Edição 119

Em discussão

Professor em meio à pandemia: incertezas, solidão e superação

Sergio Marcelo Salvino Bezerra

Com mais de um ano de pandemia em nosso país e no mundo, muitas são as dúvidas que ainda assolam a mente dos professores, sobretudo os da Educação Básica. Essas incertezas apontam um cenário angustiante que coloca cada ator da Educação Básica em um pedestal solitário. As vozes dos educadores parecem se perder ao vento neste tempo tão inquietante.homem_mudanca_caixa_AdobeStock_306441635_irynaalex_[Convertido]

Talvez, o amigo leitor ainda esteja perplexo diante desta pandemia tão surpreendente, com um vírus tão mortal. Ou simplesmente você pode achar que estamos vivendo sob uma teoria conspiratória que propõe um vírus fabricado propositadamente em laboratório a fim de que alguma nação possa dominar o mundo.

São tantas situações distintas que ora nos fazem céticos e negacionistas de algumas questões, ora nos deixam bastante preocupados com os números de mortes que afetam tantas famílias em nosso país.

Neste cenário instalado no Brasil, a educação aparece como uma área cheia de incertezas, que fazem do professor um profissional extremamente frágil. Uma fragilidade no sentido de não ter nada de concreto que o deixe sóbrio em meio à pandemia.

Dar aulas online ou presenciais? Frequentar ou não a escola? Que ferramenta tecnológica usar? E a família de seus estudantes, tem ou não suporte tecnológico para as aulas remotas?

Essas e outras questões, em mais de um ano de pandemia, ainda não foram respondidas. Não se sabe ao certo o que se deve considerar como ensino híbrido e quem definiu e/ou criou tal nomenclatura. Tudo é muito novo e requer tempo para debate e assimilação.

O contexto até então narrado é apenas para trazer a lume o cenário em que o professor está inserido. Este não está fora da situação e, por outro lado, não sabe como se portar dentro dela. Seu emocional está fragilizado, sua casa foi virtualmente invadida por seus estudantes, e, simplesmente, suas emoções e sua saúde mental não são mais vistas.

O que fazer diante desta situação? Quais as propostas para cuidar do professor neste tempo tão difícil? É disso que gostaríamos de tratar a partir de agora. Não no intuito de esgotar o tema, mas numa perspectiva de que o debate e a escuta do docente devam preceder qualquer decisão que atinja a educação.

Em fevereiro de 2020, o Brasil foi tomado por uma notícia devastadora: o estado de emergência havia sido decretado pelo presidente da República. Daí em diante, surgiram milhares de casos de infecção pelo vírus Sars-CoV-2.

Ainda de procedência incerta, o coronavírus pode ter sua origem em animais como morcego, gato ou camelo (Ministério da Saúde). No entanto, foi nos seres humanos que encontrou sua maior forma de manifestação.

Passado pouco mais de um ano, ainda estamos perplexos e sem algumas respostas. Isso atinge diretamente os serviços laborais, trazendo inquietações, angústias e um sentimento de solidão.

Detalharemos, a partir de agora, três aspectos, a fim de apresentar uma conceituação e os relacionar com o trabalho docente, são eles: incertezas, solidão e superação.

Iniciemos com a palavra imulher_trabalho_estudo_AdobeStock_330548293_Bro_Vector_[Convertido]ncerteza. Um substantivo feminino que, segundo o Dicionário Online de Português (DICIO), é uma “condição ou natureza do que é incerto; qualidade daquilo que incita dúvida(s); indecisão”.

Observe como essas palavras definem a atual situação e ingressam incisivamente no ambiente escolar. É devastador frequentar um lugar que não nos deixe à vontade e não nos transmita segurança.

Esse foi o sentimento do professor diante do anúncio da pandemia e da paralisação oficial das aulas presenciais. Veio então um segundo momento, quando as atividades foram retomadas (cada estado em seu ritmo e realidade) sem nenhuma escuta legítima dos docentes, que são, efetivamente, os profissionais da linha de frente da educação.

Os professores são aqueles que, em tempos considerados normais, chegam a ter contato com mais de mil estudantes em um único dia.

O que esperar do emocional do professor diante de uma situação tão incerta?

Partindo para o segundo ponto, a solidão, podemos defini-la como um sentimento que faz parte do ser humano e é visto por muitos como algo no qual devemos nos apoiar e determiná-la como uma “oportunidade de fortalecimento e amadurecimento emocional” (SBPI). Essa é uma excelente visão para tornar a solidão menos impactante ao emocional do sujeito; no entanto, para que o indivíduo gerencie a solidão nesta perspectiva, é necessário um equilíbrio de sua saúde emocional, o que muitas vezes é impossibilitado pelo contexto social em que vive, pela forma como foi criado e, principalmente, se as relações sociais estiverem muito impactadas, como neste momento da pandemia da Covid-19.

A solidão docente, podemos assim chamar, está contida numa estrutura muito complexa que, definitivamente, não tem sua gênese na pandemia do coronavírus, mas foi, certamente, intensificada por esta.

Já é sabido, por grande parcela da população, o quanto as escolas, sobretudo as públicas, apresentam, além de seus problemas de estrutura física, um déficit de profissionais que assegurem um ambiente saudável ao desenvolvimento mínimo das atividades educacionais. Há, muitas vezes, a ausência de pais ou de outros responsáveis comprometidos e que valorizem o trabalho do professor. A indisciplina, a falta de segurança pública no entorno das escolas, a desmotivação social para lecionar são outras angústias da carreira docente que não esgotariam nem em uma série de artigos ou coleção de livros. No entanto, a realidade é que esse professor se sente solitário e precisa de atenção para ao menos vislumbrar uma saída estratégica e eficaz do que essa pandemia lhe tem imposto.

Diante das incertezas e do sentimento de solidão, resta ao professor uma terceira via, a superação. Este talvez seja o maior desafio do docente: superar a cada dia as dificuldades acentuadas com a chegada da pandemia.

Se muitos profissionais da educação já eram taxados de ultrapassados, de obsoletos, por não dominarem as novas tecnologias, com a pandemia o cenário foi ainda mais assustador. Nesse período, os professores foram obrigados a refazer suas aulas, criar novos exercícios, escrever apostilas, gravar vídeos, criar canais em redes sociais, pensar em novos modelos de avaliação, fazer a busca ativa de estudantes e se aproximar mais da família deles (Agência Brasil).

Muitas limitações fizeram desse novo cenário um ambiente que exigiu muita ressignificação, reinvenção, reconstrução, desconstrução, resiliência, empatia e tantos outros atributos de que o professor precisou lançar mão para poder continuar…

Diante de uma crise educacional, baixos salários, desvalorização social, falta de suporte financeiro para adquirir novas ferramentas tecnológicas e ampliar a capacidade de sua Internet, o professor mostrou ao mundo o quanto é necessário e o quanto sem ele a educação é deficitária ou, simplesmente, nula.

O coronavírus veio para nos trazer inúmeras lições. Trouxe-nos um alerta sobre a vida, fez-nos repensar e nos desafiou a sermos seres diferentes.

Eis que, em meio à tragédia, surge uma esperança. Diante de um cenário tão desastroso, a sociedade pôde reconhecer o valor do trabalho docente e a capacidade de se reinventar que cada professor vem mostrando em cada região do País.

A partir dessas lições, podemos afirmar que o professor é aquele profissional que, “apesar de”, não perdeu seu valor e mostrou que é capaz de superar inúmeros obstáculos.

Para que possamos concluir esta nossa conversa, é preciso deixar bem sedimentado que tudo isso que o professor vem construindo em meio à pandemia não lhe confere o título de um super-humano. O fato de se superar, de ressignificar e de reconstruir não garantem estabilidade à sua saúde mental. Por isso, deixamos algumas dicas que são fundamentais para enfrentarmos de maneira saudável este tempo.

Professor,

• Não se culpe por não frequentar a escola durante a pandemia.

• Não exagere na exposição às redes sociais.

• Não aceite qualquer informação sem antes pesquisar a fonte.

• Durma mais.

• Escute mais músicas.

• Converse com seu interior.

• Escute o silêncio.

• Beba mais água.

• Use máscara.

• Mantenha o distanciamento social.

• Acredite na felicidade e saiba:

SEM VOCÊ, NÃO HÁ EDUCAÇÃO.

 

AGÊNCIA BRASIL. Pandemia da Covid-19 fez ensino e papel do professor mudarem. Docentes precisaram se reinventar e acumularam funções este ano. Disponível em: < https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2020-10/pandemia-de-covid-19-fez-ensino-e-papel-do-professor-mudarem> Acesso em: 11 mar. 2021.

DICIO. Dicionário Online de Português. Disponível em: . Acesso em: 10 de mar. 2021.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. O que é Covid-19? Disponível em: . Acesso em: 11 de mar. 2021.

SBPI. Solidão: entenda como a Psicanálise explica o sentimento. Disponível em: Acesso em: 10 de mar. 2021.

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