de extrema ansiedade, que variam de uma pulsação rápida a um pânico total, quando a criança ou o adolescente se vê frente a frente com uma prova.

Sintomas

1. Batimento cardíaco e respiração acelerados, vertigens, vontade de urinar.

2. Desconcentração.

3. Sensação de que as informações previamente aprendidas desaparecem.

4. Extrema necessidade de sair da sala onde está sendo realizada a prova.

Retire toda a pressão possível existente sobre seu filho dizendo-lhe que você entende a dificuldade pela qual está passando e que não quer magoá-lo mais ainda.”

O que fazer: pais

1. Se você perceber uma mudança repentina no desempenho escolar de seu filho, principalmente se ele vai bem em todas as atividades escolares exceto em provas, verifique se ele não está passando por uma crise de ansiedade, isso pode vir a prejudicar todo o seu rendimento na escola.

2. Converse com a criança e procure saber se está havendo algum problema com certa disciplina ou um professor em especial. Descubra qual situação ou experiência entristece mais seu filho. Tente desvendar tudo isso sem pressioná-lo demais.

3. Converse com o professor sobre a possibilidade de métodos alternativos, como uma prova oral, para averiguar o que seu filho sabe sobre determinado assunto. Trabalhe com o professor para ajudá-lo a compreender as emoções e o problema do seu filho.

4. Retire toda a pressão possível existente sobre seu filho dizendo-lhe que você entende a dificuldade pela qual está passando e que não quer magoá-lo mais ainda.

O que fazer: professor

1. Se você perceber que o desempenho de um aluno em provas não corresponde ao que ele realmente é capaz de fazer, tente compreender o que está acontecendo. A criança que vai mal na escola por estar passando por uma fase de ansiedade em relação a provas se diferencia daquela que vai mal por não estudar o bastante ou por sua conduta geral em sala de aula.

2. Compreenda que o aluno que, de repente, começa a obter notas baixas nas provas ou a ter um mau desempenho escolar poderá estar sofrendo também de alguma reação secundária a um problema doméstico ou escolar que o está fazendo reagir mal em outras áreas além dos estudos. Para determinar o que está acontecendo, tente conversar com ele.

3. Se, quando questionada após a aula, a criança der desculpas, como “Não entendo o que acontece comigo, estudei bastante, mas me deu um branco”, você poderá considerar isso como sintoma de ansiedade em relação a provas.

4. Consulte o psicólogo ou o diretor da escola e discuta com ele a melhor maneira de ajudar a criança.

Referências

SCHACHTER, Robert; MCCAULEY, Carole. Meu filho tem medo: um guia prático para ajudar crianças e jovens a superar seus medos. Tradução de Lila Spinelli. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1990.

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